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Protecionismo: uma lição de Frédéric Bastiat aos nossos parlamentares e a seus empresários prediletos

Por Juliano Oliveira, publicado pelo Instituto Liberal

Sempre que há algum anúncio alvissareiro de que medidas que destravam a economia e liberalizam o mercado serão adotadas, grupos de interesse bem organizados expõem a sua face mais mercantilista e reivindicam direitos que não lhes cabem. Frédéric Bastiat, um dos grandes expoentes da liberdade, foi bastante enfático quando explicou, em seus escritos, como o mantra mercantilista é capaz de levar à penúria toda uma nação. Num de seus muitos esforços para explicar a nefasta ideologia protecionista, o economista serviu-se de um exemplo bastante didático que transcrevo nas próximas linhas:

Um homem do campo possuía 20 acres de terra, nos quais ele trabalhava com um capital de $400. Ele dividiu sua terra em quatro partes e estabeleceu o seguinte esquema de rotação de culturas: 1º, milho; 2º, trigo; 3º, erva; 4º, centeio. Ele destinava à sua própria família apenas uma porção moderada dos grãos, da carne e do leite que sua fazenda produzia e vendia todo o excedente para comprar azeite, linho, vinho etc. Todo o seu capital era gasto anualmente em salários, contratações e pequenos pagamentos para os trabalhadores que ofertavam serviços em sua vizinhança. Mas todo este capital era recuperado com a receita das vendas de sua produção. Mais ainda: ele crescia ano após ano.

Este homem do campo, sabendo perfeitamente que o capital nada produz caso não esteja sendo devidamente utilizado, beneficiava a classe trabalhadora de sua vizinhança ao contratá-la, com seus excedentes anuais, para fazer serviços de manutenção em suas terras, bem como para aperfeiçoar seus instrumentos agrícolas e suas instalações. Ele também possuía uma poupança depositada no banco da cidade mais próxima, cuja gerente, obviamente, utilizava esta poupança para conceder empréstimos para outros empreendedores, de modo que esta poupança se transformava em investimento e renda.

Após um longo tempo, este homem do campo morreu, e seu filho, que o sucedeu, disse para si próprio: “Meu pai foi um tolo durante toda a sua vida. Ele gastava dinheiro comprando azeite sendo que nossa própria terra, com algum esforço, pode passar a produzir azeitonas. Ele gastava dinheiro comprando tecidos, vinho e laranjas sendo que podemos cultivar cânhamo, parreiras e laranjeiras com relativo sucesso. Ele gastava dinheiro com moleiros e tecelões sendo que nós mesmos podemos tecer nossos linhos e moer nosso trigo. Desta forma ele desnecessariamente gastou com estranhos todo o dinheiro que ele poderia ter gasto em nossa própria fazenda.”

Iludido por tal raciocínio, o obstinado jovem alterou todo o sistema de rotação de cultura. A terra foi agora dividida em 20 porções. Em uma ele plantou azeitonas, em outra ele plantou amoreiras, em uma terceira ele plantou linheira, em uma quarta ele plantou parreiras, em uma quinta ele plantou trigo, e assim por diante. Ao fazer isso, ele conseguiu suprir sua família com tudo aquilo de que ela necessitava, e por isso passou a se sentir muito independente. Ele não mais adquiria nada de fora da fazenda, o que significa que ele não retirava nada de circulação. Da mesma maneira, ele não mais acrescentava nada à economia.

Ele ficou mais rico por causa disso? Não. O solo não estava adaptado para o cultivo da parreira, e o clima não era adequado ao cultivo satisfatório das azeitonas. Não demorou muito para ele perceber que sua família estava agora menos provida do que na época de seu pai, que, ao comercializar o excedente de tudo o que produzia, conseguia prover fartamente a família com tudo aquilo que ela queria.

