Já comentei aqui o absurdo da “tese” de um doutor em História pela USP sobre escravidão e liberalismo, como se este não pudesse viver sem aquela. Isso é pura ideologia disfarçada de ciência. Foi justamente o contrário: quem acabou com essa prática nefasta, existente desde sempre, foi o liberalismo, foi a ideia da liberdade individual.
Recomendo um filme imperdível sobre o assunto. Trata-se de “Jornada pela Liberdade” (Amazing Grace), baseado em fatos sobre a luta de Wilberforce e alguns outros amigos pela abolição da escravidão na Inglaterra. O filme é belíssimo, e bastante fiel à realidade, que eu já conhecia por meio do também imperdível livro Enterrem as Correntes, de Adam Hochschild.
Alguns quackers liderados por Thomas Clarkson, o ex-escravo Equiano, o jovem que se tornou Primeiro Ministro William Pitt, e o incansável William Wilberforce foram indivíduos fundamentais nesta batalha pela liberdade, que colocou finalmente um ponto final nessa nefasta instituição do tráfico de escravos na Inglaterra. Uma vez abolido o comércio de escravos na maior potência mundial, foi questão de tempo até acabar com a escravidão em praticamente todo o mundo (os países socialistas ainda preservam a escravidão).
Alguns indivíduos, movidos pela paixão pela Justiça, imbuídos de um forte sentimento de ética, abraçaram uma causa que parecia impossível, e que de fato bateu de frente com opositores extremamente poderosos. Mas apesar do desespero e até da falta de esperança em alguns momentos, eles seguiram em frente, para o bem da humanidade. Ideias fazem a diferença. Indivíduos fazem a diferença.
Algumas pessoas, vítimas de ranço marxista, pensam que a abolição da escravidão foi fruto apenas dos interesses comerciais da Inglaterra na época. Nada mais falso! Quando a escravidão foi abolida, sua relevância econômica ainda era grande, e inúmeros grupos de interesse se organizaram para preservar o status quo. Quem derrotou a escravidão foi um ideal, aquele que fazia pouco tempo tinha inflamado o povo americano por sua libertação, qual seja, a crença iluminista de que todos são iguais perante as leis, com a noção cristã de que todos somos irmãos e filhos de Deus.
Por falar na Revolução Americana, um de seus “pais fundadores”, Benjamin Franklin, dizia: “Aquele que é da opinião de que o dinheiro fará qualquer coisa pode muito bem ser suspeito de fazer qualquer coisa por dinheiro”. Bingo! Há mais que dinheiro no mundo, e devemos sempre ter em mente que nossos princípios mais básicos, nossos valores essenciais, não podem estar à venda jamais.
No Brasil, o grande responsável pela abolição da escravidão foi o monarquista liberal Joaquim Nabuco. Em seu discurso proferido durante campanha eleitoral em Pernambuco, Nabuco deixou bem claro que defendia uma ideia liberal acima de qualquer interesse:
Mas, candidato, como sou, deste partido, represento acima de tudo uma ideia a saber, que a escravidão, palavra que os brasileiros não deviam mais pronunciar porque queima como ferro em brasa a consciência humana, deve ser banida para sempre de nossas leis.
Nabuco unia essa defesa da abolição da escravidão à ideia de propriedade privada no campo, com cada agricultor tendo o título de posse da sua terra, para produzir livremente. Ou seja, a democratização da terra, com base na propriedade privada, e o livre comércio, sem a escravidão como nos latifúndios, eram as principais bandeiras deste reconhecido liberal.
A escravidão não nasceu com o liberalismo; ela terminou com ele. Que doutores em História não saibam disso, ou finjam não saber, é apenas um atestado de como nossa educação fracassou, dando lugar à doutrinação ideológica.
Rodrigo Constantino