Na chegada à solenidade de posse do novo comandante do Comando Militar do Sudeste, em São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro reforçou nesta quarta, 3, gesto de ceder às demandas de policiais insatisfeitos com a reforma da Previdência. Ele já pedira abrandamento das normas para policiais federais e rodoviários em telefonema ao próprio relator Samuel Moreira. “Vou resolver o caso de vocês, viu?”, disse ele ao passar por um grupo de policiais militares, informa o Broadcast Político.
Enquanto o ministro Paulo Guedes e sua equipe trabalham duro por uma reforma profunda e justa, enquanto o secretário Rogério Marinho cuida bem do delicado trabalho de persuasão e também articulação, enquanto até Rodrigo Maia parece se empenhar por uma reforma razoável, e enquanto o grosso da imprensa tão demonizada pelo bolsonarismo defende abertamente a reforma, eis que o próprio presidente luta para desidrata-la.
Em diferentes ocasiões, Bolsonaro abriu a boca para desidratar sua própria reforma, como quando falou da idade mínima, ou de retirar a capitalização. Isso para não falar da condição especial oferecida aos militares logo no começo. Se aquele que deve ser o maior defensor intransigente da reforma já cede na largada, que tipo de mensagem isso transmite aos demais?
Convenhamos: Bolsonaro nunca foi um reformista liberal e votou contra reformas dessas no passado, expondo seu lado corporativista. Esperava-se que no cargo de presidente fosse capaz de deixar de lado essa visão mais míope para agir como um estadista, de olho nas próximas gerações, não nas próximas eleições. Mas o papo de reeleição já começou, da boca do próprio presidente e também do seu filho Carlos. O poder sobe à cabeça…
Todos sabemos que policiais formam uma base eleitoral importante para o bolsonarismo. Todos sabemos que ser policial no Brasil é duro mesmo, não só pelo risco de vida, mas pela falta de reconhecimento por parte da população, em especial jornalistas com viés “progressista”. O que não quer dizer que a polícia não mereça críticas legítimas e não abuse do poder eventualmente, ou que não conte com muitos frutos podres em seu quadro.
O problema é que se todos que venderem a dificuldade de suas condições de trabalho forem receber tratamento especial, a reforma acaba! Os professores não são heróis em nosso país também, aqueles que realmente tentam dar aulas em condições terríveis em vez de doutrinar os alunos? E os bombeiros? E tantas outras categorias?
O Brasil é um país pobre, e a situação é ruim para a maioria. Não vamos esquecer que temos 13 milhões de desempregados, gente que provavelmente trocaria num piscar de olhos de posição com policiais ou professores, se pudessem. A coisa está complicada para todo mundo. E por isso mesmo é preciso aprovar uma reforma geral, profunda, com cota de sacrifício para todos, sem privilégios.
Entende-se a simpatia do presidente pela categoria dos policiais. Entende-se a própria demanda também. E é perfeitamente compreensível o cálculo político-eleitoral. Mas nada disso deve ficar acima do que é certo, justo, possível e necessário. Resista à pressão corporativista, presidente! O Brasil tem pressa e não pode ceder a cada grupo de pressão, sob o risco de não sair reforma alguma.
Rodrigo Constantino
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