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Volta a falar de comédia do cotidiano, Verissimo!

Certa vez, o austríaco Hayek, Prêmio Nobel de Economia, disse que se fosse completamente pobre, sem propriedade alguma, aí mesmo é que seria um defensor incondicional do livre mercado. Ele compreendia que o processo competitivo de uma economia livre beneficiava, acima de tudo, os mais pobres.

Afinal, é a criação de riqueza proveniente do empreendedorismo em ambiente de competição que permite a melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores.

Já os mais ricos podem se dar ao luxo, muitas vezes, de ter menos produção de riqueza, mais regalias estatais, uma economia mais engessada como as dos países sob o welfare state. Afinal, já são ricos e suportam essa perda de dinamismo econômico e menor criação de riqueza e empregos com mais facilidade.

Tudo isso depõe contra a típica mentalidade marxista de luta de classes, de economia como um jogo de soma zero, em que João para ficar rico precisa tirar de Pedro. Sob tal ótica, a única coisa que merece foco é a desigualdade material, pois se ignora a possibilidade de todos melhorarem de vida, como costuma acontecer no capitalismo liberal.

Disse tudo isso para chegar à coluna de Verissimo de hoje, uma ode ao igualitarismo socialista e um ataque ao livre mercado, como de praxe. Verissimo, afinal, não faz parte do grupo dos pobres, os que mais têm a ganhar com o capitalismo. Já é bastante rico, posa de intelectual, e pode se dar ao luxo de pregar receitas que prejudicariam a classe trabalhadora. Tudo isso, paradoxalmente e de forma um tanto perversa, em nome da mesma classe trabalhadora.

Verissimo cria uma falsa dicotomia entre capital financeiro e capital produtivo, fazendo uma analogia ao velho oeste, como se houvesse uma briga de caubóis em jogo. E pinta o economista francês Thomas Piketty como um “mocinho” que surgiu para defender os que querem produzir contra as garras dos financistas malvados:

A briga se repete através da História econômica dos Estados Unidos, hoje com o capital financeiro no papel de pecuaristas maus e o capital produtivo no papel dos lavradores bons, indefesos diante da truculência do adversário. A não ser quando — como acontecia muito nos filmes — algum mocinho providencial decide defendê-los.

[…]

Culpa da ganância descontrolada do setor financeiro. E da globalização: hoje, das empresas americanas listadas como as maiores na revista “Fortune”, mais da metade tem mais lucros fora do país do que no país. Assim, a imensa classe média americana — que era o mercado natural para a produção americana, como bem entendeu o Henry Ford quando, além de fazer carros baratos, pagava a seus empregados o suficiente para comprá-los — tornou-se irrelevante. 

[…]

A novidade do badaladíssimo livro do francês Thomas Piketty sobre a desigualdade no mundo não é a revelação de que aumenta a distância entre ricos e pobres. Isso — uma vez preenchidas certas condições, como a de não ser nem cego nem burro —, todo mundo sabe. Piketty está sendo tão saudado e combatido porque no seu livro “O capital no século XXI” ele diz que, a seguir como vai a economia mundial, com uma casta financeira mandando e desmandando para o seu proveito exclusivo, a distância aumentará cada vez mais. Ao contrário do mantra liberal de que só o mercado livre traz a felicidade. Traz, mas para uns poucos.

O “gênio” conseguiu, de uma só vez, atacar o capitalismo, o setor financeiro, a globalização, tudo aquilo que tem atuado para retirar milhões da miséria no mundo todo. E ainda faz isso se colocando como o defensor dos mais pobres!

Verissimo não sabe que é o setor financeiro que canaliza recursos para o setor produtivo? Não sabe que a globalização permite trocas mutuamente benéficas que geram mais riqueza e empregos no mundo todo, com cada um focando em suas vantagens comparativas? Garanto que ele compra produtos importados aos montes, e as máquinas do hospital particular de elite em que ele se tratou vieram de fora também. Detalhes…

Piketty virou guru dos sensacionalistas justamente por resgatar uma mensagem marxista embalada em nova roupagem, mais sutil e, portanto, perigosa. Há inúmeros equívocos em sua análise que já foram apontados em diversos lugares por gente séria. Mas Verissimo não quer saber de nada disso. Precisa apenas da retórica, da imagem de que é um “mocinho” na batalha justa contra os exploradores capitalistas.

Rende alguns aplausos dos incautos, sem dúvida. Mas é deplorável para aqueles que compreendem o truque e ficam chocados com a falta de sensibilidade verdadeira para com os mais pobres, que precisam de mais capitalismo, mais livre mercado e mais globalização, não menos.

Por que Verissimo não se atém às suas vantagens comparativas e foca nas crônicas do cotidiano? Evitaria certo constrangimento e faria um bem enorme à humanidade, especialmente para aqueles mais pobres, que ele tanto diz querer ajudar…

Rodrigo Constantino

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