Deu no GLOBO:
Desde 1928, um presidente argentino não peronista não consegue terminar seu mandato. Até pouco tempo atrás, o atual chefe de Estado do país, Mauricio Macri, que fundou e lidera o partido Mudemos (uma aliança com a União Cívica Radical), governava com esse fantasma pairando sobre a Casa Rosada. Mas as eleições legislativas de domingo passado derrubaram definitivamente a especulações sobre uma eventual crise de ingovernabilidade, consolidaram o partido de governo como a principal força política do país, provocaram a maior crise já enfrentada pelo peronismo desde seu surgimento, em meados da década de 1940 e, de quebra, instalaram a sensação de que Macri tem grandes chances de buscar um segundo mandato nas presidenciais de 2019. Na segunda-feira, após comemorar a vitória da legenda em 12 das 24 províncias argentinas — muitas governadas pelo peronismo — e na capital, o presidente anunciou que o respaldo obtido nas urnas será usado para avançar na aprovação de profundas reformas.
— A Argentina não deve ter medo das reformas. As reformas nos darão alegria, isso é o que as pessoas votaram ontem — declarou.
O peronismo é o grande câncer argentino. Um país que já foi mais rico do que a Áustria ou o Japão, no começo do século XX, virou esse antro populista, que o casal Kirchner afundou de vez, inspirado nas políticas esquerdistas do Foro de São Paulo.
Macri representa uma voz mais moderada com algum viés liberal, em busca de reformas que retirem privilégios dessa casta protegida pelo peronismo. Muitos acharam que se tratava de uma missão quase impossível. Mas ele vem mostrando que é viável reformar até mesmo um país dominado por grupos de interesses poderosos, que usam a demagogia como arma para manter suas mamatas.
Brian Winter, editor-chefe da revista “Americas Quartely”, publicou uma análise na Folha que justifica o otimismo com o resultado das urnas, alegando que a Argentina de Macri pode ser um exemplo para a região dominada por populistas. Diz ele:
Animai-vos, fãs de sanidade fiscal, do consenso democrático e da Lava Jato. As eleições da Argentina provam que existe demanda por esses três conceitos supostamente antiquados em 2017.
A vitória esmagadora da coalizão Mudemos , do presidente Mauricio Macri, tem grande significado para a Argentina, o restante da América Latina e talvez o mundo.
Demonstra que um líder pragmático pode dizer verdades difíceis, começar a corrigir uma década de erros populistas, suportar uma recessão cruel… e ainda assim emergir vitorioso das urnas.
[…]
Pode ser a transformação política mais importante em uma geração. Em diversos países, inclusive Brasil e México, a tentação do nacionalismo populista, seja de esquerda ou de direita, cresce.
Macri mostra outro caminho possível. Ele falou de consenso e diálogo com a oposição para aprovar reformas, e de mudar a marcha da economia. A impressão era que nada disso continuava viável. Ao menos por um dia, tais ideias voltaram à moda.
Veremos em 2018 se essas ideias reformistas, com viés mais liberal, realmente têm vez no Brasil, país também dominado pelo seu análogo ao peronismo, um establishment poderoso e corrupto que se acostumou a viver pendurado nas tetas estatais, à custa do povo trabalhador, e blindado de críticas por um monopólio das virtudes imposto pela esquerda.
Rodrigo Constantino