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Em sua coluna de hoje na Folha, Aécio Neves toca em questão de suma importância: o federalismo. No Brasil, tal conceito está muito distante, cedendo espaço para uma concentração absurda de poder no governo federal. Segue um trecho importante do artigo do tucano:

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O alerta de hoje encontra amparo na realidade de Estados e municípios cada vez mais fragilizados e dependentes da benemerência do governo central.

A bordo de uma alta carga tributária e de um presidencialismo quase imperial, a União transforma direitos dos brasileiros em favores de governo.

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Apesar da convulsão nas áreas de saúde e segurança, os recursos federais são incompatíveis com a dimensão e a gravidade dos problemas. Na saúde, a participação federal é declinante. Na segurança, 87% do total das despesas estão hoje a cargo de governadores e prefeitos.

A questão de fundo ultrapassa a mera razão aritmética das finanças dos governos e alcança um outro patamar de reflexão. Não há como superar a pobreza, o atraso e déficits gigantescos desconsiderando aqueles que deveriam ser parceiros da travessia para um novo patamar de desenvolvimento.

Montoro dizia que ninguém mora no país ou no Estado, moramos nos municípios. E alertava: quanto mais longo o trajeto do recurso público até o seu destino final –o cidadão–, maiores são as chances de desperdício e de desvios pelo caminho.

Cheguei a escrever um artigo para o GLOBO sobre o assunto, alertando para o risco de enterrarmos cada vez mais fundo o conceito do federalismo:

A morte do federalismo

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O poder corrompe. Cada indivíduo costuma se preocupar mais com seus interesses do que com aqueles distantes. A soma do conhecimento dos indivíduos não existe em lugar algum como um todo integrado. Para lidar com o risco de corrupção proveniente da concentração de poder, com o individualismo natural dos homens, e com a dispersão do conhecimento na sociedade, o modelo federalista parece ser a melhor alternativa.

O grande pilar do federalismo é o conceito de subsidiariedade: a idéia de que a autonomia individual é fundamental. O governo central deve assumir apenas as competências necessárias que as entidades mais próximas dos indivíduos não conseguem executar. Muitas atividades do governo não requerem necessariamente uma política nacional. A própria comunidade local sabe melhor dos seus problemas e demandas, sem falar que a ação individual vale muito mais quando o escopo é restrito.

Basta pensar no grau de influência que um indivíduo exerce nas coisas públicas de sua pequena comunidade, frente à total irrelevância de um voto entre 130 milhões para eleger o presidente do país. No berço da democracia, na Atenas de Péricles, alguns milhares de indivíduos debatiam na Ágora poucas questões comuns a todos. Atualmente, temos inúmeras questões muito mais complexas delegadas ao governo central, que exerce poder crescente no cotidiano de dezenas de milhões de pessoas.

Uma grande vantagem do federalismo é a diversidade de opções, fruto da concorrência entre estados para atrair pessoas e investimentos. Quanto mais concorrência, melhor para os habitantes e consumidores de serviços públicos, assim como ocorre no setor privado. Infelizmente, muitos chamam esta concorrência de “guerra fiscal”, como se a busca por melhores serviços com um custo tributário menor fosse prejudicial. No federalismo, os residentes podem “votar com os pés” caso seus governos locais abusem do poder, dos impostos ou da incompetência nos serviços. A prova de que esta pressão funciona é a necessidade de regimes fracassados como os socialistas erguerem muros para impedir a saída do próprio povo.

Os exemplos mais famosos de federalismo são Suíça, Estados Unidos e Canadá. Na Suíça, os cantões preservam bastante independência, escolhendo em plebiscitos locais diversos assuntos que nem chegam ao governo central. Este arrecada menos da metade do total de receitas tributárias da nação, comparado a mais de dois terços no caso brasileiro, onde os estados acabam reféns de Brasília. Pior mesmo só a Nigéria ou a Venezuela, onde o governo central arrecada praticamente a totalidade dos impostos do país.

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Outro ponto importante é a limitação do poder Executivo. Todos conhecem os presidentes da França, da Itália e da Alemanha, mas ninguém saberia dizer o nome do presidente suíço. Na verdade, a Suíça tem um Executivo composto por sete membros e eleito pelo Parlamento. Isso reduz o risco de culto à personalidade, de abuso do poder pelo “messias salvador”, o “pai do povo”. Já o presidente brasileiro concentra poderes incríveis, e ainda abusa da prerrogativa de governar por “medidas provisórias”, que fariam qualquer general do regime militar morrer de inveja.

Quando se trata da representatividade das respectivas unidades constitutivas na federação, verifica-se que nosso federalismo inexiste na prática. A distorção maior é em prol do Norte e do Nordeste, contra o Sul e o Sudeste. Juntos, Norte e Nordeste possuem 36% da população, produzem 18% do PIB, mas apontam 48 dos 81 senadores, enquanto Sul e Sudeste, com 57% da população e 73% do PIB, indicam somente 21 senadores. Quem paga a conta não exerce o poder.

A mesma distorção existe na Câmara, já que há um limite para o número de representantes de São Paulo, assim como um número mínimo de oito deputados garantido aos estados menores com poucos eleitores. Desta forma, Norte e Nordeste elegem 216 dos 513 deputados, contra apenas 256 do Sul e Sudeste. Tocantins possui um deputado para cada 160 mil habitantes, contra um deputado para cada 585 mil paulistas. E ainda querem criar novos estados no Norte!

O caso do pré-sal é sintomático, mostrando o fracasso do nosso “federalismo”. O Sudeste pode ser obrigado a sustentar com sua produção de petróleo os caudilhos nordestinos e os corruptos em Brasília. Com tantos abusos, corre-se o risco de movimentos separatistas ganharem força com o tempo. Ou, quem sabe, no tradicional “jeitinho” brasileiro, os habitantes do Sul e Sudeste não resolvem criar uma dezena de estados novos para equilibrar as forças políticas?