Escrevi hoje mesmo um texto sobre o confronto entre o “antigo regime” e o “novo Brasil”, aquele que não mais enxerga a corrupção como parte necessária na política, ou que acha que os poderosos devem mesmo pairar acima das leis. Tomei como base a coluna do historiador Marco Antonio Villa, para defender essa nova República, ameaçada por aqueles que desejam barrar a Operação Lava-Jato.
Outra coluna, também no GLOBO, merece menção aqui: a do cientista político Nelson Paes Leme. Após fazer um breve resumo da história de nossas várias Constituições, algo que já foi tema de livro do próprio Villa e por mim resenhado, Paes Leme chega à conclusão de que estamos vivendo um momento de nova ruptura, em que uma nova – a oitava – Carta Magna estaria em gestação. Diz ele:
Embora a visão proporcionada pela lupa da crônica seja sempre um olhar míope e borrado se comparada à lente telescópica da História, já se percebe estarmos na antessala de uma dessas decisivas viradas constitucionais, com o impedimento, em 2016, da débil presidente, apoiada por uma frágil aliança, corrupta e decadente, e um projeto de poder ultrapassado, incompatíveis com os anseios de uma sociedade exigente e altamente mobilizada para a renovação na política e na economia. Por outro lado, a tibieza inusitada de uma representação popular altamente comprometida, aponta para a ruptura entre Estado e sociedade. É o fim do trabalhismo e seu sucedâneo, o lulopetismo de cooptação e favores antirrepublicanos, gestado ainda no útero do Estado autoritário de 1964 a 1984 como estratégia golberiana e maquiavélica de quebrar a unidade das esquerdas brasileiras.
A incisiva ação do Poder Judiciário, da Polícia Federal e de um Ministério Público independente, fruto da Constituição de 1988, preenchendo o vácuo de lideranças políticas confiáveis ou de golpes armados, é a novidade histórica a mobilizar o povo. O que estamos vivenciando é o claro fim de um ciclo: a agonia da Nova República, com seu descontrole partidário e administrativo, a infestação generalizada do fisiologismo legislativo de barganha escancarada e a corrupção disseminada por todo o aparelho do Estado, sem exceção.
Não resta mais a menor dúvida de que o poder constituinte originário, como nos demais exemplos históricos aludidos, surgirá fatalmente desse quadro insustentável, diante da inusitada contaminação antiética da política, do Congresso e, portanto, do poder constituinte derivado. E da inércia quase catatônica do presidente da República em convocar logo a nação, com bravura histórica. Como também não existem lideranças expressivas no Parlamento, essa nova ordem brotará certamente das ruas e das redes sociais, onde se encontram os talentos desta feita. Novas lideranças surgirão rapidamente dessas mobilizações sucessivas, com um novo ordenamento constitucional. Será historicamente inevitável. Poucos conheciam, em meados do século XX, as lideranças civis que fariam a sua história.
Estamos, nos umbrais da nossa oitava Constituição.
Não considero nada “historicamente inevitável”, pois o futuro é incerto. Mas tendo a concordar com a análise: há um clima de mudança que dificilmente será abalado ou abafado pelos defensores do “antigo regime”. E tudo leva a crer que ele desembocará numa nova Constituição, ou numa leitura diferente daquela vigente. Ou seja: não há mais espaço, nesse novo país em construção, para as velhas práticas políticas, para o sindicalismo pelego, para tantos parasitas.
Acredito que a construção de uma sociedade decente se faz com dois grandes pilares: as instituições sólidas e a cultura disseminada. Uma não sobrevive sem a outra. O poder das boas instituições é crucial, mas mudar a mentalidade do povo também. Elas andam juntas, numa simbiose, uma podendo ajudar ou prejudicar a outra. De nada adiantaria ter uma Constituição como a americana com uma mentalidade parasitária e esquerdista, assim como não bastaria ter o povo americano com nossas leis absurdas: elas acabariam por mudá-lo também, para pior. Eis como concluí a resenha do livro do Villa sobre o arbítrio de nossas Constituições:
Em resumo, o Brasil é mesmo um país complicado, com pouco apreço pelo império das leis. Mais parece uma República das Bananas, cuja Carta Magna trata de infindáveis aspectos insignificantes para uma Constituição, além de preservar incrível dose de arbítrio ao poder Executivo. Nossas Constituições, em outras palavras, acabam refletindo a cultura do povo, esta crença ingênua no estado forte e messiânico, que tudo pode e nada teme.
A cultura importa. As instituições importam. E ambas devem ser moldadas juntas, num trabalho contínuo que nunca cessa. Os nossos valores parecem estar em mutação. Não há mais tanta negligência para com os vagabundos que sempre mamaram em tetas estatais com seus discursos vitimistas, ou para políticos que roubam à luz do dia e fica tudo por isso mesmo. E essas mudanças na mentalidade deverão levar a uma nova Constituição, menos “cidadã” e mais liberal, ou seja, com menos “direitos” e mais deveres, cobrando responsabilidade dos indivíduos.
Em 1988 havia uma demanda social reprimida muito grande, e faltava um ano para a queda do Muro de Berlim, e quatro para o declínio final do império soviético. Eram outros tempos, havia o clima de revanchismo do regime militar, as esquerdas gozavam da estima popular e dominavam a cultura nacional. Isso está mudando. O socialismo é um visível fracasso, e o caso venezuelano ilustra bem isso. O peleguismo sindical chegou ao poder com o PT e foi um fiasco. O nacional-desenvolvimentismo destruiu nossa economia, e o “capitalismo de compadres” produziu apenas mais corrupção.
Vivemos na era das redes sociais, com mais informações disponíveis, com a grande imprensa perdendo credibilidade, e novos agentes surgindo em cena. A luta não será fácil. Os favorecidos pelo “antigo regime” não vão entregar o osso docilmente. Haverá reação, confronto, chiadeira e eventualmente atos violentos. Mas o caminho parece dado: uma nova Constituição com tom mais liberal vem aí, para atender aos anseios da população, cansada de ser explorada, de tanto abuso de poder, de tanto confisco em nome da “justiça social”.
Mas como não há determinismo histórico, isso só vai virar realidade se todos nós, interessados nesse novo Brasil, arregaçarmos as mangas e partirmos para o trabalho. O Brasil decente que trabalha tem pressa!
Rodrigo Constantino
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