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A Previdência Social brasileira, sua ideologia e seus problemas
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Por Sergio de Mello, publicado pelo Instituto Liberal

Esse texto não se limita a justificar a reforma ou uma contrarreforma previdenciária. Não quero entrar nessa briga. Só pretendo contribuir com uma análise desse estado de crise de hoje, apontar seus culpados, seus vilões e suas vítimas. Geralmente, encontrar culpados em situações caóticas não resolve nada e só aumenta o estado de animosidade. Mas, aqui, ficar apenas na técnica só abona o governo e não entra no âmago ou cerne da questão. Aliás, é tudo que Estados socialistas não querem. Eles fogem do enfrentamento filosófico, ou nem isso, para não dar com as caras no problema central e manter o status quo. Como rato foge de gato.

É compreensível que a população trabalhadora quase inteira e certos segmentos da sociedade civil organizada se rebelem contra a reforma previdenciária? Respondo que sim. Não é por menos do que a retirada de uma aposentadoria por tempo de contribuição entre os direitos do trabalhador. Do jeito que a reforma quer hoje, o trabalhador e a trabalhadora vão se aposentar somente aos 65 e 62 anos respectivamente. Isso é uma tragédia para quem vem trabalhando e contribuindo há tempos e ainda tem que esperar pelos 62 ou 65 anos. Por outro lado, o trabalhador de alta renda, com o limite previdenciário de contribuir, hoje no valor de R$ 5.531,31 (11% sobre esse valor, e não mais), além de ser obrigado a pagar, não sabe quanto vai receber, não mantém o mesmo padrão da ativa e somente paga para os pobres.

Além de ser obrigatória a contribuição, o pior de tudo é que existe um limite para contribuir. Mesmo que o sujeito ganhe, trabalhando para o patrão da iniciativa privada, R$ 15.000,00 por mês (muito embora esse valor seja quase uma falácia diante de um mercado de trabalho cada vez mais competitivo), a sua contribuição jamais será sobre o valor total, sobre os R$ 15.000,00 mensais. Ele deverá pagar (sai do seu bolso mesmo) 11% sobre R$ 5.531,31 e, ainda, a sua aposentadoria  jamais terá alguma equivalência com a sua contribuição e nem mesmo com o teto! Dessa forma, mesmo que contribua por toda a sua vida laboral com base nesse mesmo patamar, sua aposentadoria não será concedida pelo teto. O dinheiro que sai do seu bolso sustenta os demais aposentados pobres ou vai para o bolso dos governantes corruptos, como vem acontecendo.

Esse é o resultado de uma previdência ideológica: todos pagam e praticamente ninguém usufrui ou recebe minimamente. Ou melhor, os trabalhadores pobres (e os ricos até o teto, como já exemplificado) pagam, mas quem sai ganhando mesmo são os que não contribuíram no mesmo patamar (trabalhadores rurais e pensionistas, bem como os acidentados em geral, já que estes benefícios não dependem de carência ou contribuição). A ideologia parte do princípio da solidariedade contributiva, que quer significar que todos os trabalhadores da ativa devem doar compulsoriamente uma parte de seu salário para pagar os benefícios do INSS de hoje. Os trabalhadores contribuintes pagam os recebedores. Porém, o problema passa a existir quando existem menos pessoas trabalhando e contribuindo e muita gente recebendo os benefícios. Diminuição da natalidade e aumento da longevidade. Mais idosos, aposentados, pensionistas, adoentados, acidentados e menos trabalhadores. O mais grave de tudo é o envelhecimento da população e uma sobrevida maior do brasileiro (digo problema para a questão previdenciária). Por isso, a quantidade de pessoas que precisa do benefício vai aumentando.

Ou seja, existe uma redistribuição de renda. Mesmo que isso soe como o mais lindo romance do mundo (dar aos pobres um pouco do dinheiro dos mais abastados),  essa tal distribuição de renda não é menos do que o sofrimento alheio de quem é desembolsada a grana para a repartição. De outra parte, também os menos abastados sofrem porque confiam (ou são obrigados a confiar!) num Estado que assume o risco da gestão previdenciária e, apesar disso, não consegue dar conta do recado. O assalariados pagam e não têm o retorno desejado e proporcional àquilo que pagaram. O Estado não dá conta de gerir o dinheiro ou o desvia para outros fins.

Os serviços da autarquia previdenciária deixam em muito a desejar. Aliás, falar desse jeito apenas é um elogio. Só para se ter uma ideia, existe uma placa informando sobre o crime de desacato. Ou seja, o nível de animosidade é tamanho que os segurados não se sentem sujeitos de direitos. Além disso, e o que é pior, o sujeito jamais saberá com quanto irá se aposentar e se vai se aposentar algum dia. O nível de instabilidade política e econômica brasileiras aumenta a necessidade de mudanças legislativas quase a todo momento.

A previdência está quebrada ou deficitária? Acredito piamente que seja uma falácia, uma mentira, que ela esteja, de fato, quebrada. Há rumores da existência da DRU (Desvio de Recursos da União), onde o dinheiro da previdência é realocado para outros fins. Mas, se estiver mesmo falida, essa culpa não pode ser imputada nem aos trabalhadores e muito menos aos aposentados ou beneficiários em geral. A derrota é exclusiva de um Estado malfeitor, que esfrega no rosto dos seus súditos aquilo que ele acha ser viável viver em comunhão de bens. Ou seja, o Estado pensa assim: temos milhões de pessoas que não conseguem sozinhas dar conta de seu futuro, como vamos solucionar esse problema? Vamos redistribuir a renda dos mais abastados, tirando deles e dando aos mais pobres, excluindo-os (os mais ricos) do mesmo padrão da ativa. Esse princípio da redistribuição de renda está previsto na nossa Constituição Federal.

Só se pensa no coletivo e o Estado socialista não está nem aí para o indivíduo contribuinte. O Estado socialista quer manter o nível de pobreza dos indivíduos. É a disputa do poder pelo poder, e não por mais dignidade humana. É a famosa luta de classes que acirra a disputa por contribuintes financiadores do projeto socialista enganoso e astuto. As vítimas somos nós, contribuintes de fato e de direito que pagam as contas da geração presente de beneficiários (todos que recebem algum benefício do INSS).

Theodore Dalrymple em Podres de mimados: as consequências do sentimentalismo tóxico, pela Editora É Realizações, bem como em A vida na sarjeta, pela mesma editora, desbrava um pouco das consequências nefastas de um pai que, por conta própria, resolve transformar desejos em direitos e dá tudo que seu filho pede. Resultado: um círculo vicioso de miséria moral.

“Nenhuma criança que esteja aprendendo a escrever jamais deveria ouvir que alguma letra está mal feita. Toda criança ou homem burro é produto de desencorajamento… Dê curso livre à Natureza, e não haverá ninguém burro.” (Podres de mimados: as consequências do sentimentalismo tóxico, Prefácio à edição brasileira, p. 7).

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