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Rodrigo Constantino

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Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda “politicamente correta”.

Governo das derrotas?

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Por Matheus Miranda, publicado pelo Instituto Liberal

Na última semana, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu o decreto que nomeava o novo Diretor-Geral da Polícia Federal, Alexandre Ramagem, acatando uma ação de Mandado de Segurança pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), tendo visto indícios de desvio de finalidade na indicação.

Num país em que há histórico de o presidente indicar pessoas próximas para altos cargos da República, a indicação passaria batido. O ex-presidente Fernando Collor indicou para a Suprema Corte brasileira seu primo, Marco Aurélio de Mello; FHC indicou seu ministro da Advocacia-Geral da União, Gilmar Mendes; já Luis Inácio Lula da Silva colocou o advogado do PT, José Dias Toffoli.

Nada mais justo que Jair Messias Bolsonaro nomear um amigo de seus filhos para chefiar a Polícia Federal. Se outros podiam, por que ele também não pode?

O diabo mora nos detalhes! O governo Bolsonaro tem uma peculiaridade que o diferencia dos últimos que se sentaram na cadeira do Palácio do Planalto. O presidente é um inexperiente na política, apesar de ter passado 26 anos como deputado federal na Câmara dos Deputados. Ele era do baixo clero e nunca participou de articulações com outros parlamentares. Entretanto, isso não é a raiz do problema; Jânio Quadros e Collor quando foram eleitos para presidente já haviam chefiado governos estaduais – o primeiro tinha sido governador de São Paulo e o segundo de Alagoas; mesmo assim, foram fracos e acabaram caindo.

Não quero aqui discutir o futuro do governo Bolsonaro, se vai perdurar até o fim do mandato ou naufragará antes disso. Como dizia o político mineiro, Magalhães Pinto, o cenário político muda que nem as nuvens.

O ponto central da discussão que busco trazer são as derrotas que o governo Bolsonaro sofre desde o início, seja por derrubada de vetos, MP’s caducadas ou decisões judiciais impedindo ou suspendendo medidas. Para se ter uma ideia, o Congresso Nacional derrubou 30 % dos vetos em seu primeiro ano de mandado presidencial, recorde histórico comparado com os demais governos. No governo FHC, foram 1,6 % e Temer bem mais alto, com 6,5. Quanto aos governos petistas, Lula teve apenas duas vezes derrubados seus vetos e Dilma teve sete vezes.

No ano de 2019, o presidente da República publicou 48 medidas provisórias com temáticas desde a organização dos Ministérios até MP da Liberdade Econômica e fim da obrigatoriedade da Carteirinha de Estudante monopolizada pela UNE. Em uma rápida pesquisa que realizei das MPs editadas no ano passado, 17 foram aprovadas totalmente ou parcialmente, 18 ficaram sem eficácia por não ter conseguido chegar ao Plenário, uma foi rejeitada e o restante ainda está sendo discutido em comissões.

Ao todo o governo em 17 meses de mandato já publicou 112 MPs, recorde histórico comparado com os antecessores: José Sarney com 24 meses foram 125; Collor governou 31 meses e foram 89; Itamar Franco, 27 meses e 142; Michel Temer em 18 meses editou 83 MPs. Dessa forma, proporcionalmente este é o governo que mais publicou Medidas Provisórias.

Dito isso, são muitas as causas que atrapalham o bom funcionamento do governo; porém, destaco aqui aquela que pode ser a origem de todo esse completo caos em que o atual governo mergulhou o Brasil: falta de articulação política.

Desde a redemocratização, todos os governos eleitos diretamente nas eleições legislativas ganharam uma certa sustentação mínima para uma governabilidade. Na campanha, o então candidato acaba alavancando certas candidaturas, principalmente se ele estiver pontuando bem nas pesquisas, o que faz com que o governo consiga ter influência na eleição da mesa da Casa Legislativa, Câmara e Senado.

