Fiz hoje uma coisa que, confesso, não fazia há meses: li a revista Veja. A capa estava circulando pelas redes sociais, com a “ameaça” Bolsonaro estampada nela, então fui dar uma olhada para verificar se o conteúdo era muito esquerdista mesmo, ou só um pouco.
Acabei lendo outras reportagens, e preciso admitir: a revista “esquerdou” de vez. Não que fosse realmente de direita no passado, mesmo quando eu era seu colunista. Nunca foi. Mas não era tão enviesada para o lado “progressista” assim. Parabéns, Petry! Você conseguiu!
Comecemos pela reportagem de capa, sobre a “ameaça” Bolsonaro. Há coisas interessantes e algumas preocupações legítimas? Sim, sem dúvida, como na “ignorância econômica” assumida, na falta de uma base partidária para governar, em certas soluções simplistas para problemas complexos.
Daí a concluir que houve um mínimo de honestidade intelectual e tentativa de imparcialidade são outros quinhentos. O retrato que emerge de Bolsonaro é totalmente filtrado por lentes ideológicos, e não há um esforço de se compreender o fenômeno em si, o que exigiria uma dolorosa autocrítica da esquerda “progressista” que a revista representa.
O sociólogo de esquerda Demétrio Magnoli é citado, e usa o termo “asqueroso” para se referir a Bolsonaro. Logo depois, a própria revista usa um artifício manjado, de atribuir a terceiros adjetivos que quer destacar sobre o alvo, apenas para concluir de forma incoerente que ele, Bolsonaro, faz ataques demais, possui uma “artilharia verbal insultuosa”:
Entre as tais “posições extremadas” estão a defesa da NRA e do porte de arma pelo cidadão de bem, e a ideia de que os criminosos merecem punições mais severas. Nossa, que extremista! Onde já se viu não tratar bandido como “vítima da sociedade” e não fazer campanha pelo desarmamento (do cidadão ordeiro, já que o marginal não vai entregar sua arma)?
Bolsonaro está longe de ser o candidato ideal de liberais, ou até mesmo de conservadores. Mas cada vez que a grande imprensa o detona de forma tão escancarada e enviesada, pintando-o como um “fascista terrível” enquanto defende a visão “progressista” de mundo, parida na bolha da elite, o candidato ganha mais alguns milhares de votos.
A prova está na reportagem da revista sobre a mostra do MAM, que teve direito a uma criança tocando num homem nu. Após defender a “arte” contra a “censura” dos “obscurantistas”, a revista atacou o MBL e concluiu que quem realmente fez mal à criança foi quem divulgou o vídeo denunciando o troço, não quem expôs a criança ao peladão:
Ou seja, culpado é quem denuncia o abuso infantil, não quem o pratica! A reportagem espeta o MBL como se a garotada liberal fosse ficar chocada com a mulher de John Lennon pelada, e não como se o problema fosse justamente levar uma criança para tocar no peladão estranho.
Em momento algum o MBL ou quem ficou revoltado com a coisa atacou a “arte” em si, e sim o fato de uma criança ser submetida a isso, na evidente campanha pela pedofilia que parte da esquerda tem promovido. Mas quem não tem escrúpulos, quem abusou da criança, segundo a Veja, são os que denunciaram as imagens chocantes, não aqueles que estão nelas.
Por fim, há uma longa matéria sobre a “revolução” russa. Sim, tem críticas. Mas também tem elogios! Ao mais nefasto episódio da história da humanidade, responsável pela morte de milhões de pessoas. É como se tentassem fazer um esforço para ver o “lado bom” do nazismo, ou relativizar suas desgraças de acordo com o contexto da época.
Até mesmo o socialista Daniel Aarão Reis, professor da UFF, foi convidado para escrever um dos ensaios, e concluiu que a “bela ideia” foi “desvirtuada” para um autoritarismo condenável. Ou seja, “deturparam Marx e o socialismo”, a desculpa mais esfarrapada do mundo para proteger a utopia nefasta. E isso na Veja!
Entenderam? Os problemas com a “revolução” russa não estão ligados ao socialismo em si, mas ao “desvio” autoritário. Daniel Aarão Reis conclui, após chamar a revolução cubana de “conservadora e familiar”: “Esse é o desafio que se coloca para uma eventual reinvenção do socialismo no século XXI – voltar a associar socialismo a democracia. Só assim ele terá condições de prosperar como alternativa”.
Ou seja, a reportagem da Veja pretende salvar o socialismo, não enterrá-lo de vez! Por isso Trump é tão odiado: como ele ousa dizer na ONU que o socialismo não foi mal aplicado na Venezuela, e sim perfeitamente aplicado?! Como pode dizer… a verdade?!
A Veja desta semana detona o “fascista asqueroso” Bolsonaro, ridiculariza a revolta popular e do MBL com quem chama pedofilia de “arte”, e enaltece a ideia igualitária do socialismo que levou à “revolução” russa, que teria apenas se “desviado” para o autoritarismo. Assim complica. Eu estava lendo a Veja ou a Carta Capital?
Rodrigo Constantino
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