Por Erick Silva, publicado pelo Instituto Liberal
Os últimos dias andam sendo caóticos para quem acompanha o mundo político. A crise envolvendo o presidente Jair Bolsonaro, o filho dele Carlos Bolsonaro e o então secretário-geral da presidência da república Gustavo Bebbiano provocou uma série de incertezas no governo, e também promoveu cenas execráveis de assassinato de reputações a jornalistas renomados como Felipe Moura Brasil, vergonhosamente difamado por bolsonaristas, que assim como todo governista, não aceitam a ideia de ter uma imprensa que investigue e que cobre explicações do presidente.
Juntamente com o caso Bebbiano, surgiu na imprensa o “escândalo dos laranjais”, caso ligado ao ministro do turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG). Segundo reportagem da Folha de São Paulo, Marcelo, que era o líder do PSL em Minas no ano passado, teria patrocinado “um esquema de candidaturas laranjas que direcionou verbas públicas de campanha para empresas ligadas ao seu gabinete na Câmara”. Segundo a reportagem, o comando nacional do PSL repassou R$279 mil para quatro candidatas mulheres que, juntas, obtiveram um pouco mais de 2000 votos, o que sinaliza um comportamento de candidaturas de fachada, quando existe uma simulação de atos reais de campanha, mas não empenho efetivo na busca dos votos.
Esses casos podem até parecer algo inofensivo, mas eles devem ser vistos com gravidade. Infelizmente venho percebendo que o público anda relativizando e/ou fazendo pouco caso em relação a estes assuntos, utilizando como parâmetro a antiga história de que: “antigamente era pior”. Quando alguém publica uma notícia negativa ao governo, logo aparecem comentários questionando sobre o PT, sobre Lula, sobre Haddad, entre outros. Nada que difere muito do que acontecia há quatro anos atrás, quando o PT (des)governava o país e sempre aparecia a militância questionando sobre o PSDB.
O que as pessoas precisam entender, primeiramente, é que o dever da imprensa é informar e cobrar o governo vigente. Jornalista de verdade busca a realidade dos fatos, busca trazer aos leitores, telespectadores ou internautas o que se passa dentro do Planalto, quais articulações políticas estão sendo moldadas na Câmara, as resoluções que são votadas no Senado, os processos que chegam ao STF: Esse é o dever do verdadeiro jornalista.
E é por essa razão que me preocupa a desmoralização da imprensa, em prol do crescimento de uma “mídia alternativa”, nome pomposo e elegante para se referir à velha mídia governista, que em nada difere dos blogs governistas da era petista, com exceção do viés ideológico dessas mídias: se antes o viés era esquerdista, agora ele é neoconservador. O fato mais grave, todavia, é ver que as pessoas, enquanto assassinam reputações de jornalistas que apenas fazem o seu trabalho, levantam o palanque para aqueles que fazem o oposto do jornalismo. Porque, embora esses sites e canais possuam aparentemente aspectos jornalísticos, de jornalísticos eles não têm nada. Porque espalhar notícias falsas para prejudicar opositores, manipular notícias para favorecer o governo e inventar narrativas inexistentes para favorecer a imagem de aliados governistas não é jornalismo. É propaganda da mais baixa qualidade.
E é por causa desse tipo de conteúdo pseudojornalístico que acontece a famigerada relativização da corrupção e das “crises”. Antes de tudo, é preciso deixar esclarecidos alguns pontos importantes: o mensalão e o petrolão não foram apenas casos comuns de corrupção. Eles foram mega esquemas de corrupção envolvendo compra de votos (mensalão) e desvio de verbas da maior estatal do país, a Petrobrás (petrolão). São dois casos absurdamente chocantes e que dificilmente vão conseguir ser superados. Mas os casos do PSL, embora sejam menores que os casos petistas, ainda assim são casos de corrupção, e eles devem ser combatidos sim e ser bastante cobrados pela imprensa, para que esse tipo de atitude não se normalize, já que a normalização e a relativização da corrupção podem causar efeitos catastróficos.
Para elucidar melhor, utilizarei a clássica analogia do sapo e a água quente: o sapo, quando colocado em um recipiente com a mesma água de uma lagoa, reage rapidamente quando a água fica quente demais em pouco tempo. Mas quando fervemos a água gradualmente, o sapo acaba não esboçando qualquer tipo de reação, até que chega um ponto em que a água fica quente demais e o sapo acaba falecendo.
Essa analogia serve para explicar o que acontece no Brasil nesse momento: uma crise governamental eclode, juntamente com o esquema de candidaturas laranjas usadas para desviar verbas públicas para empresas ligadas ao ministro do turismo. E parte da população, ao invés de cobrar explicações do governo e cobrar pelas investigações relacionadas ao esquema dos laranjas, decide fechar os olhos para o que acontece, ou resolve atacar e difamar jornalistas que investigam os casos e buscam trazer informações para seus seguidores, enquanto tratam como verdade absoluta matérias publicadas em sites governistas, interessados não na informação, mas em alavancar agendas políticas que os beneficiem; ao mesmo tempo, eles fazem pouco caso do esquema de corrupção do PSL, acreditando se tratar de um caso sem muita importância.
Para evitar que o Brasil tenha o mesmo desfecho do sapo, é preciso repensar a maneira como tratamos a imprensa. Não devemos ver a imprensa jornalística como inimiga do povo, mas como uma ferramenta que nos faz saber o que realmente acontece em Brasília, quais os desafios que o país enfrenta, sem manipulação e sem teorias conspiratórias. Porque, por mais que a imprensa não seja isenta de falhas, ela é muito mais desejável e sadia do que acompanhar apenas “notícias” de propagandistas travestidos de jornalistas. Além disso, devemos parar de relativizar casos de corrupção. Não interessa se o valor foi de R$400 mil, R$4 milhões ou R$10 bilhões roubados. O que interessa saber é que o dinheiro do contribuinte foi desviado para interesses escusos, e esse tipo de conduta não pode ser tolerado, nem relativizado e muito menos normalizado, pois, caso contrário, os valores desviados serão maiores. E as consequências idem.
Sobre o autor: Erick Silva é graduando em Administração pela UFRRJ.