Por Luan Sperandio, publicado pelo Instituto Liberal
A regra da política brasileira é a imprevisibilidade. Essa constatação é feita mais uma vez no episódio em que Jair Bolsonaro acordou sua filiação ao PSL e desistiu do projeto Patriotas. O movimento, na intenção de ter maiores chances dele chegar à presidência em 2018, possui vários perdedores, principalmente o eleitorado. O presidenciável sepultou 2 projetos que visavam tornar 2 partidos fisiológicos em siglas ideológicas: um partido conservador e outro liberal.
O projeto do Livres e do Patriotas eram relevantes porque, a despeito de termos quase 40 partidos, mais de 70% dos brasileiros não se sentem representados por nenhum deles. Isso se deve ao fato de que os partidos políticos brasileiros não precisam, de fato, representar ninguém para continuarem existindo, graças a privilégios como o fundo partidário. Assim, surgiram dezenas de siglas fisiológicas, sem qualquer compromisso com pautas e proposições prévias, o que incentiva a criação de legendas de aluguel e negociatas.
Para entender esses dois projetos precisamos voltar ao início de 2016. Em março daquele ano, Jair Bolsonaro deixava o PP para filiar-se ao PSC, e o partido lançava-o como pré-candidato a presidência. O projeto feito para ele chegar ao Palácio do Planalto foi interrompido a partir de desentendimentos internos com o parlamentar fluminense ao final daquele mesmo ano. Presidenciável como é, ao longo de 2017, Jair continuou viajando pelo Brasil e sondando partidos em busca de uma plataforma que lhe permitisse disputar a presidência em 2018. Em julho ele anunciou o compromisso com o Partido Ecológico Nacional, que passaria por uma reformulação interna. O propósito: tornar-se o partido conservador brasileiro.
Dessa forma, o PEN providenciou alterações em seu estatuto como parte do acordo para receber Bolsonaro. Retirou dele a causa ambiental e deu uma guinada à direita. Entre as alterações, proibiu-se a coligação com partidos considerados de extrema esquerda e pavimentaram-se deliberações ideológicas: defesa da propriedade privada, contra o aborto e legalização das drogas, a favor da redução da maioridade penal e do uso de armas de fogo para os cidadãos. Dezenas de diretórios passaram a ser dirigidos por indicações do parlamentar e sua assessoria. O Patriotas possuía o promissor projeto de tornar o PEN um partido conservador e com representatividade considerável no Congresso em 2019.
Paralelamente, criou-se o Livres, um grupo de renovação do PSL. Tendo como base a defesa da liberdade individual e econômica, o Livres era responsável por 12 diretórios estaduais e negociava na próxima janela partidária a formação de uma base de até 10 nomes no Congresso, com a ida de parlamentares de outros partidos para o PSL, principalmente os Cabeças pretas do PSDB. Outro fato marcante foi a economista Elena Landau ter saído do ninho tucano e migrado para a Indigo, fundação de políticas públicas criada pela corrente. Essas conquistas pavimentavam o planejamento do Livres de assumir o comando da Legenda ao final do primeiro trimestre de 2018 a partir de uma convenção extraordinária para a troca da cúpula partidária.
O Livres foi possível graças ao apoio do deputado federal, fundador e presidente de honra do PSL, Luciano Bivar, ao passo que o Patriotas possuía a chancela de Adilson Barroso, presidente do PEN. Novamente: eram dois projetos que visavam tornar partidos fisiológicos em ideológicos, destoando do costume da política partidária nacional.
Contudo, a partir de novas divergências internas com a base que estava no PEN antes de Bolsonaro, ele preferiu buscar outra casa e a encontrou no PSL. Luciano Bivar o convidou, e o Livres anunciou sua saída do partido. Bivar pode compor a chapa de Bolsonaro figurando como seu vice na campanha deste ano. No comunicado, eles defenderam em conjunto “o pensamento econômico liberal sem qualquer viés ideológico”, seja lá o que seja isso, além da proteção a propriedade privada, valorização das forças armadas e de segurança.
Pensando em longo prazo, esse movimento de conveniência política de Jair Bolsonaro significa várias derrotas. Ele atrapalha a percepção do eleitorado do que seria de fato o liberalismo e sua distinção do conservadorismo, adia a formação de dois partidos que seriam ideológicos com essas respectivas bandeiras (necessárias para melhoria de nosso debate partidário) e evidencia que o presidenciável não está sabendo fazer o jogo político, criando dificuldades para uma candidatura mais robusta e, eventualmente, sua própria governabilidade caso eleito.
Como resumiu o cientista político Adriano Gianturco, o episódio é mais uma prova de que a política é um jogo de poder, barganhas, troca de favores e, eventualmente, traições. Quem perdeu com isso foi você, eleitor.
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