Como votar nesta quarta foi um tema que realmente dividiu muita gente na direita, o que, por si só, deveria ser motivo para calma, prudência e cautela. Se tanta gente boa está tão dividida, então deve ser sinal de que a escolha não era trivial. Eu mesmo, após um duro texto contra o voto de Bolsonaro, que julgo equivocado, reconheci isso e publiquei na minha página outro texto, expondo a “vitória de Pirro” da votação a favor de Temer.
Mas, até para sair da defensiva, muitos seguidores de Bolsonaro e sua própria família têm feito um discurso de que somente seu voto era aceitável, e que quem discorda é “defensor de corrupto”, ou prega a moralidade apenas 90% do tempo. Ou seja, quem não votasse como queriam o PT e o PSOL era um vendido, um incoerente, um defensor de corruptos. Aí já é demais.
Se tanta gente boa, liberais e conservadores acima de quaisquer suspeitas, criticaram o voto contra Temer, então, repito, isso deveria ser motivo para uma pausa e uma reflexão mais profunda. Um texto de Silvio Medeiros explica melhor meu ponto:
Todo mundo que eu não gosto é comprado pelo Temer? Calma aí, cara pálida.
A política seria mais fácil, admito, se fosse como um roteiro da Disney, onde o mundo se divide entre forças do bem/mal e quem representa o bem é franzino e bonito e o mal é feio e fala grosso. A realidade é muito mais complexa e os interesses e motivações são tão fragmentados e desencontrados que nem um roteiro de Game of Thrones daria conta de descrever.
Acreditar num parlamento motivado apenas pelo bem comum é tão ingênuo quanto acreditar num parlamento movido apenas por compra de votos. Por incrível que pareça, existem mais motivos para se votar contra a denúncia do Temer do que apenas negociatas espúrias.
Ao contrário de Dilma, os parlamentares não viram as maiores manifestações de rua da história do país, nem uma única, tomando as cidades e através da aclamação popular o pedido uníssono de queda de Temer. Aqueles balões da CUT não deram conta de encher nem o vão do Masp.
Do ponto de vista econômico, Dilma foi a causa da crise, e Temer está sendo a causa da estabilização. Olha a valorização do seu dinheiro, o Real. Com Dilma no poder o dólar chegou a custar R$4,30, agora está em R$3,00. Com Dilma no poder, o custo do crédito, a taxa de juros chegou a 14% e agora já está em 9.25% com previsão de chegar a patamares ainda menores. Com Dilma, seu poder de compra caiu a patamares históricos, com Temer você sacou seu FGTS. A bolsa de valores, nosso principal termômetro de como os investidores estão confiando na capacidade de geração de riqueza do Brasil, desde o fundo do poço deixando por Dilma, já se valorizou 83%, tirando nossas empresas principais da lama.
Aliás, ainda falando sobre economia, mês passado tivemos a primeira deflação no Brasil em 11 anos.
Existe uma diferença gigante entre um processo de impechmeant e um processo de investigação por crime comum como o enviado contra o Temer. Se ontem o plenário aceitasse que Temer fosse investigado, e o STF acatasse o processo, Temer ficaria afastado por 180 dias e Rodrigo Maia assumiria o cargo. Isso muda tudo. Seria uma quebra tão abrupta nesta contínua melhoria estrutural que o país vem recebendo que a bolsa de valores, no dia que vazou o tal audio do Temer dizendo “tem que manter isso aí”, chegou a cair mais de 15%. Além disso, se o Supremo condenasse o Presidente, entraríamos na famigerada querela das eleições indiretas, impopular mas a única alternativa prevista pela constituição. Essas eleições indiretas se dariam, muito provavelmente, a menos de um ano das eleições diretas de 2018. Ou seja, assistíramos no Brasil, em quatro anos, quatro Presidentes, com toda a instabilidade que disso decorre.
Se coloque por um momento na mente do parlamentar. Ele vê a rejeição grande ao Temer mas ao mesmo tempo vê que as manifestações populares contra o presidente praticamente inexistem perto do que aconteceu com a Dilma, a economia ainda frágil mas dando sinais de melhoras sucessivas depois da pior crise que este país já enfrentou, 14 milhões de desempregados gerados pela instabilidade política e pela fuga de investidores, e um processo de investigação que afasta automaticamente o presidente independente de ser culpado ou inocente. Você acha que ele precisa APENAS de uma emenda parlamentar que vai para o bolso de entidades credenciadas num processo altamente complexo e burocrático, como santas casas, casas de amparo, creches, escolas, prefeituras, que tem um cronograma lentíssimo e pode ser totalmente rastreado pela internet?
Além do mais, votar contra a investigação não significa inocentar o presidente, que pode e será investigado pela justiça comum no primeiro dia após a entrega do seu mandato. O que os parlamentares fizeram ontem foi decidir que para fazer a transição até 2018 é melhor um ruim que conhecem, que está sendo monitorado e que está estancando a crise do que um desconhecido que pode fazer o Brasil entrar novamente em estado de choque.
Irretocável. Não era uma decisão simples, como alguns dão a entender. Não era uma coisa maniqueísta, do tipo “quem é contra corrupto tem que votar contra Temer e ponto final”. Essa mentalidade é ingênua, quase infantil. Pode servir para narrativas de campanha, para slogans marqueteiros, mas não condiz com a dura realidade de nosso país. E quem quer que deseje governar esse complexo Brasil deve demonstrar um mínimo de maturidade.
Isso não quer dizer, claro, que era obrigatório votar para enterrar estas denúncias de Janot. Mas não é aceitável transformar tal voto em única alternativa para defensores da ética. Esse monopólio da virtude não é honesto. É até coisa de petista!
Rodrigo Constantino