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Quantos homens você conhece que acham graça do “Boa Noite Cinderella”?
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Não sei quanto ao leitor, mas devo estar vivendo numa bolha. E eu poderia jurar que era a esquerda caviar quem vivia numa! Foi o tema do meu livro sobre o fenômeno, e também de vários textos que já escrevi, recomendando livros de Theodore Dalrymple e Charles Murray. A elite da intelligentzia se fechou em seu mundinho e perdeu o elo com a realidade. Mas eis que agora me questiono se não fui eu quem perdeu tal elo. Explico.

Li a coluna de Contardo Calligaris na Folha hoje. Nela, ele conta um caso ocorrido com amigas que impediram um estupro, ao observarem que o sujeito colocara algo na bebida da acompanhante sem que ela percebesse, num restaurante. Tudo acabou bem graças ao heroísmo dessas mulheres. Mas Calligaris questiona se o mesmo aconteceria caso fossem homens a notar o comportamento do potencial estuprador.

Segundo o psicanalista, se fosse esse o caso, era bem provável que tudo acabasse num “estupro coletivo” no estacionamento. Na melhor das hipóteses os homens dariam risadinhas pela “troça” do “companheiro”, e na pior delas seriam cúmplices no ato bárbaro. Em seguida, Calligaris elabora sobre que tipo de gozo um estuprador procura em seu ato tão hediondo. Mas fiquei preso a essa primeira parte: sua premissa.

Então quer dizer que dificilmente um homem teria a mesma reação ao ver um sujeito despejando algo suspeito no copo de uma mulher? Um senso de camaradagem sexual, de identificação por gênero falaria mais alto? É isso? Não sei quanto ao leitor, mas confesso não ter amigos ou mesmo conhecidos que achem graça no golpe do “Boa Noite Cinderella”. E olha que conheço muita gente – sou um cara sociável. E, por óbvio, gente bem mais conservadora, i.e., “machista” pela lente dos “progressistas”, do que Calligaris, ele mesmo um “progressista esclarecido”.

Devo estar andando com as pessoas “erradas”, ou aprisionado numa bolha. Sei lá. No meu círculo de amizades e convívio, não há quem ache graça do estupro. Não há quem daria uma piscadela para um marginal prestes a dopar uma moça para estuprá-la. Ao contrário: arrisco dizer que meus amigos e conhecidos “neandertais”, muitos dos quais gostam de armas e tantos outros admiram Bolsonaro, resolveriam isso à moda antiga. E o estuprador em potencial estaria frito…

Que tipo de homem Calligaris tem encontrado por aí? Como marido e filho de psicanalistas, arrisco uma resposta: essa turma “psi” tem tudo invertido em suas mentes, pois não raro tomam a exceção pela regra. Recebem em seus consultórios gente muito ruim de cabeça, “fucked up”, como dizem, e extrapolam isso para a sociedade toda. Além disso, também levam, eles mesmos, vidas frequentemente disfuncionais, no quinto casamento ou algo do tipo. Daí passam a achar tudo normal ou atacar o próprio conceito de normalidade. Como fazem os atores de Hollywood.

Portanto, sem querer me meter muito na área do próprio autor, deixo a pergunta: não seria esse um caso de projeção? O psicanalista não estaria, talvez, imaginando que quase todos são como ele próprio, em vez de olhar em volta de forma um pouco mais atenta? Seu texto endossa a tal “cultura do estupro”, mas insisto: o que noto por aí é uma cultura de total intolerância com estupradores. Tanto que costumam se dar mal até no ambiente mais criminoso de todos: a prisão.

Nem os bandidos condenados aceitam estupradores. Experimente gritar no meio da rua que Fulano é um estuprador. Ou melhor: não experimente! Haveria linchamento, e quem estaria batendo seria uma legião de… homens. Calligaris acha que a maioria dos homens aceita numa boa, acha graça, ou adoraria participar da “farra”. Ou eu vivo numa bolha, ou os “progressistas” é que vivem. Você decide.

Rodrigo Constantino

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