
Fernando Henrique Cardoso, em sua coluna de hoje, clama por uma agenda nacional que possa unir o país em torno de bandeiras nobres e reformas necessárias, como a previdenciária e a trabalhista. O ex-presidente adota uma visão de águia, de quem paira acima das demais criaturas rastejantes, na sujeira do dia a dia. Não quer brigas partidárias, não quer disputas pessoais por interesses mesquinhos. Quer o melhor para o país.
Não discordo totalmente de FHC, e acho louvável alguém querer pensar o futuro do Brasil com lentes mais imparciais e de longo alcance. É nobre, postura de estadista. Mas como o chamei de “banana” recentemente, alguns leitores podem achar que estou esquizofrênico, mordendo e assoprando. Não é meu estilo. Logo, vou focar no que discordo, e explicar porque continuo achando a postura do tucano pusilânime, e em geral equivocada.
Sim, o Brasil precisa de tais reformas estruturais. Sim, o país está segregado, após forte campanha petista do “nós contra eles”, típica dos populistas. Mas FHC erra completamente ao incluir no rol de “lideranças nacionais” o próprio Lula, e no grupo de partidos que precisam lutar pelo país como um todo o próprio PT. É muita cegueira. É análogo à “mulher de malandro” que apanha, apanha, e ainda acredita que o marido lhe dará rosas como um cavalheiro se ela ao menos for mais amorosa com ele.
Às vezes, em momentos drásticos de inflexão, é preciso descer um pouco das nuvens e enfiar as mãos no lamaçal, no campo de batalha, para derrotar os inimigos. FHC pode ter ficado emocionado com as sinfonias de Beethoven em Berlim, mas o Brasil vive um momento perigoso, em que ou o PT é derrotado, ou o país afunda de vez. Temos os casos dos nossos vizinhos como alerta. Ignorar essa realidade é ato covarde de quem se esconde na Torre de Marfim para se colocar acima de todos, do bem e do mal.
Eu também adoraria desfrutar das sinfonias de Beethoven na Europa, ler boa literatura e debater apenas ideias mais elevadas e filosóficas. Mas essa seria a atitude de um intelectual, não de um agente político. FHC não pode se dar ao luxo de fugir da política. E um estadista, no atual momento, precisa pensar nas grandes causas nacionais sim, desde que não feche os olhos para os obstáculos concretos que impedem tais avanços.
Esperar um ato nobre da presidente Dilma, de renúncia, é muita ingenuidade. Incluir o PT nos “diálogos” para salvar o país, a economia e a democracia, todos quase destruídos pelas ações deliberadas do próprio PT, é ridículo. Logo, só resta uma alternativa para quem adota postura realista: derrotar o PT, tirá-lo do poder. Qualquer visão de futuro decente precisa passar por esse passo no presente. FHC não pode fugir disso. Ele conclui em seu texto:
É para conduzir uma agenda nacional deste tipo, ou do que mais pareça necessário ao país, que precisamos de lideranças e do apoio da sociedade e de alguns partidos. Não sairemos da paralisia nem da sensação de estarmos à beira do despenhadeiro se a discussão continuar limitada a pessoas e a interesses imediatistas delas ou de seus partidos. Como quem tem a responsabilidade de unir porque foi eleita para conduzir o país (e não uma facção) está com poucas condições para tal, é que se dá a discussão, infausta, mas necessária, dos caminhos constitucionais para sairmos da crise. Não se dá um passo maior sem saber o que vem depois. Daí a necessidade de um consenso nacional para juntarmos forças ao redor de um caminho mais claro para o futuro.
Certo, mas tais lideranças e partidos não englobam Lula e o PT. Isso precisa ficar claro. Também não dá para ser covarde demais em relação ao futuro incerto e, por isso, deixar Dilma permanecer até 2018, o que poderá ser mortal para o país. O “consenso nacional” está claro hoje: a saída de Dilma e do PT. FHC vai ou não assumir um papel de liderança nessa direção? Ou será que vai preferir bancar o excessivamente cauteloso que acaba salvando não o país, mas o PT e a presidente Dilma?
Fernando Gabeira fez uma análise interessante em sua coluna de hoje, e concluiu:
Se o país negociar com esse turbilhão de fatos degradantes e apenas seguir em frente como se nada tivesse acontecido, o preço a pagar, embora irredutível a números, será um grande desencanto. A tática de deixar Dilma sangrar até 2018 pode ser perigosa: os próprios vampiros perigam chegar exangues, após três anos de vacilação. E um cenário possível é a vitória de alguém de fora do sistema político. Como já aconteceu em alguns países, recentemente com a eleição do humorista Jimmy Morales, na Guatemala.
Tivemos essa experiência com Collor. Talvez tenha nos vacinado. Em crises passadas, os mais importantes políticos do Brasil se reuniam buscando uma saída, pensando também na sobrevivência da espécie. Agora, nem isso. Navegamos nas brumas. Dilma não consegue governar, a sociedade não consegue derrubá-la. E esse jogo não pode ser 1 a 1. Todos perdemos. Talvez ela e Eduardo Cunha sintam-se vitoriosos apenas por sobreviver. O Brasil merece mais do que uma vida apenas vegetativa.
O Brasil merece mais do que uma vida apenas vegetativa, sem dúvida. E essa é a visão otimista da coisa se Dilma durar até 2018. Minha expectativa é muito pior: o país irá mergulhar no abismo se isso acontecer. É fundamental, portanto, que as lideranças políticas deixem as picuinhas de lado e tentem se unir em prol do país, o que fala em nome de seus próprios interesses de longo prazo, pois sua sobrevivência estará ameaçada sem isso.
Mas, insisto, esse diálogo todo, essa união, não pode incluir em hipótese alguma o próprio vilão nessa história toda. O nome do problema é PT. Dilma é sua representante atual, e traz consigo outros problemas graves. Qualquer união para salvar o Brasil precisa levar isso em conta.
Da mesma forma que a Venezuela, para ser salva, não pode contar com a ajuda dos próprios bolivarianos que destruíram o país, e a Argentina terá de sair da enrascada atual derrotando o kirchnerismo, o Brasil só tem alguma chance de vencer derrotando o lulopetismo, e não contando com o inimigo para sair do buraco. Por isso precisamos, sim, de uma agenda nacional. Mas sem bananas, sem “moderados” que desejem incluir no grupo de “diálogos” aqueles que querem justamente nos destruir.
Rodrigo Constantino
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