O ex-governador do Rio Sergio Cabral resolveu assumir que é ladrão, que recebeu propina, aquilo que o mundo todo já sabia e que era o motivo de sua condenação a vários e vários anos de cadeia. A fala cria expectativas sobre uma “Lava Toga”, com a denúncia de juízes. Mas meu foco aqui será outro.
Em determinado momento, Cabral admitiu que não foi capaz de resistir ao poder: “Esse meu erro, erro de postura, não é, de apego a poder, a dinheiro, a tudo isso, isso é um vício”. Sobre porque mentiu antes, ele disse: “Dói muito, hoje já não me dói mais, espiritualmente eu estou bem para falar isso, mas dói muito alguém que tem uma carreira política reconhecida pela população, é uma dor muito profunda”.
Cabral já não gozava de boa imagem perante os cariocas, em termos de honestidade, e ninguém ficou muito surpreso quando o escândalo veio à tona – talvez só pela magnitude da coisa, digna de uma máfia siciliana. Mas o interessante é o ex-governador contar que o poder o seduziu, que a tentação foi irresistível, e que tudo isso é como um vício.
Ele está certo nisso. Normalmente, as pessoas que buscam tanto assim o poder já demonstram uma ambição desmedida e raramente a força do caráter está entre as maiores qualidades dessas pessoas. Por isso Thomas Sowell disse que a pessoa que mais quer chegar ao poder costuma ser a menos qualificada para tanto, e que quem não deseja o poder seria o melhor governante.
Mas eis o ponto que sabemos desde os gregos antigos: o poder corrompe. Como constatou Lord Acton, o poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente. O anel de Gyges revelado por Platão retrata bem isso. Tolkien também tratou muito bem do assunto em “O senhor dos anéis”. Gollum definha porque o poder é um vício, uma droga que faz a cocaína parecer recreio de criança.
É por isso que os liberais e os conservadores são tão céticos quanto ao estado: ele é ocupado por pessoas que acumulam muito poder. Mesmo que fossem pessoas muito decentes, uma premissa otimista demais, para dizer o mínimo, o próprio poder iria desvirtuar a maioria. Sergio Cabral já era alguém sem muita credibilidade, mas mesmo uma pessoa melhor poderia, sim, corromper-se no poder.
Revolucionários acreditam em líderes “incorruptíveis”, e costumam se importar menos com a extensão do poder, com o escopo do governo, e mais com quem ocupa esse cargo. Acham que se for a “pessoa certa” tudo será uma maravilha. Ledo engano! Deveriam escutar mais os alertas de liberais como Benjamin Constant e Lord Acton: é o próprio poder que precisa ser esvaziado, controlado, dividido, checado. Sempre.
Por isso é tão importante uma Justiça eficaz e uma imprensa livre que faça seu trabalho investigativo e denuncie os governantes pegos em desvios de conduta. É o mecanismo mais importante que existe numa democracia para manter os poderosos dentro de certos limites, reduzindo a impunidade. E mesmo assim, como sabemos, isso não basta: o poder é um vício que faz muitos se jogarem num abismo, mesmo quando os riscos de punição são altos.
Que venha, então, a “Lava-Toga”, pois ela é necessária. Mas nunca será suficiente. Com tanto poder concentrado assim, podemos apenas esperar pelos próximos escândalos em proporções assustadoras. Há muito viciado por aí…
Rodrigo Constantino
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