O governo americano corre o risco de ter seu funcionamento paralisado devido ao impasse no Congresso. Os riscos e custos disso já foram amplamente alertados, e a maioria ainda espera uma solução, ainda que aos 45 minutos do segundo tempo.
Não é uma questão trivial. Mas o que realmente me incomoda é ver a grande imprensa tratando o tema de forma simplista e maniqueísta: alguns “lunáticos” do Tea Party, movimento radical de “ultradireita”, querem prejudicar a vida de Obama, e para isso estão dispostos a sacrificar o povo americano. Falso!
O buraco é bem mais embaixo. Para começo de conversa, Obama plantou as sementes que agora colhe. Foi ele quem segregou a nação com um discurso radical, monopolizando os fins nobres e demonizando a oposição. Se você era contra seu programa Obamacare, carro-chefe eleitoral, então você só podia ser contra a saúde dos pobres. Absurdo!
O fato é que o governo americano tem ignorado sua tradição de escopo limitado e avançado cada vez mais sobre as liberdades e os bolsos do cidadão. Como a cultura da liberdade individual é bem enraizada por lá, e o legado dos “pais fundadores” ainda ecoa, houve forte reação. O Tea Party, na verdade, é essa reação em busca do resgate de um modelo de estado mais limitado.
Como escreveu Bernardo Santoro, diretor do Instituto Liberal:
A democracia foi pensada, como bem explica Montesquieu, para tentar diluir ao máximo o poder político no maior número possível de pessoas, de forma a não se ter uma tirania.
Dentro dessa ideia, o poder executivo deve executar as leis e o poder legislativo deve elaborar as leis. Aprovar a lei orçamentária é um papel fundamental do poder legislativo, caso contrário o chefe de governo poderia sair arrecadando o dinheiro que quisesse e gastando como bem entendesse, o que é, na prática, um despotismo.
Isto posto, o Congresso Americano está cumprindo o papel constitucional e filosófico que lhe cabe numa democracia, e ninguém deve ser mal visto por fazer seu trabalho quando tal trabalho está dentro de uma conformidade ético-jurídica, e ainda mais quando se trata de uma função essencial para o bom funcionamento de uma sociedade sadia.
[…]
A Câmara, de maioria republicana, aprovou um orçamento. O Senado, de maioria democrata, o rechaçou e condicionou sua aprovação ao restabelecimento completo dos fundos de saúde. Portanto, todos os problemas foram causados pelos democratas, e não pelos republicanos.
Se você ler apenas a grande imprensa brasileira, ficará com a nítida sensação de que os riscos da paralisia americana têm ligação apenas com um bando de xiitas reacionários do Partido Republicano atrelados ao movimento Tea Party. Não é verdade.
Ninguém fala do Obama, seu populismo, sua retórica sensacionalista e o Obamacare, programa demagógico que fere até a Constituição do país. Ninguém fala que esses membros do Tea Party foram eleitos com forte apoio popular justamente para barrar um projeto de governo que mira no modelo europeu, falido, de welfare state.
Os “reacionários” querem resgatar valores do tempo em que a responsabilidade individual era importante, e que não cabia ao governo se meter em tudo e avançar no bolso dos cidadãos com tal voracidade. Se há o risco de curto prazo com o problema do “debt ceiling”, isso tem raízes na expansão irresponsável dos tentáculos do governo, que acelerou durante a gestão Obama. Isso você não lê na nossa imprensa…