Funciona assim: o partido do presidente eleito forma um bloco governista e convida outros partidos para votar favoravelmente a projetos de interesse do governo. Chamamos isso de “base aliada”.  A construção dessa bancada é composta por apoiadores do presidentes, base “orgânica”, aqueles que votam por afinidade no que for proposto, mas também há partidos que dão apoio em troca de acesso ao governo ou cargos.

Não importa se o governo seja de direita ou esquerda, o modelo escolhido na Assembleia Constituinte de 1988 para  a criação de partidos obriga a que haja pluralismo de partidos. Nenhum partido consegue sozinho ter hegemonia no Congresso Nacional. Por isso, os governos que deram certo e obtiveram governabilidade tiveram antes mesmo da eleição que adquirir gordura entre os parlamentares para facilitar a tramitação.

O governo de Bolsonaro, quando se iniciou, tinha a segunda maior bancada entre os partidos com assento na Câmara dos Deputados – o Partido Social Liberal elegeu 52 deputados. Diferentemente do passado, a Câmara dos Deputados hoje é bastante fragmentada. Há 30 partidos com cadeira e partidos mais fisiológicos ficaram menores. Com certa facilidade e agilidade, o PSL teria como indicar um presidente da Câmara da base e conseguir muito apoio dentro das comissões. No Senado Federal, a base de Bolsonaro tinha muitos apoiadores e muitos foram eleitos com pautas muito próximas ao que foi defendido durante a campanha.

Como a história já foi escrita, neste momento queria refrescar a memória do leitor: o PSL apoiou a reeleição de Rodrigo Maia, do Democratas, e este último partido ficou com três ministérios da Esplanada – Onyx Lorenzoni na Casa Civil, Tereza Cristina na Agricultura e Luiz Henrique Mandetta na Saúde. Em troca, o partido do governo conseguiria emplacar o comando na Comissão de Cidadania e Justiça e de Finanças, principais comissões da Câmara dos Deputados. No Senado, graças à articulação do ministro da Casa Civil e do filho e senador Flavio Bolsonaro, foi eleito o desconhecido Davi Alcolumbre.

Entretanto, o que se viu foi tudo ao contrário. Com indecisões e falta de articulação política da bancada governista, as propostas do governo foram aprovadas com dificuldade. A Reforma da Previdência, considerada pelo poderoso ministro da Economia Paulo Guedes como a mais importante, foi sabotada pelo próprio presidente e desidratada por pressão de grupos corporativistas. Se a previsão inicial era de R$ 1,2 trilhão, terminou com pouco mais de R$ 800 bilhões, abaixo do que era esperado. Na outra ponta, o Pacote Anticrime, proposto pelo então ministro da Justiça Sérgio Moro, não foi defendido como deveria, perdeu muitos pontos importantes e terminou com uma grande jabuticaba, o chamado Juiz das Garantias.

A base aliada de Jair Messias Bolsonaro se transformou em um grande episódio daquele programa do SBT, “Casos de Família”. Tornou-se comum haver “barracos” entre deputados do próprio partido. No segundo semestre do ano passado, Bolsonaro resolveu implodir o próprio PSL desde a briga entre o filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, e os deputados delegado Valdir e Joice Hasselmann pela liderança do partido na Câmara, mas também pela confusão com o presidente do PSL, Luciano Bivar, pelo farto dinheiro do fundo partidário de R$ 238 milhões.

Resultado: o presidente da República ficou sem partido e com cerca de 30 deputados do PSL; o restante abandonou o governo. O partido que seria criado pelo grupo de Bolsonaro, a Aliança pelo Brasil, não conseguiu obter registro no TSE para disputar as eleições municipais.

Dessa forma, as derrotas que o governo sofre dentro do Congresso Nacional são resultado da ingerência do presidente Jair Bolsonaro, seja por não dar prioridade necessária para aprovações de suas propostas, seja por viver em eterno conflito com todos. Fora isso, as chamadas derrubadas de vetos no Congresso talvez sejam altas porque o presidente as quer enfrentar, mesmo ciente de que suas decisões serão revertidas.

*Matheus Miranda é articulista e presidente do Instituto Libercracia. 

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