E no que diz respeito à classe trabalhadora da sua vizinhança, tais pessoas não tinham agora mais emprego do que antes. Havia de fato cinco vezes mais campos cultivados, mas cada um deles era cinco vezes menor; eles produziam azeite, mas produziam menos trigo; o fazendeiro não mais tinha de comprar linhos, mas também não mais vendia centeio. Adicionalmente, este fazendeiro podia gastar com salários apenas a quantia de seu capital, e seu capital havia diminuído consideravelmente. Uma substancial fatia dele havia sido direcionada para a construção de novas instalações e para a obtenção dos vários instrumentos necessários para os cultivos mais diversificados em que ele agora estava incorrendo. Em suma, a oferta de mão-de-obra permaneceu a mesma, mas dado que os meios de remuneração da mão-de-obra diminuíram, o resultado final foi uma forçosa redução dos salários.

Esta narrativa ilustra perfeitamente o que ocorre com um país quando nele prevalece a mentalidade estatal e coletivista que prioriza as exportações em detrimento das importações e vê o livre comércio com outros países como um erro a ser penalizado com taxações arbitrárias.

O que aumenta os salários dos trabalhadores de qualquer nação, como já citei noutros artigos publicados neste mesmo instituto, é a sua produtividade. A produtividade, por sua vez, só é possível num cenário em que existem meios de produção (capital) que permitam fazer mais com menos. Não é possível fazer crescer o estoque de capital de um país que direciona seus já carcomidos fatores de produção a atividades nas quais seus trabalhadores não são especializados ou, ainda, como citado no conto de Bastiat, não é possível aumentar o capital de um país ao empregá-lo em atividades que exijam condições que não podem ser atendidas por motivos que fogem ao controle dos próprios empresários que os empregam. Nesta categoria estão, por exemplo, o clima e o solo.

Quando uma sociedade canaliza seus esforços, equipamentos, maquinários e instrumentos à produção de bens e serviços em que, comparativamente falando, é especializada e, paralelamente, delega a produção de bens que não fazem parte de sua especialidade a outras nações, há uma clara tendência de aumento no estoque de capital e, como consequência, no padrão de vida decorrente do aumento “real” de salários e da maior variedade de bens à disposição desta sociedade. Quando o governo, por outro lado, cria barreiras artificiais para que seus cidadãos não comprem produtos a preços mais vantajosos de nações com as quais gostariam de transacionar, este governo está, na prática, ferindo a liberdade de escolha de seus cidadãos e alijando-os da possibilidade de melhorar seu padrão de vida apenas para atender aos interesses de meia dúzia de poderosos que podem financiar suas aventuras políticas e, a um só tempo, exalar seu altruísmo ao divagar sobre o número de desempregos que uma medida liberal poderia gerar.

Toda esta história, o que não é nada incomum, está se repetindo nos meandros do nosso cenário político. Diante do anúncio de que o Ministério da Economia, através da portaria 309, pretende zerar, até dezembro de 2020, o imposto de importação para 30 bens de informática, telecomunicações e máquinas, deputados e senadores, entre aliados e oposicionistas, apresentaram decretos legislativos objetivando derrubar a norma.

Em audiência pública da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) no Senado, empresários, apelando para o populismo dos que advogam em favor do protecionismo, disseram que a portaria pode resultar no desemprego de até 2 milhões de trabalhadores por conta do fechamento de indústrias nacionais que perderão a competitividade.

Em nome do bem estar coletivo e da manutenção de empregos improdutivos, o consumidor é chamado a pagar mais caro por um notebook ou celular. Diante de desventuras de aventureiros como José Serra, os quais adoram utilizar a palavra entreguismo para acusar de imoral qualquer medida liberalizante, é justo e moral que o consumidor tenha, ao menos, o direito de saber por que está empobrecendo e comprando cada vez menos coisas com o dinheiro que ganha. Está comprando menos porque precisa, segundo nossos nobres parlamentares, financiar uma elite empresarial bem conectada.

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