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Entendo aqueles que pensam que a única saída realista para o dilema dos gastos públicos é a flexibilização do teto. Afinal, há uma esquizofrenia estatal aqui: a Constituição manda gastar, a lei impede o gasto. Mais de 90% das despesas são obrigatórias, e aumentam à revelia do desejo do governo. Mas ele está proibido ao mesmo tempo de ultrapassar certo limite. O que fazer?

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William Waack explicou bem o impasse em sua coluna: “A equipe econômica acredita, acompanhada por importantes segmentos da economia, que a agenda de concessões, desburocratização, melhoria do ambiente de negócios e desregulamentação trará crescimento num horizonte de médio prazo. O problema é o que fazer até lá, pois economia andando devagar, renda familiar comprimida e desemprego persistente nunca trouxeram dividendos políticos a governo algum”.

“Pela primeira vez estou escutando com insistência amigos dizendo que a PEC do teto dos gastos é muito dura, está inviabilizando o setor público”, admitiu o competente secretário do Tesouro, Mansueto Almeida. E fuzilou: “A realidade dos fatos é que a gente tem um país que tributa muito, gasta muito, não tem capacidade de investimento e ainda tem ajuste fiscal a ser feito”.

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Os liberais que aceitam a flexibilização momentânea enquanto as reformas estruturais não saem ou não surtem o desejado efeito econômico estão como Santo Agostinho: dê-me castidade, mas não agora! Acreditam que é possível afrouxar um pouco o teto, de forma pragmática, desde que não abandonem as reformas. Mas funciona assim?

Waack chama os que temem abrir a “boca do inferno” de “puristas”, mas acho que estão mais para realistas mesmo. Conhecem a trajetória do estado brasileiro, sabem que, sempre que for possível expandir gastos em vez de cortar despesas, esse será o caminho escolhido, o atalho da demagogia. Só pressão constante, maçarico no cangote dos políticos, pode levar ao avanço das reformas.

Flexibilizar teto, portanto, é como abrir a caixa de Pandora, como disse Alexandre Schwartsman, ou oferecer uma dose de bebida para um alcoólatra, como comparou Zeina Latif, da XP Investimentos. Esse teto tem que ser feito de cimento, precisa ser “imexível”. Se ele for construído com bambu, se for flexível, se a classe política achar que pode sempre muda-lo de lugar, então nunca vamos abandonar o vício do populismo irresponsável.

É hora de encarar a fase da abstinência, sem pedaladas fiscais, sem truques, com coragem e determinação. Nesse sentido, é confortante que o presidente Bolsonaro tenha voltado atrás, após falar de questão de “matemática” e alegar que teria de desligar luzes em quartéis. Ele tuitou hoje cedo, indo ao encontro da posição do ministro Guedes e também do presidente da Câmara, Rodrigo Maia:

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O editorial do Estadão hoje também foi sobre isso, e condenou qualquer flexibilização do teto:

Seria um erro mudar a regra do teto de gastos, disse o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e ele está certo. Cuidar da despesa é muito mais importante, mais produtivo e menos perigoso, neste momento, do que relaxar o controle das finanças públicas. Afrouxar o limite seria esconder o problema, em vez de tentar resolvê-lo, ponderou o deputado. Esse comentário vale como defesa da seriedade. O governo mal começou a arrumação de suas contas e será preciso alcançar resultados sólidos, nos próximos anos, antes de relaxar. Será fundamental mexer na composição da despesa e, como parte do esforço, na qualidade da administração.

[…]

Criado por emenda constitucional no governo do presidente Michel Temer, o teto de gasto tem sido um importante fator de disciplina fiscal. Pela regra, o aumento da despesa de um exercício para outro pode corresponder no máximo à inflação do ano-base. Não há, portanto, crescimento real.

Essa limitação deve contribuir, em princípio, para o reequilíbrio das contas e para a obtenção, dentro de alguns anos, de superávits primários. Com esse dinheiro o governo poderá liquidar pelo menos os juros e conter a expansão da dívida pública, muito grande pelos padrões internacionais.

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[…]

Reformas como essas deverão envolver muito debate e muitas pressões, principalmente corporativas, mas nunca se avançará o suficiente sem cuidar desses assuntos.

A curto prazo, o governo terá de continuar enfrentando as dificuldades associadas ao teto. Se for indispensável, será possível, de acordo com a regra em vigor, recorrer aos chamados gatilhos para conter os gastos com servidores. A regra do teto já contém um remédio para aliviar as dificuldades em casos muito especiais.

[…]

A equipe econômica deve ter consciência de um risco especialmente importante: qualquer ensaio de mexida no teto poderá desencadear pressões muito fortes para aumento de despesas. Será muito fácil apresentar listas enormes de gastos importantes e urgentes. Se os defensores do ajuste cederem, o desastre poderá ser enorme. O governo adicionará a um primeiro ano economicamente muito ruim a recaída no descontrole das contas públicas.

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Não é alarmismo de purista: é previsão de realista. Os políticos estão sempre ávidos por mais gastos. Se não tiverem pela frente uma barreira sólida, o céu é o limite. Por isso o teto precisa ser, repito, de cimento, jamais de bambu. Que o governo Bolsonaro se mantenha firme nesse propósito!

Rodrigo Constantino