A presidente Dilma, que ainda insiste na tese ridícula de que sofremos apenas problemas conjunturais por conta da crise externa, afirmou que 2015 se trata de um ano de travessia, mas que em breve tudo irá melhorar. É a mesma pessoa, não custa lembrar, que dizia que tudo estava uma maravilha há poucos meses, na época da eleição, e que nenhum ajuste seria necessário. A mesma, também, que dizia que a oposição, caso vencesse, subiria juros, impostos e cortaria conquistas trabalhistas, fazendo a comida desaparecer da mesa dos mais pobres. Ou seja, tudo o que ela mesma fez.
Sim, o Brasil vive um ano de travessia. Para ser mais correto, vive uma período longo de travessia, iniciado em 2003. Resta saber: em qual direção? Travessia é a saída de um ponto de partida até o ponto de chegada. De onde saímos, nós sabemos: da era tucana, com o tripé macroeconômico, a Lei da Responsabilidade Fiscal, o Plano Real, a autonomia do Banco Central. Mas para onde estamos indo mesmo? Qual o destino final dessa travessia?
“Se um homem não sabe a que porto se dirige, nenhum vento lhe será favorável”, alertava Sêneca. O Brasil pegou o vento mais favorável do século durante a era petista. A China resolveu mergulhar em uma revolução industrial tardia, seu crescimento foi voraz, como sua demanda por commodities que não possui. O custo do capital nos países desenvolvidos nunca esteve tão baixo, levando a um tsunami monetário, para usar expressão da própria presidente, uma enxurrada de dólares, euros e ienes buscando investimentos nos países emergentes. E ainda tivemos o bônus demográfico, com o auge da população jovem no mercado de trabalho.
Mas todo esse vento – ou ventania – a favor de nada serviu. O Brasil ganhou na loteria e desperdiçou o prêmio, rasgou o bilhete. Tivemos a década esbanjada, para usar a expressão de Paulo Rabello de Castro. O governo torrou os recursos extras de forma populista, como se não houvesse amanhã. A cigarra achou que o verão duraria para sempre, e se pôs a cantar as maravilhas do novo governo, da “nova matriz macroeconômica”. Como o apresentador Sílvio Santos, o governo começou a perguntar “quem quer dinheiro”, e lá se iam as notas em forma de aviãozinho. Com o agravante de que, no caso, o dinheiro não era deles, mas nosso.
Mas o dinheiro acabou. A realidade bateu à porta, e o inverno chegou. A cigarra está doente. Dilma coloca Guido Mantega para escanteio e chama o “banqueiro” Joaquim Levy, da Universidade de Chicago. Ele anuncia, sem a presença da presidente Dilma, um “ajuste fiscal” tímido, de 1,13% do PIB. Poucos meses depois, a realidade continua a bater à porta, com mais força. A receita tributária cai, pois a economia desce ladeira abaixo. O “neoliberal” anuncia, então, um novo “ajuste”, dessa vez de praticamente zero. É mais realista. Mas não é ajuste verdadeiro. É uma piada de mau gosto.
Dilma, diante disso tudo e da aprovação de ridículos 7,7% dos brasileiros, por acaso faz um mea culpa em público, curva-se por 15 segundos diante das câmeras para pedir perdão, como fez o presidente da japonesa Toshiba por muito menos? Dilma reconhece o absurdo das enormes “pedaladas fiscais”, por acaso? Dilma rejeita com veemência sua “nova matriz econômica” e admite que o país precisa de uma mudança radical de rumo? Nada disso. Continua culpando a “crise externa” e minimizando o estrago que causou em nossa economia.
O ministro Levy admite que não está mudando o rumo, no caso, do “ajuste fiscal”, e diz: “A gente não está mudando de rumo, Estamos ajustando as velas porque o tempo mudou”. Sim, ajustar as velas é medida inteligente, como sabia William George Ward: “O pessimista se queixa do vento, o otimista espera que ele mude e o realista ajusta as velas”. Mas sem o alerta de Sêneca acima, isso é inócuo. Ajustar as velas em qual direção? Para um “ajuste fiscal” patético que nada resolve? Sem sequer o reconhecimento público de todos os infindáveis equívocos da gestão desenvolvimentista? Com Luciano Coutinho ainda à frente do BNDES? Com 40 ministérios? É isso?
Sim, o Brasil passa por uma longa travessia, e só agora os ventos realmente mudaram de direção. O transatlântico começa a naufragar, pois bateu num iceberg chamado PT. Estamos atravessando um mar revolto, mas não estamos apontando para a direção certa. O PT ainda adoraria nos levar às margens da ilha caribenha cujo senhor feudal é tão idolatrado por todos eles, inclusive pela presidente Dilma, que faz afagos no decrépito ditador assassino. Ou então às margens das ilhas gregas, com a extrema-esquerda no poder fazendo bravatas enquanto o povo sofre com a crise. O partido ainda elogia seus companheiros do Foro de São Paulo, que destruíram seus respectivos países com o bolivarianismo. Dilma ainda vê em Maduro um camarada. Travessia, sim, mas para onde?
Quem quiser acreditar que Dilma realmente mudou, que entendeu tudo que fez de errado, que deseja de fato levar o Brasil na direção oposta àquela que pretendia antes, que confia plenamente no ministro Levy, que acordou para o equívoco que é o nacional-desenvolvimentismo, que já sabe que a turma da Unicamp não entende nada de economia, é livre para isso. Mas recomendo cautela. Estamos todos no mesmo barco. Seria prudente ter uma visão realista de quem é o capitão, ou, no caso, a capitã. Felizmente, parece que somente uns 8% dos brasileiros acreditam na presidente. Enquanto Dilma fala de travessia, eis o que um jornal carioca estampa em sua capa:
Travessia? Rumo ao quê? Quem vai rumo ao inferno também está numa travessia. O que importa não é saber que estamos em meio a uma travessia, e sim compreender bem em qual direção estamos indo. Com o PT no governo, a resposta parece clara: estamos indo em direção à destruição completa de nossos pilares econômicos, herdados da era tucana. Estamos indo em direção ao caos social. Estamos flertando cada vez mais com o destino argentino ou grego. Eis uma travessia que dispenso, que não faço questão alguma de fazer parte. Já passou da hora de trocar o comando do navio. Ou isso, ou o naufrágio nos espera!
PS: No dia 16 de agosto, todos aqueles cansados com essa “travessia rumo ao caos” devem ir às ruas protestar, mostrar ao governo sua insatisfação, sua indignação, sua revolta (de forma pacífica e civilizada, claro). O recado precisa ficar claro, transparente, pois parece que o pessoal do governo ainda não entendeu.
Rodrigo Constantino
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