Por Percival Puggina
A candidatura de Renan Calheiros começou a ruir na sexta-feira (01/02), quando o jovem presidente da sessão preliminar submeteu à deliberação do plenário o voto aberto. Dos 52 votantes, apenas dois foram favoráveis ao voto secreto. Onde estavam os demais 29 senadores? Viu-se ali que o candidato do MDB teria no máximo 31 dos 41 votos necessários. Para mantê-los e conquistar mais alguns ao longo do processo de votação foi preciso tirar Toffoli da cama na madrugada (alguém aí acredita nisso?) para sentar-se ao teclado e digitar um calhamaço inteiro decretando a nulidade da decisão tomada pelo Senado.
A interferência do STF pesou contra Renan e aumentou a pressão das redes sociais sobre os senadores. Isso é fato novo, impensável e incompatível com as rotinas da velha política. O direito de manifestação se democratizou, se digitalizou, e bate no telefone que vai no bolso do deputado, do senador, ou na rede social onde esteja seu perfil.
Durante a sessão de sábado, Renan buscou estancar o vazamento que lhe produzia a atitude serena, austera e adversária da colega Simone Tebet. Quanto mais ele se perturbava, mais ela crescia. A distinção da senadora funcionava como libelo acusador para ele e para os seus. Um torturante sinal de contradição.
O fatigante discurso de Renan como candidato cuidou de buscar simpatias na base do governo. No que disse, ninguém ali estava tão comprometido quanto ele com as reformas necessárias ao país. Na presidência do Senado, seria o poderoso senhor das reformas. No que não disse, sabiam todos: ali estava, investigado em muitos processos, o senhor das impunidades e a mão amiga quando os fantasmas do passado fazem soar a campainha às seis horas da manhã. A insistência de muitos senadores, entre os quais se destacava o gaúcho Lasier Martins, apelando para que os votos fossem declarados ou exibidos, pesava, porém, contra seu projeto de poder.
Ao retirar seu nome e deixar o plenário, aparentando uma dignidade que lhe falta, condenando como antidemocrática a decisão soberana dos próprios colegas, em votos contados, imaginando talvez como abusivo o fato de o público ter opinião e ser ouvido pelo plenário, Renan encerrou um capítulo da velha política ainda aberto por sua reeleição em Alagoas.
De início, antipatizei com o nome “velha política”, usado para designar práticas falecidas nas eleições de outubro passado. No entanto, os episódios desta abertura de ano legislativo no Senado Federal evidenciam a mudança que esse nome designa. Renan precisava do sigilo. Do segredo. “Meu segredo é meu” (Secretude meum mihi”, dizia-se em latim). A porta da sociedade de celerados, contudo, foi arrombada. O abracadabra foi ouvido e a caverna aberta.
Em A Divina Comédia, Dante adverte que “a vontade, se não quer, não cede, é como a chama ardente, que se eleva com mais força quanto mais se tenta abafá-la”. Foi exatamente o que vimos. À medida que as intenções de voto eram manifestadas, sumiram os de Renan. E o Brasil, esse Brasil que volta aos brasileiros, se tornou um lugar um pouco melhor.
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