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Caça-níqueis, bingo e jogo do bicho: quando o estado cria as máfias
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“Os governos existem para nos proteger uns contra os outros; o governo vai além de seus limites quando decide proteger-nos de nós mesmos.” (Ronald Reagan)

Uma operação da polícia no Rio nesta quarta-feira prendeu mais de 20 pessoas ligadas aos jogos ilícitos, incluindo 9 policiais. De acordo com balanço parcial da ação, divulgado pelo Ministério Público (MP-RJ), foram apreendidas mil máquinas caça-níqueis, 59 carros, R$ 500 mil em espécie, além de aparelhos digitais de identificação biométrica, notas promissórias e computadores. Um revólver e duas pistolas, 134 munições, três carregadores e uma luneta para fuzil também foram encontrados.

Os jogos “clandestinos” se tornaram lucrativos negócios para criminosos. Policiais e políticos acabam se envolvendo com bandidos perigosos, todos aproveitando as altas somas que passam pelo setor. O crime envolve o alto escalão da política e da PM. Mas nem sempre foi assim, tampouco é assim em todos os países. É preciso compreender melhor o papel da própria proibição na criação dessas máfias.

A pergunta que surge é: a quem interessa manter o jogo do bicho ilegal? Com certeza não interessa aos consumidores do jogo, que encontram inclusive produtos substitutos oferecidos pelo próprio governo, que pelo visto detesta concorrência. Também não é do interesse dos empresários honestos que poderiam explorar esse comércio, como tantos outros em prol da satisfação dos clientes e conseqüente lucro.

Aliás, não custa lembrar que a origem do jogo foi nobre. O jogo recebeu esse nome quando foi lançado, em julho de 1892, por João Batista Vieira Drummond, o barão de Drummond, dono de uma chácara com um pequeno jardim zoológico localizado em Vila Isabel, Rio de Janeiro. Antes do bicho, havia outros jogos semelhantes no Brasil, como os jogos das flores, das frutas e dos pássaros.

Manuel Zevada, um mexicano e influente banqueiro do jogo das flores, propôs ao barão a criação de uma réplica de tal jogo, mas no caso usando bichos. O objetivo era conseguir recursos para manter os animais e toda a estrutura do zoológico. Os visitantes eram estimulados a participar de sorteios. Cada bilhete trazia o desenho de um bicho.

Mas quando o governo resolveu monopolizar os jogos de azar, lançou os empresários do jogo do bicho na ilegalidade. Claro que o setor passou a ser dominado por “contraventores”, já que o próprio governo decidiu que assim seria. Uma vez que os “bicheiros” já estavam no crime, por causa do governo, nada mais natural que estender as operações ilegais.

Ganhos de escala, como chamamos em economia. Com uma lista de policiais e políticos no “mensalão” do bicho, seria loucura pensar que eles não iriam explorar outras áreas criminosas. Se amanhã o governo resolver que vender bebida alcoólica é ilegal, o que esperar desse setor? Não é preciso imaginar. Basta lembrar a Lei Seca americana, que criou o famoso mafioso Al Capone, entre outros. Quando o governo voltou atrás, o setor passou a ser dominado por empresários respeitados, como os sócios brasileiros da InBev.

Por que não deixar empresários como esses competirem livremente no jogo do bicho? Eis a pergunta que poucos fazem, preferindo voltar seu foco para o problema das propinas. Ignoram que a corrupção é fruto da ilegalidade que o próprio governo criou no setor. E essa corrupção é do interesse justamente de membros do governo.

A premissa central por trás de medidas como a proibição do jogo do bicho é que o governo tem a função de nos proteger de nós mesmos. Mas o governo não tem como função básica proteger o indivíduo de si mesmo, e sim protegê-lo de ameaças externas, como a dos bandidos.

Paradoxalmente, o nosso governo financia certos bandidos, como os invasores do MST, enquanto cria leis ineficazes que jogam setores na criminalidade, com a desculpa esfarrapada de proteger os “mentecaptos” deles mesmos. Sem falar que o próprio governo vende todo tipo de jogo de azar, como as lotéricas, raspadinhas etc. É muita hipocrisia!

O cerne do problema não está no jogo do bicho, tampouco nos contraventores conhecidos como “bicheiros”. O epicentro do problema está na invasão governamental em um setor que deveria ser livre. Ou defendemos a liberdade, ou não haverá como evitar que as cobras tomem conta dos burros. Proibindo o jogo do bicho, sempre teremos propinas polpudas para policiais e políticos safados. Vai dar zebra todo dia!

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O caso dos bingos: recordar é viver

O cerco contra os bingos fechou quando o braço direito de José Dirceu, então o todo-poderoso ministro de Lula, foi flagrado numa fita acertando propina com um bicheiro ligado aos bingos. Homem de extrema confiança de Dirceu, inclusive com fortes laços pessoais devido a uma ligação de 12 anos, Waldomiro Diniz foi pego numa gravação de vídeo cobrando propina do bicheiro Carlinhos Cachoeira.

Waldomiro era subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, e pelas evidências apresentadas extorquia dinheiro dos contraventores para engordar o caixa do partido. O esquema contava com a estrutura dos bingos. O PT se mobilizou para evitar a “CPI dos Bingos”, e, em vez de estimular o avanço das investigações, decidiu simplesmente fechar as casas de jogo, que geram vários empregos. A postura do governo Lula foi a do marido traído que, ao flagrar a esposa com outro no sofá da sala, resolve jogar fora o sofá.

O relacionamento do PT com os contraventores do bicho parece vir de longa data. O ex-governador Olívio Dutra, que comandava o Rio Grande do Sul, considerado vitrine nacional para o PT, esteve sob a mira de investigações por parte do Ministério Público Federal e da Justiça depois de uma CPI sobre a segurança pública, por denunciadas ligações com o jogo do bicho e contribuições irregulares para o partido quando das eleições para governador. Uma fita gravada pelo ex-tesoureiro do partido, Jairo Carneiro, relatava o financiamento da campanha do PT pelo jogo do bicho.

Acerta quem identificar na cartela a simbiose interessante entre políticos desonestos e jogos na ilegalidade. Número 171. Bingo!

 

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