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Trump: um ególatra fanfarrão, mas que ainda pode se tornar um grande estadista

Terminei de ver ontem “Trump: An American Dream”, minissérie em quatro capítulos da Netflix que navega pelas últimas quatro décadas da vida do atual presidente. Trata-se de um apanhado o mais neutro possível, com amigos, ex-funcionários e detratores dando suas opiniões sobre aquele que sempre buscou holofotes para si mesmo. O que emerge é exatamente isso: um ególatra preocupado com a autopromoção constante.

É curioso ver o atual presidente já naquele jovem, repetindo as mesmas frases de efeito, como “será ótimo para todos, fantástico”, ou “será um tremendo sucesso”. Parece coisa de um eterno vendedor um tanto embusteiro, um robô programado com base em livro de autoajuda.

O documentário começa quando Trump ainda precisa sair da sombra de seu pai, um empresário de sucesso do ramo da construção civil, e termina com sua decisão resoluta de disputar – e vencer – o cargo mais poderoso do planeta. Passa pela vida pessoal e amorosa do playboy, mostra um sujeito que tem que se provar o tempo todo, conquistar o mundo para se sentir vivo.

Ambição desmedida, uma visão de mundo simplista e binária, onde só existem predadores e presas, e ele certamente queria sempre estar do lado dos predadores. Alguém amoral, enfim, que só pensa em vencer, em se destacar perante o mundo, em ter seu nome estampado por todo lugar. Essa imagem, que parece fiel aos fatos, é aquela retratada no documentário.

As partes mais interessantes são os insights dos valores de Trump, ou da falta deles. Um comentarista diz que no funeral de seu pai, Trump “usou isso como uma ocasião para falar sobre seus próprios sucessos nos negócios. Como ele não estava mal. Como ele daria a volta por cima”. O documentário sugere que Trump pode ter se inspirado na campanha de sucesso de Jesse “The Body” Ventura para governador de Minnesota. O gerente de campanha da Ventura, Dean Barkley, descreve como Trump voou para Minnesota para perguntar-lhes como conseguiram tanta publicidade. “Ele não estava interessado em questões específicas”, diz Barkley. “Ele estava apenas interessado em se tornar presidente”.

Mas se Trump tem todos esses defeitos e vícios, tem claramente qualidades importantes também, principalmente do ponto de vista de um gestor. É implacável na negociação, é frio, foca em resultados, pensa grande. Pode não ser um exemplo de marido, ou mesmo de ser humano, mas tem os atributos necessários para ser um grande estadista. E é isso, afinal, que está em jogo aqui: ninguém quer ter em Trump um ícone, uma referência moral, e sim alguém que faz as coisas acontecerem.

E isso ele sabe fazer, ainda que correndo enormes riscos, como nos empreendimentos megalomaníacos de Atlantic City. O “homem laranja” quer deixar sua marca no mundo, quer ser o centro das atenções. Tudo bem: desde que para tanto tenha que fazer um bom governo, enfrentar ditadores com frieza e calculismo, seduzir o público e seus representantes e desafiar o establishment corrompido.

Se, para suas conquistas ambiciosas, ele tiver que deixar mesmo um legado duradouro, então a América poderá agradecer: sairá dessa empreitada “maluca” e narcísica grande novamente!

Rodrigo Constantino

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