• Carregando...
Ponte dos espiões: o abismo que separa o comunismo do capitalismo
| Foto:

Fui ver nesse domingo “Bridge of Spies”, estrelado por Tom Hanks e dirigido por Steven Spielberg. O filme é inspirado em história verdadeira, de um espião capturado pelo governo americano que vai a julgamento, tendo o direito de defesa preservado e exercido por um advogado de seguros. Para a surpresa geral, o advogado resolve levar a sério o princípio constitucional de pleno direito de defesa, mesmo em se tratando de um espião soviético em plena Guerra Fria.

Em uma das falas mais marcantes do filme, quando o advogado (personagem de Tom Hanks) é procurado por um agente da CIA, ele diz que um é descendente de alemães, o outro de irlandeses, mas que o que torna ambos americanos é a existência e o respeito a um livro, a Constituição. Sacrificar os valores mais básicos americanos seria se tornar mais parecido com o inimigo, que não possuía império das leis. A América venceria se continuasse sendo a terra da liberdade.

Há, claro, um dilema entre seguir cegamente os princípios fundadores da nação ou ser mais “pragmático”, levando em conta o contexto. A revolta da população é geral quando descobre que o advogado está mesmo dando o melhor de si para proteger um espião soviético, e o juiz também demora a crer na postura do defensor. Mas ele acaba dando um jeito de resguardar os princípios com argumentos mais práticos e utilitários: manter o espião vivo pode ser útil no futuro.

De fato, quando um piloto americano é feito prisioneiro pelo regime soviético, a negociação de troca começa e o advogado é escalado para a missão. O abismo entre um regime e outro fica mais evidente ainda, pela forma com a qual cada um é tratado, pelos direitos constitucionais que um país preserva e o outro ignora. E como a troca é realizada na Alemanha, o contraste fica ainda mais evidente, com um muro que é erguido para que o povo do lado comunista seja impedido de fugir para o lado capitalista, mesmo que à bala.

O público desenvolve alguma simpatia pelo espião soviético, como acontece com a excelente série “The Americans”, que por coincidência terminei ontem também. Nela, o conflito se dá entre família e ideologia, e à medida que o casal de espiões se ambienta em solo americano, nos anos 1980, mais e mais aquela ideologia parece perder sentido. A mulher é mais obstinada, ou dogmática, pois sofreu lavagem cerebral mais intensa. Mas até ela começa a titubear, a ter dúvidas, pensamentos conflitantes.

Muita gente bem intencionada caiu na ladainha do comunismo, acreditou na utopia igualitária, aceitou que os “fins nobres” justificavam quaisquer meios. Em nome da causa, fizeram muita maldade, muita coisa errada, sacrificaram valores e princípios, tidos como “burgueses”. Mas são esses valores e princípios que garantem a civilização, preservam o básico das liberdades individuais. Os comunistas agiram como bárbaros ateando fogo na civilização. Alguns fazem isso até hoje, mesmo depois da queda do Muro de Berlim e do império soviético.

Também terminei ontem (sim, foi um domingo bastante produtivo) o livro Liberalism: The Life of an Idea, de Edmund Fawcett. Trata-se de um relato interessante percorrendo os últimos dois séculos dos principais pensadores e políticos “liberais”. Coloco aspas pois o autor adota conceito um tanto flexível que inclui no rol de liberais gente mais à esquerda.

Mas, ainda assim, é interessante notar como o liberalismo foi se adaptando  com o tempo, lutando para preservar certos valores básicos, como a tolerância, o respeito pelo indivíduo e alguma ordem num mundo dinâmico, sempre limitando o poder do estado. Muito disso será tratado em meu novo curso pela Kátedra, justamente sobre a trajetória das ideias liberais.

A conclusão do autor vai ao encontro do que o personagem de Tom Hanks defende no filme: muita gente cantou a derrocada das democracias liberais no decorrer do tempo, prevendo seu fim por conta de suas fraquezas. Agora mesmo, elas se encontram ameaçadas pelo islamofascismo, e novamente há quem diga que não sobreviverão. Mas as democracias liberais capitalistas são mais fortes do que parecem, mais resistentes. Desde que não sucumbam ao impulso de se fecharem, de se tornarem mais parecidas com seus inimigos, os regimes coletivistas sem império das leis, como o nazismo, o fascismo e o comunismo.

Já perto do final do filme, o advogado, de volta aos Estados Unidos, vê alguns garotos pulando um muro de brincadeira. Eis a imagem da verdadeira ponte que separa os dois regimes. Mais um abismo intransponível mesmo. No comunismo, os muros servem para impedir a saída do próprio povo; no capitalismo, servem para proteger o povo, impedir a entrada de estranhos, ou para a simples brincadeira de crianças inocentes. Ninguém leva tiro nas costas por tentar sair de seu próprio país, de sua casa.

O liberalismo sempre merecerá ser defendido. E sempre haverá quem o faça, pois a chama da liberdade arde quente no coração das pessoas. Ao menos daquelas que não sofreram lavagem cerebral a ponto de uma ideologia coletivista destruir até mesmo o sentimento básico de família nelas. Uma vez mais a América corre o risco de os bárbaros de dentro do portão derrubarem os pilares liberais que fundaram essa grande nação. Uma vez mais eles vão perder.

Rodrigo Constantino

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]