A esquerda caviar não é um fenômeno novo. Ao contrário: na década de 1960, era absoluto! Chamava-se “esquerda festiva”, aquela que ia fazer a revolução dos butecos chiques. Pois bem: a Gradiente, de olho no público-alvo dos “revolucionários filhinhos de papai”, fez uma propaganda excelente. Vejam:
Eis a síntese do texto:
A melhor maneira de combater o sistema é estar por dentro dele. Comece sua luta comprando um conjunto de som da gradiente. Os amplificadores […] são produzidos por um grupo de capitalistas extremamente lúcidos. Que sabem que a procura só é boa quando a oferta é muito boa. Por isso, há mais de 12 anos eles produzem equipamentos de som que oferecem o máximo de fidelidade que um contestador pode exigir (você ouve o Dylan gravado ao vivo como quem está vendo ao vivo; o Belchior gravado como quem está no estúdio). E oferecem também uma rede de revendedores com os melhores planos de pagamento do mundo ocidental. Compre […] para ouvir com perfeição as denúncias graves, médias ou agudas dos seus cantores de protesto preferidos. Quem sabe até você acaba chegando à conclusão de que a sociedade de consumo não é tão ruim assim.
A sacada foi genial, devemos admitir. Só tem um problema: o capitalismo da Gradiente era aquele “de estado”, com forte simbiose com o governo. A empresa, fundada em 1964, cresceu bastante na década de 1970 (eu mesmo tinha um trambolho daqueles, de péssima qualidade). O principal motivo? A proibição da importação de eletrônicos. Uma mãozinha e tanto do estado!
Seu dono, Eugênio Staub, foi o primeiro grande empresário a defender a candidatura de Lula em 2002. Chegou a afirmar que Lula havia se mostrado um estadista depois. A empresa, não obstante, enfrentou séria crise financeira em 2007 e 2008, quase indo à falência. Precisou entrar em processo de recuperação extrajudicial.
Em 2012, a empresa, já renovada, meteu-se em nova confusão ao anunciar seu smartphone Gradiente iphone. A marca pertencia à Gradiente no Brasil, e nada como pegar uma carona no incrível sucesso da Apple. Alguns mais desatentos podem ter comprado gato por lebre…
Enfim, aquela propaganda foi muito espirituosa, e merece aplausos. Mas a Gradiente, nem tanto. Nunca foi um ícone do capitalismo de livre mercado. Esse sistema, ela realmente combatia “de dentro”, com forte ligação com o estado. Não é isso que os liberais defendem. Nós preferimos a Apple do falecido Steve Jobs. Cada um com suas preferências…