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Rodrigo Constantino

Rodrigo Constantino

Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda “politicamente correta”.

Coringa – Parte 2: uma vítima da sociedade?

Escrevi uma resenha do filme "Coringa", com foco no aspecto mais político do niilismo e seu efeito revolucionário em ambiente ressentido. Dois pontos importantes, porém, ficaram de fora da análise, e aproveito para analisa-los agora.

O primeiro diz respeito a uma crítica que muitos fizeram ao filme, como se ele tentasse explicar a violência do vilão, com base numa cadeia de eventos que praticamente o transforma em vítima.

O abuso na infância, o espancamento por garotos, as sacanagens no trabalho, o mundo rude, enfim, estaria por trás de sua transformação. Nesse sentido, o Coringa de Heath Ledger seria bem mais caótico, sem explicação, oferecendo uma versão diferente - e inventada - para cada pessoa, como quem diz que não é preciso ter uma causa para ser psicopata.

É uma leitura possível do filme com Joaquin Phoenix, apesar de eu considera-la equivocada. Não acho que o filme teve esse viés "progressista" de justificar a maldade do personagem por meio da miséria e violência à sua volta. Acho, pelo contrário, que o Coringa usou esses acontecimentos como pretexto, ou seja, ele já desejava permitir que o mal florescesse, queria dar vazão ao seu instinto agressivo, e precisava apenas de algum motivo, de uma justificativa. Ele deixa isso claro quando confessa que gostou de ter matado os jovens no metrô.

Coringa não é uma "vítima da sociedade", e sim alguém que explora uma sociedade doente para explodir em maldade, deixando seu niilismo tomar conta de si. Ele é alguém para além de qualquer possibilidade de redenção.

O outro aspecto diz respeito ao tema da doença mental. Alguns acharam que esse enfoque demonstra o desprezo de conservadores pela condição do personagem. É o contrário! É justamente por não desprezar os que sofrem de doenças psiquiátricas que os conservadores não aceitam trata-los como pessoas normais. O médico britânico Theodore Dalrymple vem à mente aqui. Ele jamais aceitou tratar seus pacientes com "comiseração", como autômatos desprovidos de volição, ou como normais.

Desprezo é tratar maluco como normal. Isso é falsa compaixão, que atende apenas aos anseios do "altruísta", não do doente mental. Conheço doença mental de perto e sei do que estou falando: eles precisam de ajuda profissional, psiquiátrica, não de comiseração ou de serem tratados como gente normal, num mundo que tenta jogar para debaixo do tapete tudo que é anormal.

Quem repete que a normalidade não existe pode achar que está sendo bonzinho e compreensivo com todos, deixando todo preconceito de lado, mas no fundo está justamente colocando em perigo quem tem doença mental. Talvez - talvez! - Arthur Fleck tivesse alguma chance se fosse muito bem tratado desde cedo, com remédios e, de preferência, encontrando algum propósito mais elevado para sua vida medíocre e patética.

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