Em debate promovido em São Paulo pela Fundação Lemann, na noite desta quinta-feira (8), o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, fez críticas ao presidente da República, Jair Bolsonaro. Segundo ele, “cabe ao Legislativo e ao Judiciário, naquilo que entender que ele passou do limite, gerar o limite”.
Para Maia, apoiar a conclusão do mandato de Bolsonaro é uma forma de defender a democrática: “Como defendemos a democracia, Bolsonaro é o que temos até 2022. Mesmo com discurso autoritário, ele sempre foi eleito pelas urnas, desde os tempos de parlamentar até a presidente”. Durante o debate, o presidente da Câmara afirmou que a eleição de Bolsonaro foi “um produto dos nossos erros”, referindo-se à classe política nos últimos 30 anos.
Por mais que se trate de uma reflexão legítima, é no mínimo inadequado o presidente da Câmara externar tal pensamento. Entende-se a mágoa de Maia com bolsonaristas, que investem na narrativa de que ele é um inimigo do governo e até da reforma previdenciária que tanto fez para aprovar. Entende-se o ressentimento diante do discurso da militância bolsonarista que demoniza o Congresso. Mas Maia é presidente da Câmara!
É preciso ser coerente aqui, evitar o duplo padrão. Bolsonaristas que detonam Maia o tempo todo não têm o direito de reclamar. Mas todos aqueles mais moderados que condenavam esses ataques constantes da base bolsonarista têm a obrigação moral de criticar a fala de Maia agora, para não cair em contradição. É o presidente de um Poder atacando como se fosse líder de oposição o presidente de outro Poder, e isso não ajuda em nada o país.
Especialmente num momento desses, em que a reforma prioritária passou nos dois turnos na Casa do Povo e o próprio presidente Bolsonaro aproveitou para elogiar Maia, enquanto seu ministro Paulo Guedes foi além e destacou o “excelente trabalho” do presidente da Câmara. Por que gerar intrigas desnecessárias agora? Maia estaria de olho em 2022?
Se for o caso, é parte do jogo político, claro. João Doria vem dando alfinetadas em Bolsonaro também, sem partir para a oposição, porém. Mantém uma postura de independência para poder elogiar acertos e criticar erros, de olho também em 2022. Mas Rodrigo Maia, repito, é o presidente da Câmara, e não pode – ou não deve – dizer certas coisas, por mais que as pense.
Bolsonaristas acham lindo quando o presidente diz o que vem à cabeça, pois seria sincero, genuíno, e nesse sentido não teriam moral para criticar Maia agora. Mas todos que criticamos o presidente por suas falas impulsivas ou seu “sincericídio” devemos, por coerência, condenar o que disse Maia dessa vez. Não é assim que um presidente da Câmara deve se comportar, chamando o presidente da República de “um produto dos nossos erros”.
Eu posso fazer essa análise como analista independente, e inclusive já constatei que Bolsonaro era um produto do radicalismo da esquerda, uma reação ao establishment aprisionado em sua bolha “progressista”. Mas Maia não é um analista político; ele preside a Câmara, e se o objetivo que a maioria busca é distensionar o clima político no país, então sua declaração em nada ajuda nesse sentido.
Rodrigo Constantino
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