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Por Percival Puggina

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Quando acontece de modo singular, tem-se a frustração. Quando se repete, a irritação. Quando se torna frequente, vem a depreciação. Lembremos. Ao concluir-se a votação do impeachment da presidente Dilma, a senadora Katia Abreu apresentou aquele famoso destaque propondo o fatiamento da pena para que o impeachment não acarretasse perda dos direitos políticos. Tratava-se de um arreglo tramado em sigilo, durante reuniões de elevada hierarquia, que acabou se transformando em decisão política com a qualidade jurídica de caderno de armazém.

Quem discursou em favor da medida? Renan Calheiros, que justificou a providência com o consistente argumento segundo o qual aplicar o impeachment e sua consequência natural seria dar um coice depois da queda. E quem proporcionou aval jurídico àquela decisão (dizendo que não estava a fazer isso, como soe acontecer no STF)? O ministro Ricardo Lewandowski, que presidia o Senado transformado em tribunal. Ele argumentou que se aceita a dupla punição, a presidente estaria inabilitada até para ser merendeira de escola. E Dilma, que perdeu o mandato por crime de responsabilidade, para não incidir sobre ela o absurdo impedimento de não poder ser merendeira, ganhou o absurdo direito de, em tese, disputar novamente a presidência em 2018… Frustração!

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Passaram-se 90 dias. Ontem pela manhã, no plenário do Senado, ocorreu uma sessão temática sobre o tema Abuso de Autoridade, objeto da controversa emenda ao projeto das medidas contra corrupção. Entre os convidados de Renan Calheiros, para um previsível antagonismo, o ministro Gilmar Mendes e o juiz Sérgio Moro. Ante um magistrado sereno e consistente em sua exposição, o ministro partiu para a arrogância e menosprezou os dois milhões de assinaturas populares às Dez Medidas contra a Corrupção. Disse: “Aprendi em São Paulo que quem contrata o sindicato dos camelôs, em uma semana consegue 300 mil assinaturas”. Ficou visível ao lado de quem Gilmar Mendes estava, dois dias após as indecorosas deliberações do dia 30 na Câmara e o empenho de Renan em aprová-las no Senado horas mais tarde. Irritação!

Logo após a sessão temática, o STF se reuniu para deliberar sobre o pedido de abertura de ação penal contra Renan Calheiros. O MPF apontava evidências de cometimento de dois crimes, mas um deles ganhou o almejado prêmio da prescrição por decurso de prazo, tão desejado quanto frequente. Contudo, para desgosto de três ministros, a acusação de peculato prosperou e o seguimento da ação penal foi aprovado por 8 a 3. Quais três? Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Pois é.

Na sequência da mesma sessão, julgava-se, com seis votos favoráveis e nenhum contrário, a ação movida pela Rede sobre o impedimento de que réu em ação penal possa ocupar cargo na linha sucessória da Presidência da República (situação em que ficara Renan Calheiros pela decisão anterior). Com seis votos favoráveis, a questão já estava resolvida e Renan Calheiros podia começar a esvaziar as gavetas. A menos que…? A menos que Toffoli fizesse o que fez tão logo lhe coube falar, ou seja, pedisse vistas e levasse o processo para engavetá-lo sem prazo para devolver a seus pares. Depreciação!

A nação quer ir para um lado e o STF, em total dissintonia, vai para outro. É a isso que nos conduz um quarto de século de indicações autorrotuladas progressistas. Temos um STF que não conheceu formação de quadrilha no mensalão. Temos um STF onde não há uma única, singular e solitária voz que expresse convicções liberais ou conservadoras. Pode parecer amargo este texto, mas quanto mais complexos os sentimentos e mais difícil a tarefa de expressá-los, mais necessário se torna fazê-lo.