A dinastia dos Castro, que comanda a ilha caribenha comunista com total repressão há mais de meio século, anunciou mudanças em sua Constituição. Há, nas aparências, avanços, como o reconhecimento da propriedade privada (de jure, não de facto, pois o estado continua controlando tudo).
Mas dá para festejar mesmo? O jornal “progressista” carioca achou que sim, e ainda aproveitou para praticar seu esporte preferido, que é endeusar Obama e demonizar Trump:
A Assembleia Nacional de Cuba aprovou no último domingo uma nova Constituição, com mudanças nas áreas econômica e social. A nova Carta Magna ficará sob consulta popular entre 13 de agosto e 15 de novembro, para ser ratificada em um referendo. O documento indica que a cúpula do regime comunista da Ilha busca implementar uma arquitetura semelhante à da China, mesclando economia aberta ao setor privado, relativo avanço na área social e estrito controle político pelo Estado.
[…] Na área social, o novo texto reconhece o casamento “consensual entre duas pessoas”, abrindo a possibilidade para o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo. A mudança foi aplaudida por organizações LGBTs.
[…] Espera-se que as iniciativas aprovadas não sejam apenas mais um exemplo da velha tática de mudar para continuar na mesma. Será uma boa notícia se, embalada pela retomada de relações com os EUA, ainda na gestão de Obama, a nova Carta representar um passo rumo à democratização da Ilha. Apesar de Trump.
Espera-se, diz o editorial, e é isso que a esquerda sempre faz: vive de esperanças ingênuas, sem qualquer contato com a realidade. Habita o mundo da estética, onde discursos e palavras valem mais do que atos concretos e resultados. Os “progressistas” estão inclinados a acreditar em qualquer tirano de esquerda que promete “moderação”, apenas para quebrar a cara invariavelmente. Essa gente nunca aprende com os erros passados.
Na era Obama, tão enaltecida pelo jornal, a ditadura cubana tinha relaxado, justamente porque via no presidente americano um companheiro de punho mole, um amigo, alguém disposto a ceder num piscar de olhos, bastando oferecer palavras e promessas vazias do outro lado.
Agora é Trump do lado de lá, e isso muda tudo: sabe-se que acabou a molezinha, e por isso tem que reformar alguma coisa de fato, fazer alguma concessão para sobreviver. O “apesar de Trump” grifado acima foi retirado da versão online, mas consta na versão impressa de assinantes. Se houver mudança mesmo, não foi apesar de Trump, como diz o jornal, mas sim por causa dele.
Só que é cedo demais para cantar vitórias democráticas na ilha-presídio comunista, como os conservadores sabem, exatamente porque desconfiam de belos discursos e cobram ações concretas. É o que tem feito o ditador comunista da Coreia do Norte recuar em seu programa nuclear pela primeira vez em décadas. Não apesar de Trump, mas graças a ele.
Desconfiar de políticos é parte da essência conservadora. Desconfiar de tiranos é obrigação maior ainda. E desconfiar de ditadores comunistas é uma necessidade vital. O jornal prefere alimentar “esperanças” com base na pura fé estética, enquanto os dissidentes cubanos, que conhecem de perto o regime, preferem criticar as “mudanças” e alertar que tudo pode ser uma simples pegadinha:
Dissidentes cubanos em Miami criticaram a reforma da Constituição aprovada no domingo pela Assembleia Nacional de Cuba, e que será submetida a consulta popular entre 13 de agosto e 15 de novembro. “A reforma é uma manobra visando “legalizar o regime dos militares e proteger os interesses e poder da família Castro”, afirmaram nesta segunda-feira, 23, dois grupos de exilados.
Segundo os dissidentes, a reforma pretende estabelecer um “governo dos militares, para abrir caminho para a nova geração dos Castro”, disse Orlando Gutierrez, secretário-geral do Grupo de Direção Democrática. Segundo Gutiérrez, a anunciada reforma constitucional converte o Conselho Geral de Defesa no governo de verdade da ilha e enfraquece o poder civil.
Ramón Saúl Sánchez, presidente do Movimento Democracia, argumenta que esta reforma constitucional não envolve qualquer modificação do sistema político comunista na Ilha. “Eu suspeito que Raúl Castro quer criar a posição de primeiro-ministro para um de seus filhos, Alejandro ou Mariela, ou algum aliado incondicional”, disse Saúl Sánchez, para quem a reforma visa apenas “dar proteção aos interesses e segurança da família Castro”.
Para eles, a exclusão da palavra comunismo do texto é uma simples “tática”, já que o Partido Comunista continua sendo o único autorizado a atuar politicamente. “É um insulto à inteligência e uma maneira virtual de fingir as condições de uma revolução progressiva que trará liberdade para os cubanos”, afirmou Gutiérrez.
A opositora Rosa María Payá, filha do dissidente Oswaldo Payá, afirmou à agência Efe que a reforma é uma ferramenta da qual a “ditadura precisa desesperadamente para acalmar o descontentamento das pessoas, legitimar o regime e disfarçar a morte iminente dos chamados líderes históricos”. “Esse processo não passa de uma fraude.”
São alertas que precisam ser levados em conta. Mas para o jornal “progressista”, basta acenar para a comunidade LGBT, liberando o casamento gay, que logo conquista a simpatia e sai na foto como “avanços sociais”. A ditadura cubana, na verdade, está apenas se adaptando às demandas da própria esquerda para sobreviver – como uma ditadura opressora de esquerda. Mas agora os escravos gays poderão casar, e continuar escravos. Avanços reais?
Rodrigo Constantino