Recebi ontem a notícia ruim: um amigo jornalista, dos bons, foi desligado de seu canal de informação. É a crise econômica fazendo vítimas em vários setores, especialmente na mídia. Como ele me confidenciou, talvez isso tenha seu lado positivo, pois agora está livre das amarras do veículo, que não pode “bater demais” no governo com receio de retaliação. Isso me deixou refletindo: como, de fato, bancar um instrumento de informação e opinião realmente independente, especialmente na era da internet?
Em artigo publicado hoje na Folha, Carlos Brickmann explica a função básica do jornal – descobrir a notícia que tem valor, que realmente agrega e que não está disponível gratuitamente por aí – e conclui que é justamente por não entregá-la que os principais jornais estão em crise. Diz ele:
Hoje a notícia é abundante, instantânea, barata. Podemos acompanhá-la, assistir ao vídeo, ler (e fazer) comentários. Tudo de graça.
“Playboy” para quê? Na internet tem mulher famosa nua e filme pornô. Tudo grátis. Por que devemos pagar, então, para ler um jornal ou uma revista?
Por um motivo básico: nos bons jornais e revistas, a notícia é não apenas completa, mas confirmada. Notícia fria, abundante na internet e nas redes sociais, não entra. Quem paga pela informação tem garantia de qualidade, está melhor informado do que os que preferem notícia grátis.
[…]
Não podemos reclamar da queda de circulação de jornais e revistas. Em parte é a destruição criativa, a substituição de um modelo por outro. Todavia, muito mais do que isso, é o suicídio de cobrar por algo que não se entrega.
Ele fornece alguns exemplos, como a propriedade do avião em que Eduardo Campos estava quando morreu. Jornalista é aquele, como lembra sempre Carlos Alberto Di Franco em suas colunas, que está nas ruas, atrás dos segredos, das informações relevantes. Não dá para negar que os jornais têm ficado aquém dessa missão tão importante.
Claro, não fossem os nossos grandes jornais e revistas e o PT estaria em situação bem mais confortável. Nossa imprensa, parcialmente livre, cumpriu parcialmente seu dever cívico, expondo falcatruas do governo. Mas estamos longe de um quadro em que o “quarto poder” exerce de fato seu papel, com plena independência e com investigações reveladoras.
São vários os motivos. A internet, com sua cultura do “tudo grátis”, trouxe enormes desafios para os modelos financeiros desses veículos. A simbiose com o governo em nada ajuda, seja pela publicidade de estatais pesando no faturamento, seja pelo poder de regulação do governo. Mídia independente não pode, obviamente, depender em nada do governo.
O sucesso do site O Antagonista atesta a demanda reprimida por notícias quentes contra o governo. Os vídeos caseiros de Joice Hasselmann, após a saída da VEJA, atingem até um milhão de visualizações, mais do que muito programa em canal aberto de televisão, o que também comprova a demanda por opinião firme de gente que não tem o rabo preso com o governo.
Mas ainda resta a questão de como viabilizar essas iniciativas do ponto de vista financeiro. Os jornalistas precisam comer. Se não queremos jogar tudo no mesmo saco, confundir quem simplesmente emite opinião sem embasamento ou espalha “notícias” falsas pela internet com quem faz trabalho sério que agrega valor aos consumidores de informação, então será preciso encontrar uma forma de remunerar os últimos.
Nos Estados Unidos, temos jornais como o WSJ fechando conteúdo para clientes apenas, e temos blogs e sites com assinantes também. Fora isso, quando há um fator ideológico envolvido, uma causa, existe a cultura nos americanos de filantropia, de sustentar seus “soldados” e “guerreiros” que dedicam suas vidas a essas batalhas inglórias com doações individuais.
No Brasil, isso é tudo mais complicado, pela falta dessa cultura e de visão no longo prazo. Todos querem jornalistas e formadores de opinião com plena independência, mas não necessariamente estão dispostos a pagar por isso. A conta não fecha. Ninguém será mártir pela Pátria eternamente. Ou encontramos um jeito de bancar esses que estão dispostos a oferecer análises e jornalismo independente, ou ficaremos reféns daqueles que dependem do governo para sobreviver, e então nunca irão bater realmente de frente com o poder estabelecido – justamente a função básica da imprensa.
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Rodrigo Constantino
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