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Viés conservador em certas pastas não é o problema do governo
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Merval Pereira, em sua coluna de hoje, elogia os dois principais pilares do governo Bolsonaro, a área econômica sob Paulo Guedes e a área de segurança sob Sergio Moro. Mas critica a “ala ideológica”, que seriam as pastas com Ricardo Salles (Meio Ambiente), Damares Alves (Família e Direitos Humanos), Ricardo Vélez (Educação) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores).

Para o jornalista do GLOBO, enquanto Guedes e Moro representam aquilo que o país precisa (certo), os demais seriam reedições do petismo com sinal trocado (discordo). Merval tem até um ponto: há, sim, dentro do governo, uma turma mais xiita, jacobina, que se vê como um bando de cruzados resgatando a civilização. Mas não é justo misturar o joio com o trigo e detonar toda a base conservadora.

Bolsonaro venceu por vários motivos: antipetismo, segurança, economia, costumes. Não é possível saber quanto é quanto, e há legitimidade em uma agenda de reversão do estrago causado pelo “progressismo” em áreas como meio ambiente, educação e geopolítica. Não quer dizer que tenhamos que concordar com a postura de Damares ou Araújo, por exemplo, mas sim que não há nada de absurdo em pregar mudanças ideológicas nesses setores.

Ao recomendar que o presidente saia de sua “bolha radical”, Merval não dá conselho necessariamente ruim. Eu também acho que ele deve evitar a influência de certas figuras ali. Minha discordância é de outra natureza: considero injusto tomar toda a pauta de costumes como algo delegado para os fanáticos. Merval, assim como Carlos Alberto Sardenberg e tantos outros, gostaria de ver o foco estritamente na economia e na segurança. Mas a luta no âmbito cultural é importante sim.

Meu ponto tem sido outro: os conservadores precisam entender que, para sua agenda vingar, o sucesso das duas outras pastas é condição necessária. Ou seja, se as reformas de Guedes naufragarem, se Moro não for capaz de melhorar a sensação de segurança no país, então a turma da educação, do Itamaraty e do Meio Ambiente não terá chance sequer de mostrar muito serviço.

Eis, portanto, como vejo a situação: os conservadores têm total direito – e o dever moral, eu acrescentaria – de desejar um governo combativo nas questões de costumes. Os “progressistas” mais sensatos, que são os social-democratas, aplaudem parcialmente Guedes e Moro, mas rejeitam totalmente os demais, pelos motivos errados. Criticar Chico Mendes e Paulo Freire, rechaçar a ideologia de gênero e o aborto, e se alinhar mais aos Estados Unidos e Israel não são erros, como indica Merval, e sim acertos.

O problema não está nessa agenda conservadora em si, e sim na postura de certos radicais que se dizem conservadores dentro do governo, mas não passam de reacionários autoritários e adeptos de teorias conspiratórias, que adotam mentalidade tribal e enxergam inimigos por todos os lados. Se o alvo de Merval eram esses, tudo bem; mas os exemplos que ele dá são mais abrangentes e englobam todos os conservadores, e isso é um equívoco.

Para fechar, dou apenas um exemplo, com base nessa notícia:

O governo Jair Bolsonaro (PSL) vai criar uma comissão especial para fazer uma análise ideológica do banco de questões do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). O principal alvo será a retirada de itens que abordem ideologia de gênero. Uma portaria do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), responsável pelo exame, será publicada nos próximos dias para criar a comissão.

O presidente do Inep, Marcus Vinicius Rodrigues, disse que a comissão vai buscar neutralidade das questões da prova. Esse trabalho estaria na esteira de uma revisão de todos os processos dentro do instituto.  

Segundo Rodrigues, a abordagem do tema de gênero não é pertinente para uma prova. “Quando a gente fala em gênero, acho que não cabe a escola tratar disso. Cabe à família tratar disso. Eu não teria como sugerir uma questão que são de assuntos familiares. Eu posso fazer uma medição, uma boa redação, para atestar se o aluno tem ou não condições de seguir na vida profissional sem buscar um tema que venha a agredir ou não estar de acordo com alguns valores”, disse.

Ora, essa parece uma medida sensata do ponto de vista conservador, desejável para retirar do Enem o fator ideológico esquerdista. Merval e Sardenberg provavelmente condenariam e colocariam isso na conta dos xiitas. Não concordo. É uma depuração natural e Bolsonaro foi eleito, em parte, para isso mesmo. A maioria da população não aguenta mais tanto marxismo cultural.

Os “liberais” querem ver o governo restrito ao cercadinho da economia, mas o governo Bolsonaro não é um governo liberal, não é o Partido Novo; é uma aliança entre liberalismo e conservadorismo, e assim foi vendido. O problema do governo não é, portanto, a agenda conservadora em costumes, bastante alinhada com a vontade da população; é a postura de alguns ali dentro, que chegam até a distorcer e contaminar essa agenda.

Como um liberal com viés conservador, quero ver o governo comprando essas brigas morais sim, tentando combater o ecoterrorismo, o hedonismo nas escolas, o feminismo radical, o aborto. Não é petismo com sinal trocado, mas sim expurgar o petismo dessas áreas, voltar a respeitar a família e as tradições. Os excessos de alguns não justifica tolher o bom senso da maioria, que quer mudanças nesses setores também. Por mais que a economia seja a prioridade. Ela não é, porém, a única coisa que importa.

Rodrigo Constantino

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