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Por que concessão é muito diferente de privatização

Por João Luiz Mauad, publicado pelo Instituto Liberal

Quase um ano depois de tentar devolver a concessão ao governo federal, a empresa que administra o Aeroporto de Viracopos, em Campinas, sucumbiu ao acúmulo de dívidas e à vagareza do poder público e entrou com pedido de recuperação judicial, no último dia 6, com um volume de dívidas estimado em quase R$ 3 bilhões.

O colapso financeiro de Viracopos é resultado de um modelo de concessão que impede totalmente qualquer possibilidade de ajuste, por parte do concessionário, em caso de crise ou alteração das condições econômicas e/ou mercadológicas.

A operação do aeroporto foi licitada em 2012, tendo sido arrematada com ágio de 159% (R$ 3,3 bilhões).  Na época, havia apostas num crescimento rápido do volume de passageiros e, principalmente, de carga, além de eventos turísticos importantes, como Copa do Mundo e Olimpíadas.

A partir de 2014, no entanto, o Brasil experimentou a pior recessão de sua história, o que derrubou a demanda, tanto de passageiros quanto de cargas. No pedido de recuperação a concessionária afirma que, no período de 2012 a 2017, “a frustração da demanda implicou perdas estimadas de receitas de embarque e desembarque da ordem de R$ 95 milhões e de receitas de carga da ordem de R$ 914 milhões”.

É claro que houve erros de avaliação e projeção, entretanto, o olhar do administrador apostaria que o principal problema talvez tenha sido o engessamento contratual, que tirou da concessionária qualquer possibilidade de ajuste rápido e, principalmente, re-planejamento de investimentos, conforme mudavam as circunstâncias do mercado.

De acordo com o contrato de concessão, havia a obrigatoriedade de investimentos da ordem de R$ 3 bilhões na expansão dos terminais de passageiros e carga, logo nos primeiros anos. Tais obras foram financiadas com recursos do BNDES, mas a amortização dos empréstimos, evidentemente, dependia de um volume projetado de receitas que não aconteceu.

Tivesse o aeroporto sido privatizado, e não simplesmente concedido, sob as amarras de compromissos rígidos, é claro que os investimentos teriam seu cronograma revisto e postergado, a fim de adequá-los à demanda real e a um mercado operando em período recessivo.

Todavia, esse modelo de concessão – assim como o das famigeradas parcerias público privadas -, com cláusulas de investimento pré-fixadas, tanto em termos financeiros quanto de prazo, retira completamente a agilidade e adaptabilidade da concessionária para lidar com as crises e as freqüentes mudanças de humor do mercado.

Outro problema freqüente desse modelo é a morosidade do poder concedente para tratar de alterações no escopo do contrato ou dos sempre necessários – principalmente em contratos de longo prazo – ajustes econômico-financeiros do mesmo.

Por exemplo, a concessionária Concer, que administra a rodovia Rio-Juiz de Fora, está obrigada, por contrato, a construir uma nova via, na subida da Serra de Petrópolis.  A obra da Nova Subida da Serra (NSS) sempre esteve presente no Programa de Exploração da Rodovia (PER), contudo, sem projeto específico e orçamento previamente aprovados. No contrato, há menção somente a uma ‘verba simbólica’ de R$ 80 milhões, a preços de 1995 – época da concessão. De acordo com a proposta, o custo real da obra que excedesse a estimativa acima, seria, então, negociado com o poder concedente, de acordo com o projeto a ser aprovado.

Prevista originalmente para ser executada entre 2001 e 2006, a obra teve o cronograma alterado três vezes, a última em 2009, fixando prazo até 2013 para sua execução. O projeto foi apresentado em janeiro de 2010 à Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT), mas a licença ambiental só foi liberada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) quase dois anos depois, em dezembro de 2011.

A ANTT (agência reguladora) autorizou o início das obras apenas em abril de 2013, após discussões sobre o projeto e respectivo ressarcimento. Foi assinado um aditivo ao contrato estabelecendo que a União, através da ANTT, faria o ressarcimento à concessionária dos valores investidos acima do previsto no contrato original. O orçamento final da obra, corrigido em 2013, ficou em R$ 897 milhões.

Entre dezembro de 2014 e abril de 2015, a ANTT realizou repasses que totalizaram R$ 237 milhões, em valores atualizados. Porém, o Tribunal de Contas da União determinou a paralisação dos repasses, alegando irregularidades no termo aditivo, argumento utilizado também pelo Ministério Público Federal, que conseguiu na Justiça Federal o bloqueio dos repasses. Desde então, as obras encontram-se paralisadas.

Embora o desejo formal do poder executivo e da concessionária seja prorrogar o tempo de concessão para que as obras possam ser realizadas sem a necessidade de repasse de novos recursos públicos, o TCU e o Ministério Público Federal defendem que o governo deve simplesmente deixar o contrato vencer naturalmente, para que seja novamente licitado e as obras terminadas pelo novo concessionário, já com todos os custos devidamente dimensionados.

A FIRJAN – Federação das Indústrias do RJ – estima que a conclusão da obra, caso vença a proposta do TCU e do MPF, poderá acontecer somente em 2031. Tal atraso implicaria custos socioeconômicos que ultrapassariam R$ 1,5 bilhão para a sociedade.

Resumo da ópera: Por conta da burocracia estatal e da falta de agilidade da agência reguladora, os usuários da rodovia têm sido os mais prejudicados, em todos os sentidos – como consumidores e como pagadores de impostos.  Nada disso aconteceria, entretanto, se a rodovia houvesse sido privatizada, e não apenas concedida.

Ademais, como já expliquei em outro artigo, a política de concessões também inibe a concorrência, normalmente transformando monopólios públicos em monopólios privados.  Isso se dá porque, ao promover uma concessão e cobrar por ela, o governo não raro bloqueia qualquer possibilidade de um terceiro interessado prestar o mesmo serviço, ainda que este deseje investir recursos próprios no negócio.

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