A eleição de Bolsonaro despertou muita expectativa positiva na direita em geral, apesar do ceticismo dos liberais por conta de seu passado estatizante e de uma base militante reacionária. Com a equipe montada por Paulo Guedes, porém, a esperança se justificou. Mas faço uma constatação de um fato inegável: desde então, em poucos meses, o clima azedou e muitas trapalhadas explicam maior desconfiança ou pessimismo.
Diante disso, os liberais e também muitos conservadores passaram a tecer mais críticas ao governo, tentando reverter o quadro, consertar o rumo. Perceberam um foco equivocado do presidente, em pautas mais ideológicas num momento em que é crucial aprovar a reforma previdenciária – até para permitir mudanças nas outras áreas. Ficaram assustados com o grau de intransigência da ala ideológica. E cada vez mais gente passa a concordar com Janaina Paschoal: muitos bolsonaristas são petistas com sinal trocado, usando os mesmos métodos.
Quando você entra no jogo cheio de esperança, torcendo para “seu time”, e começa a ver a derrota iminente, um risco até de goleada, o que fazer? Por experiência sabemos: todos passam a criticar o técnico, cobrar mudanças de atitude, substituições. Alguns até passam a xingar o técnico de burro para baixo, às vezes de forma injusta e depositando no técnico um poder miraculoso que ele não possui. Mas eis o ponto: critica-lo nessa ocasião não é torcer contra o time. Ao contrário: é tentar salva-lo!
Muitos bolsonaristas, porém, não conseguem compreender essa lógica. Passaram a enxergar toda crítica, mesmo da direita, como coisa de inimigo mortal, de oposição, de quem torce contra o governo. Quem torce contra o governo não quer ver a reforma previdenciária passar! Quem, ao contrário, faz de tudo para mostrar que, sem mudança de postura, a reforma não passa e a conta cairá diretamente sobre o “técnico”, está tentando ajudar.
Carlos Alberto Sardenberg fez um bom resumo da perda gradual de confiança no governo:
Tudo considerado, as expectativas estão piorando. Estavam bastante elevadas logo após a eleição de Bolsonaro e subiram ainda mais quando se formou a equipe de Paulo Guedes. Mais ainda com as juras de reformas macro e micro e privatizações em massa, além de autonomia das estatais e agências.
Aí surgem os “pequenos” problemas. Algumas péssimas escolhas ministeriais, brigalhada dentro do governo, lideranças ineficientes no Congresso, caneladas nos políticos, os da velha e da nova, ataques a Rodrigo Maia, o grande defensor das reformas econômicas, o caso Petrobras, as derrotas na Câmara.
Tudo coisa que pode ser consertada, mas a sequência certamente reduz a crença na capacidade do governo (e de Guedes) de entregar a política econômica tão apoiada. Não é por acaso que as expectativas de crescimento para este ano são cada vez menores.
O mercado vai ajustando as expectativas, pois o sucesso dos investidores depende de resultados concretos, não de expectativas vazias. Já a militância virtual, cada vez mais fanática e “casada” com seu “mito”, não importa o que ele faça, segue fechada na bolha, atacando todos os críticos, toda a imprensa, como se quem fizesse críticas ao presidente quisesse seu fracasso.
“Estão armando para o presidente, querem derruba-lo de qualquer forma”, escreveu uma leitora. Ora, ele vai cair justamente se a reforma não for aprovada! Um impeachment é muito mais provável se o dólar for para R$ 5 e o desemprego subir para 15 milhões do que se a economia voltar a crescer – o que depende da aprovação da reforma.
“Você posta alguma coisa positiva sobre o governo?”, perguntou outro leitor. Basta acompanhar meu blog para saber que sim. Mas se percebo que há cada vez mais erros e trapalhadas, colocando em risco as reformas e o próprio governo, como não apontar para essas falhas?
“O fato de retratar outros assuntos infere, automaticamente, em não se importar com a reforma da previdência?”, questionou outro leitor “decepcionado” comigo. Questão de foco e prioridade! A reforma previdenciária subiu no telhado e o presidente faz “live” sobre índios? Qual mensagem isso transmite?
Resumo da ópera: alguns de nós, liberais e conservadores, percebemos equívocos graves do governo, que colocam em xeque o sucesso das reformas. Vendo a coisa com risco de degringolar bem diante de nossos olhos, e sabendo do perigo disso para a volta da esquerda, subimos o tom das críticas, gritamos até, para ver se cai a ficha do presidente e se ele se afasta da base mais fanática para priorizar as reformas e focar nos resultados concretos.
Mas tais críticas são vistas pela militância como “traição”, pois o importante, para essa turma, é sempre aplaudir o “mito”, mesmo que o time leve de goleada. “Você queria Ciro Gomes no poder?”, pergunta um militante irritado com minhas críticas. Cruzes! E é justamente esse o meu ponto: se o governo naufragar, o que vai acontecer sem reformas, vem aí um Ciro Gomes da vida!
Os bolsonaristas vão acusar tudo e todos, a imprensa, o Congresso, o STF e até o vice-presidente Mourão, alegando que seu “capitão” foi abandonado, traído. Mas isso em nada ajudará. Será tarde demais. Manter a aura de purista vítima de uma conspiração de bordel pode gerar uma satisfação psicológica, mas não vai reduzir o desemprego, tampouco impedir a volta da esquerda ao poder.
Entenderam a necessidade das críticas, meus caros? Inimigo e traidor é aquele que finge que tudo vai muito bem, que o time está ótimo, enquanto a zaga bate cabeça, os laterais não correm e o goleiro começa a levar frango atrás de frango.
Rodrigo Constantino
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