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Vantagens para militares, servidores ativos da Receita, políticos: por que é tão difícil reduzir privilégios?

Duas notícias hoje mostram como é difícil reduzir os privilégios do setor público:

Uma mudança feita na última hora pelo relator da reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Tasso Jereissati (PSDB-SP), dá aos servidores públicos da ativa uma vantagem ao calcular o benefício de aposentadoria.

A emenda acatada permite que eles se aposentem levando em conta a média aritmética simples de vantagens pecuniárias variáveis – gratificações por desempenho e/ou produtividade – dos dez anos anteriores à concessão do benefício. O texto vindo da Câmara estabelecia que o valor seria proporcional ao número de anos em que o funcionário tenha recebido a vantagem.

A sugestão foi acatada por Tasso em uma terceira versão do seu relatório, apresentada inicialmente apenas oralmente, menos de uma hora antes de a CCJ começar o processo de votação do parecer, que acabou aprovado por 18 votos a sete, em uma rápida votação. O pedido de alteração no texto foi proposto pelo senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), líder do partido no Senado, e visou atender, principalmente, uma demanda dos auditores fiscais da Receita Federal.

A reportagem apurou que a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco) pressionava, desde a Câmara dos Deputados, para evitar que fosse aplicada uma fórmula para que somente uma parte da vantagem pecuniária variável entrasse para cálculo do benefício de aposentadoria. O objetivo era garantir a computação integral do valor.

Em contraste com o aperto geral em serviços públicos, custeio e investimentos, o projeto de Orçamento federal de 2020destina R$ 4,7 bilhões à criação de vantagens para a carreira militar.

O montante —suficiente para recompor, com sobras, as verbas para obras em estradas e bolsas da Capes, entre outras combinações possíveis— decorre de benefícios instituídos pela reforma previdenciária das Forças Armadas.

Como contrapartida às exigências de maiores contribuição e tempo de serviço para as pensões, o governo Jair Bolsonaro (PSL) incluiu no texto, que tramita na Câmara dos Deputados, a alta imediata da remuneração da caserna.

Para tanto, propõem-se, por exemplo, o aumento do adicional de habilitação —recebido por militares que passam por cursos de qualificação— e a criação do chamado adicional de disponibilidade.

Não devemos generalizar: há muita gente boa no setor público, gente comprometida com o país, com espírito público. Mas – e eis a primeira premissa importante – devemos sempre lembrar que são seres humanos, portanto imperfeitos, sujeitos aos mesmos interesses e paixões que todos nós. Logo, costumam colocar os seus objetivos à frente daqueles da nação. É apenas humano.

Em segundo lugar, eles desfrutam de lobbies organizados, corporações que podem influenciar a política, pressionar com votos. Possuem grupos de interesse que colocam a espada no pescoço dos políticos. Os benefícios são concentrados e os custos, dispersos. Sempre foi assim em política. Qual a corporação que luta por seus interesses, caro leitor? Pois é.

Por fim, os políticos que decidem essas mudanças são também parte da patota, do grupo de privilegiados. Ou seja, quem julga é também réu, quem tem que decidir cortar na carne é quem perderia privilégios, e há evidente conflito de interesse aqui. A classe política não tem motivação para avançar tanto nas reformas, pois isso retira benefícios dela própria.

Com essas constatações realistas em mente, fica mais fácil entender porque entra governo, sai governo, e pouca coisa muda na essência. É verdade que alguns demonstram mais zelo pela coisa pública. É verdade que as condições às vezes se impõem, e até notórios corruptos precisam aprovar reformas por questão de sobrevivência. Mas, em geral, o mecanismo de incentivos não ajuda.

Quando precisamos contar apenas com o altruísmo, dificilmente a coisa anda. Daí a importância de sempre desconfiar dos poderosos, de jamais selecionar um político como “mito” ou “messias”, e de pressionar nossos “representantes” constantemente. Nada mais patético do que idolatria a algum político. Afinal, cochilou o cachimbo cai. O preço da liberdade é a eterna vigilância. Todo político deve ser cobrado, como nosso servidor que é.

Esse foi meu destaque no programa 3em1 desta terça, inclusive, comentando a abjeta tentativa de se aprovar a toque de caixa as mudanças nos fundos eleitorais:

Rodrigo Constantino

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