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Por Roger Scar, publicado pelo Instituto Liberal

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Fala-se muito em “nova política”, e o discurso vai de Marina Silva até os filões liberais e conservadores. No entanto, o que vejo em comum tanto de um lado quanto de outro, com exceção dos psicopatas poderosos que realmente sabem o que estão fazendo, é que quase ninguém sabe explicar como seria a tal “nova política”. Isso tem um motivo claro.

Para que algo seja superado, precisa antes ser compreendido. Não há como um desenvolvedor de tecnologia inventar alguma melhoria ou inovação se ele não entender o que já existe no momento. A Apple, para criar um novo iPhone, precisa antes ter todo o conhecimento sobre como funciona o iPhone da versão anterior. Por isso estas empresas contratam especialistas, que são pessoas com conhecimento técnico, muitas vezes prático e teórico, e estas pessoas são capazes de inovar porque entendem todo o processo.

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Na política não é tão diferente. Apesar de ser uma ciência social, ela ainda é uma ciência. Por ser social, ela tem processos complexos envolvidos, muitas variáveis, e nada é sempre 100%. O que ocorre, entretanto, é que há necessidade de compreender os processos que a envolvem antes de pensar em mudar alguma coisa. Neste caso apelo à filosofia: é preciso entender o mundo antes de querer mudá-lo. Essa mentalidade de querer mudar tudo sem saber de nada é típica de revolucionários mimados, e isso assola muito mais liberais e conservadores hoje do que esquerdistas.

Agora, vamos aos trabalhos. Como a política realmente acontece em um país pobre como o Brasil?

Em um nível de superfície, respeitando processos, leis, aparências e certas regras mais ou menos legítimas amplamente aceitas socialmente, o que se vê são as propagandas de TV e rádio, a panfletagem, as palestras, a divulgação em redes sociais, etc. Neste nível as coisas ocorrem de forma óbvia. Pessoas são contratadas para fazer marketing, militância e outras funções dentro de uma campanha eleitoral.

Porém, a política vai muito além dessa pequena etapa de poucos meses relativa ao período eleitoral. Na realidade os políticos e partidos em geral estão quase constantemente em campanha, especialmente os partidos grandes e que possuem mais recursos. Além disso, o que o brasileiro médio vê em uma campanha não é nem mesmo a metade do que ela realmente é. Aquilo que está claramente acessível aos olhos é a parte que a lei permite, a parte legítima do processo que é feita apenas para expandir a influência política dos grupos envolvidos.

Compra de votos

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É bem comum acreditar que a compra direta de votos não acontece mais, ou que ela acontece de forma mais limitada. Mas não é verdade. Pode até ser que nos dias de hoje os políticos evitem fazer isso, mas não por questões morais ou éticas, sim pelo fato de que estamos vivendo uma era na qual quase todo cidadão do mundo civilizado tem um celular com câmera nas mãos. De toda foma, já existe há muito tempo meios de burlar estas leis. O método é simples, aliás. Simples e óbvio.

Quando estive na Esquerda Marxista, da qual saí há dez anos, vi muita coisa acontecer. Embora eu não tivesse qualquer nível de acesso lá dentro, ainda assim tive certas informações que, na época, nem mesmo era capaz de compreender inteiramente. Uma coisa que vi acontecer quando estive lá é algo chamado mapeamento político.

O que é mapeamento político?

O partido ou a organização têm, em suas mãos, um mapa completo da cidade, do estado, do bairro ou do país. Para fins práticos usarei o exemplo que vi: um mapa da cidade de Joinville com distinção entre as regiões nas quais o partido possuía maior ou menor influência. Ao lado, uma lista de contatos, com nome, número e localidade. Em cada bairro o partido tinha seus representantes, e normalmente nem eram candidatos, eram “líderes comunitários”, figuras conhecidas em suas ruas e bairros que tinham, por alguma razão, o respeito da comunidade local.

Estas pessoas podiam ser membros de associação de moradores, líderes de grêmio estudantil, chefes de APP, síndicos de prédio, padres de alguma paróquia, etc. Simplesmente eram pessoas nas quais a comunidade confiava, seja por terem boa lábia ou até mesmo por terem feito coisas boas ali.

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Esses representantes faziam um importante trabalho nos bairros, escolas, paróquias e onde mais pudessem fazer, e não era simplesmente fazer campanha para o partido ou um candidato em específico. Eles serviam, basicamente, tanto para construir uma ponte indireta entre o partido e o povo como também para informar os membros do partido de tudo o que ocorria lá. Com o mapeamento, o partido sabia exatamente onde e com quem falar para melhorar a situação. Eles focavam suas energias nos bairros nos quais não tinham muito apoio e, de quebra, davam para estes “representantes” locais uma ajuda quando quisessem concorrer com uma chapa para a Associação de Moradores, para o grêmio da escola, etc.

Isso tudo, entretanto, é a parte limpa do jogo. Em muitos casos – e aqui afirmo que não cheguei a ver isso ocorrer, mas sei que ocorre – a compra de votos se dá através disso. Não é que o partido ou o candidato deem dinheiro propriamente dito para que as pessoas votem, a atuação neste sentido é bem mais sutil. Se o partido estiver no poder, por exemplo, ele consegue mandar passar asfalto em alguma rua, limpar alguma valeta a céu aberto ou arranjar verba para construir uma quadra esportiva.

O partido faz isso segundo o interesse apresentado pelo seu representante local. Com isso, mata dois coelhos de uma só vez. Ele resolve o problema daquela comunidade, atendendo a uma demanda local, ao mesmo tempo em que aumenta a confiança do povo naquele representante.

Imagine que você seja presidente de uma associação de moradores, que você tenha contato direto com algum vereador e que tenha alguma ambição política. O que vai fazer, se for inteligente, é buscar com este vereador atender o máximo possível das demandas daquele povo que você representa. Assim as pessoas acreditam que você luta por elas e tendem a fazer o que pedir que façam. É aí que entra a compra indireta de votos.

Se eu, na condição de presidente do grêmio estudantil, consigo liberar uma verba do município para a construção de uma quadra na escola, poderei usar isso em forma de barganha. Quando alguém perguntar como consegui, direi que tive ajuda do vereador Y, do candidato X, e pedirei para que meus seguidores e eleitores também votem neles. Não há, é claro, garantia de que todos vão votar, mas a maioria vota se realmente acredita no que o representante delas está dizendo.

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É claro que estes representantes locais, em muitos casos, fazem isso também com boas intenções. Eles são meras ferramentas do sistema. Em outros casos eles fazem porque sabem que aquilo pode lhes render frutos no futuro. Mas, seja como for, a verdade é que uma parte relevante dos votos de diversos candidatos a cargos eletivos é conquistada assim.

Um exemplo que posso citar é o do ex-deputado estadual Nilson Gonçalves, do PSDB. Ele manteve, por anos, a Casa Amarela, uma espécie de “ONG” cuja finalidade era ajudar pessoas necessitadas. Não estou aqui dizendo que ele a manteve apenas por interesse político, eu não poderia afirmar com muita certeza, mas é fato que ele a manteve por todos os anos enquanto foi deputado estadual e que ele a fechou tão logo perdeu a eleição em 2014. Aquilo foi seu curral eleitoral por muito tempo, além do fato de ter um programa na televisão, é claro. (Continua na segunda parte)

Sobre o autor: Roger Scar é analista político e escreve para o Jornalivre.