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Se o Carnaval gera riqueza, por que depende de dinheiro público?

Por Ricardo Bordin, publicado pelo Instituto Liberal

Em meio ao cenário de recessão que assola o Brasil desde que o “dique” que segurava a catástrofe financeira engendrada pelo PT em seus 13 anos de Planalto¹ (leia-se: logo após garantir a reeleição de Dilma), as prefeituras de mais de 70 municípios do Brasil já avisaram que não irão destinar dinheiro do pagador de impostos para a realização dos desfiles de carnaval. Não chega a parecer sandice: se eu estou passando por um período de vacas magras, natural é ficar um tempo sem frequentar festas, certo? A irresponsabilidade fiscal, ao fim e ao cabo, cobra seu preço, e supérfluos acabam por entrar na lista de cortes a serem efetuados nas despesas.

Não foi bem assim, todavia, que reagiu determinada parcela de nossa população. Em meio aos muxoxos produzidos aqui e acolá, foi possível captar três principais motivos para o azedume. Vejamos, pois, se procede a choradeira:

1) A festa pagã mais tradicional do país gera empregos:

Segundo consta dos arrazoados, o dinheiro proveniente dos cofres públicos investido na folia de Momo retorna na forma de oportunidades para os envolvidos com os preparativos e a produção do evento. De fato, não há como negar o que se vê.

São criadas vagas diretas no mercado de trabalho quando a administração local repassa dinheiro para as escolas e blocos, e estas, então, compram material para a confecção de fantasias e demais adereços, adquirem instrumentos musicais e promovem gastos afins. A “indústria do carnaval”, ademais, pode ter a capacidade de gerar empregos de forma indireta, estimulando os setores hoteleiro e alimentício, por exemplo, fomentados pelos gastos dos foliões.

Mas o perrengue reside no que não se vê. Se este prefeito direcionar estes mesmos recursos para Educação e Saúde (e eu duvido que alguém de mente sana discorde deste remanejamento), outras atividades econômicas relacionadas a estes setores, da mesma forma, serão impulsionadas e poderão, então, contratar mais pessoal. E se os cidadãos não poderão gastar seus caraminguás durante os dias de apresentações – fazendo o “dinheiro circular”, o sonho dos Keynesianos² (e pesadelo de quem fica pra ver o resultado), fique tranquilo: eles acharão alguma outra coisa para gastar. E possivelmente sejam gastos mais úteis, sinceramente.

Ah, mas e se a festa atrai pessoas de outros rincões? Passemos, então, ao item 2.

2) Se há demanda, então deve haver interesse publicitário;

Carnavais como o do Rio de Janeiro dispensam comentários: são espetáculos que trazem turistas de todas as partes do globo, empilhando dólares e euros nas caixas registradoras dos empreendedores locais, desde o vendedor de chá na praia até o proprietário do Copacabana Palace.

Mas é de se indagar: se este show possui um potencial de marketing tão notável, como ele não consegue se auto-sustentar? Por que as agremiações precisam de subvenção do Estado? Um evento transmitido para diversos países não tem como captar recursos por conta própria?

A resposta, ao que parece, pode ser encontrada no regulamento da liga das escolas de samba do RJ – e que costuma ser emulado, em grande parte, por outras associações do gênero Brasil afora:

Ora, se as escolas de samba são tolhidas por suas próprias entidades representativas da ferramenta mais eficiente que poderiam utilizar para obter recursos – isto é, o merchandising – fica fácil entender porque todo ano seus diretores precisam ir com o pires na mão mendigar para o prefeito e o governador.

Não que seja o caso de fazer um carro alegórico em forma de garrafa de Coca-Cola, ou a porta-bandeira tremular um símbolo do Mcdonalds, mas exibir marcas, de forma discreta, poderia representar a independência daqueles desfiles de carnaval capazes de seduzir a audiência em relação ao governo.

Eu também não gosto muito de ver anúncios na camisa do meu time, mas eu entendo que é necessário para a subsistência dele. Só fica esquisito quando há anunciantes demais. É a diferença entre aquele carro antigo colorido (tal era o número de patrocinadores) da equipe March de F-1, e a eternizada em nossa memória McLaren de Ayrton Sena ostentando o Malboro no aerofólio.

Ou seja, sequer estamos diante de um caso similar aos financiamentos da Lei Rouanet, nos quais costumam ser contemplados certos artistas que jamais sobreviveriam no livre mercado – e outros muito ricos que não precisariam, aliás –, pelo simples fato de que os consumidores, cuja vontade é soberana, não os elegeriam para brilhar nas telas ou palcos. Ao contrário: os organizadores do carnaval são capazes de gerar muita receita, mas eles não conseguem canalizá-la para seus cofres porque se recusam a fazer propaganda – ou são proibidos: em algumas cidades, é a própria lei que restringe a exploração comercial. Aí só resta resmungar mesmo.

3) Se não houver dinheiro público envolvido, não haverá desfiles nem nosso “sagrado” carnaval: será?

Este argumento lembra-me do início do governo Temer: “se não houver Ministério da Cultura, não haverá cultura”, diziam os incautos e os argutos. Quer dizer que as pessoas ficarão trancafiadas em casa na última semana de fevereiro, se não rolar patrocínio estatal? Não haverá samba nos morros e nas periferias? Não sairão às ruas os blocos e muambas? Não se reunirão às pessoas nas praias, nos botecos e até mesmo em suas casas para fazer uma bagunça? Custa-me crer.

Além disso, se fazem tanta questão assim de desfilar na avenida, que tal promover um financiamento coletivo (crowdfunding), como bem ensinou o pessoal do “Libera Que Eu Conservo”³, e mandar uma banana para o prefeito?

Conclusão: não procede a lamúria, meritíssimo. Segue o baile – seja ele de carnaval tradicional ou não: tem gente que prefere carnaval eletrônico ou até mesmo carnaval zombie, veja só. “Não deixe o samba morrer”? Muito justo, desde que ainda haja interesse suficiente das pessoas nos desfiles clássicos de carnaval, e que estes não impliquem em desviar recursos escassos extraídos do setor produtivo que poderiam ser aplicados em áreas mais sensíveis da sociedade.

Ou melhor ainda: a partir de uma eventual economia viabilizada pela negativa estatal em subsidiar o carnaval, o prefeito poderia dar desconto no IPTU, quem sabe. Mas daí é sonhar alto demais…

Nota: Artigo publicado no Instituto Liberal em 01 de fevereiro de 2017.

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