Devo ter sido um dos maiores críticos do BNDES nos últimos anos. Confesso: estive mesmo obcecado com o tema. É que muitos “liberais” e empresários, que eram só críticas ao intervencionismo populista do PT e repudiavam o Bolsa Família, ignoravam ou até teciam elogios ao BNDES. “Ah, o Brasil precisa de um banco público de fomento para o desenvolvimento, não podemos abrir mão disso”, diziam.
Não? O que é o Bolsa Família perto dos subsídios do BNDES? Um custa pouco mais de R$ 20 bilhões para atender, de forma populista (pois sem estratégia de saída), milhões de famílias; o outro custa ainda mais em subsídios, para atender uma dúzia de grandes empresas, basicamente (mais de 60% dos desembolsos vão para poucas e grandes empresas). O BNDES se tornou no maior símbolo do nefasto “capitalismo de laços” da era lulopetista, um regime socialista na prática (o estado controla tudo ou muito), disfarçado de capitalismo.
Escrevi dezenas de artigos sobre o banco, sobre como ele produz o efeito “crowding out”, espantando investimentos privados e atrasando o avanço de um mercado de capitais no Brasil, sobre como seus desembolsos a taxas subsidiadas ajudam a manter o restante da economia com taxas bem mais altas, sobre como ele representa um perigo para o livre mercado ao realizar a tal seleção dos “campeões nacionais”, e sobre como tudo isso era um palco tentador demais para corrupção e prostituição do regime democrático. Enfim, o BNDES precisava acabar, eu concluía de forma “radical” para o espanto de muitos.
Pois bem: eis a notícia em destaque na Folha hoje:
Marcelo Odebrecht relatou a procuradores da Operação Lava Jato, em roteiro para negociar sua delação premiada, que o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, e o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega eram os responsáveis por cobrar doações para a campanha de Dilma Rousseff em 2014.
Segundo o empreiteiro, ex-presidente e herdeiro do grupo que leva seu sobrenome –e que está preso desde junho de 2015 no Paraná–, Coutinho e Mantega dividiam a tarefa de obter o compromisso de doações entre empresários que tinham financiamento do BNDES para projetos no exterior.
[…]
As obras financiadas pelo banco de fomento no exterior e executadas pela Odebrecht tiveram um salto a partir de 2007. De 1998 a 2006, a média anual de financiamento de obras da empresa fora do Brasil era de US$ 166 milhões. De 2007 a 2014, passou para US$ 1 bilhão.
Quando um banco decide o destino de dezenas de bilhões subsidiados, a uma taxa bem abaixo da de mercado que a torcida toda do Flamengo e do Corinthians quer, alguém acha que isso não vai se reverter em moeda de troca política? Alguém pode ser ingênuo o suficiente para acreditar que um “partido” como o PT não vai usar isso para impor, do outro lado, benesses ao seu projeto de poder por parte das empresas agraciadas?
Tivemos o mensalão, depois o petrolão, mas ainda falta esmiuçar os fundos de pensão, as demais empresas estatais e, claro, o BNDES. Sua caixa-preta precisa ser aberta. É uma montanha de dinheiro sem o devido escrutínio, cujo destino seguiu claramente critérios políticos, não econômicos.
Luciano Coutinho precisa ter suas finanças pessoais devassadas, Guido Mantega precisa ser investigado, a cúpula do BNDES precisa prestar esclarecimentos ao país. A possibilidade de desvios por meio do banco pode fazer o petrolão parecer roubo de galinha. E depois de toda essa investigação, de mais transparência, o ideal é simplesmente fechar o banco, para impedir novas tentações desse tipo.
Rodrigo Constantino
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