Por Ítalo Cunha, publicado pelo Instituto Liberal
O crescimento do Projeto de Lei “Escola sem Partido” veio acompanhado de muitas críticas. A esquerda brasileira vem adotando duas posturas majoritárias quanto a isso. A primeira é alegar que não há doutrinação alguma nas escolas; A segunda é afirmar que a educação libertadora de Paulo Freire, ou doutrinação/partidarização das escolas, é importante para a construção de um novo mundo.
Ora, afirmar que não há doutrinação no ensino é desonesto. A escola em si é um instrumento de doutrinação intelectual, tudo o que faz é doutrinar um grupo de pessoas em ideias que a cultura, da qual deriva o conhecimento impresso, determina como verdadeiros, sendo irrelevante para isso o fato de existir ou não certa realidade por trás desse conhecimento. Não mandamos crianças para as escolas a fim de que estas aprendam valores e ideias contrárias a de seus pais.
O material usado, sobretudo em escolas públicas, é terrivelmente enviesado e ideológico. Basta avaliar qualquer livro didático de história ou geografia. Quantas páginas são destinadas a pensadores, revoluções e as glórias do pensamento socialista? Em contrapartida, há quantos parágrafos se restringe o pensamento liberal? O que advém deste pensamento? Não só é ensinado que do pensamento liberal origina-se na desigualdade como também as condições precárias de vida em qualquer parte do planeta.
Um dos livros mais utilizados por professores e escolas públicas se chama Nova História Crítica e nem foi escrito por um historiador. Foi recomendado pelo MEC em 2005 e vendeu milhões de cópias, sendo utilizado por mais de 30% dos alunos entre a 5ª e 8ª série. Como demonstrado no ótimo e imprescindível artigo do Spotsniks. Nos livros Che Guevara é tratado como um herói, praticamente um super homem enquanto o capitalismo é criticado de forma maniqueísta para engrandecer regimes ditatoriais e homens como Mao Tsé Tung.
Mas e os alunos que não prestam atenção em nada e nem abrem os livros? A maioria dos alunos não sai das escolas doutrinados de forma ideológica e política, uma minoria de fato absorve completamente as doutrinas de seus professores e do governo. Contudo, a doutrinação é, em sua maioria, involuntária. É a impressão dos valores dos mestres em seus alunos, mesmo que o aluno da rede pública, hoje, não saiba o que é mais valia ou luta de classes, ele supõe, com toda a certeza, que é explorado pelo chefe e que o capitalismo é a caixa de pandora arrombada pelos EUA.
É nos valores onde a doutrinação age mais forte, ao associar o mercado com desigualdade, pobreza e sofrimento se incute ideias que não correspondem à realidade na forma de enxergar o mundo destes alunos. Se percebe claramente pela forma como as ocupações de escolas se deram.
Alunos pintando e colando frases de autores e heróis socialistas nas paredes de seus colégios, pedindo, ao mesmo estado que os queria fora dali, educação de qualidade e anticapitalista. Sem saber ao certo o porquê, mas tendo certeza que alguém lhes deve educação pública e que a falta desta é culpa do mercado.
Até mesmo a ideia de que nas manifestações de 2013 a reivindicação não era sobre 20 centavos, e sim sobre “direitos”. Será que esses alunos sabem mesmo o que são esses direitos? Provavelmente não, mas alguém os ensinou que a sociedade os deve muito. Mais triste ainda é perceber que estas crianças são preenchidas por um sentimento quase religioso ou sexual, dependendo da idade, pelo Estado.
O Estado vai prover! O Estado irá assegurar! O Estado deve intervir! Pessoas são ruins e por isso o Estado as deve proteger! A sociedade corrompe as pessoas! A crença na doutrinação se reforça ainda mais quando olhamos o período em que os pais e professores se formaram.
Os pais destas crianças muito provavelmente se formaram em escolas do período militar, aprendendo: “Brasil, ame ou deixe-o.” A genealogia do estatismo pode ser traçada até aí. Os professores foram cursar faculdades, as “frontes” de resistência à ditadura e por isto conheceram um mundo novo. Ainda professam a mesma fé, apenas os dogmas são diferentes. Tudo dentro do Estado, nada fora dele! Só que agora de uma forma esteticamente agradável.
O amor ao estado passa como um vírus através da lente em que o professor vê o mundo. Obviamente há sempre aqueles mais politizados que adotam como fardo e luta proletária em moldar os alunos à suas crenças e ideologia. Para tanto não é necessário ser de doutrina A ou B, esquerda ou direita. O autoritarismo inerente a esta prática está em ambos os polos.
Estes são, normalmente, os que admitem a doutrinação como arma revolucionária e caminho para um mundo mais justo e igualitário, onde não há espaço para discordância. Tentar dissuadi-los exige um outro artigo e nem é a missão deste. Ademais, ao admitir que doutrinam de fato os alunos dão ensejo à aprovação do PL contra qual lutam.
Estes professores não teriam problema algum com o projeto caso em uma de suas diretrizes estivesse escrito: Disseminar os valores de classe e luta contra o capital. Não há diferença no ato de doutrinar para a esquerda ou para a direita, ambos os atos são formas de moldar outro indivíduo às suas ideias.
Essencialmente, a esquerda só se manifesta contrária ao escola sem partido por que seu projeto de doutrinação e perpetuação de valores já está montado. Se o MEC servisse aos interesses de uma hegemonia acadêmica conservadora, a esquerda estaria, sim, tentando passar a mesma lei, só que com valores um pouco diferentes. A questão aqui não é “quem doutrina” e sim o fato de doutrinar.
Há pouca coisa menos necessária na educação brasileira do que mais controle estatal. O MEC, assim como o Escola Sem Partido, é uma forma de tentar controlar os rumos da sociedade brasileira através da educação imposta pelo Estado. O perigo não reside exatamente no conteúdo dessa doutrinação, embora algumas inclinações possam ser mais danosas como uma educação fascista ou socialista, e sim no fato de estarmos dando armas ao governo para definir o que é ou não verdade, afinal, a educação se trata de transmitir valores e conceitos que temos como reais e importantes.
Rechaçar a possibilidade de haver um governo que defina as diretrizes acadêmicas é tão importante quanto prover educação. As famílias e os alunos devem ser ouvidos e decidir o que querem como educação, autonomia começa quando se tem autodeterminação, inclusive sobre o que deve ou não ser ensinado a seus filhos.
* Ítalo Cunha é estudante de Direito na UFF, coordenador Estadual dos Estudantes Pela Liberdade no Rio de Janeiro e membro fundador do Clube Autonomia.