A presidente Dilma se vangloriou de que vai fechar o décimo ano consecutivo com a inflação dentro da meta. O malabarismo – tanto contábil quanto semântico – permite que a presidente faça esse barulho político, contando uma mentira com meias verdades. Explico.
Para começo de conversa, a meta de inflação e 4,5% ao ano (vale notar que é um valor extremamente alto para padrões internacionais, inclusive para países emergentes). Esse é o centro da meta, em uma banda que permite dois pontos percentuais para cima ou para baixo em casos esporádicos de crises.
Ou seja, a meta mesmo é 4,5%, mas há uma tolerância para situações temporárias, em caso de sintonia fina do Banco Central, já que economia não é ciência exata. Mas ninguém diria que 6,5%, o topo da banda, é “a meta” de inflação. Bem, a presidente Dilma diria, pelo visto.
É que essa foi a taxa oficial medida pelo IPCA nessa década inteira de PT no governo. Para um ou dois anos, a diferença não é tão gritante, e cabe no argumento de que se trata de alguma situação especial. Mas quando a inflação é sistematicamente aquela do topo, então fica claro que a meta não é mais o centro, e sim o próprio topo.
Ao longo de uma década, a diferença é brutal. Malditas taxas compostas! Abaixo, segue um gráfico que expõe isso de forma bem clara. A linha vermelha é a inflação que deveria ocorrer, caso o centro da meta fosse a inflação oficial a cada ano. Já a linha azul mede o índice IPCA efetivo. Vejam:
Com o passar do tempo, a diferença vira uma grande boca de jacaré. A inflação acumulada até setembro de 2013 nessa década estava acima de 80%, enquanto deveria estar em 60% se tivesse ficado na meta (centro) a cada ano. Estamos falando de uma diferença superior a vinte pontos percentuais, ou algo como 2% ao ano. É uma enorme perda adicional de poder aquisitivo da moeda.
Como fica claro, quando a presidente Dilma afirma que cumpriu a meta por dez anos seguidos, ela esconde o essencial. O acumulado de inflação acima do centro da meta representa um enorme montante nesse período. Isso sem falar que a inflação oficial está defasada, manipulada, pois vários preços administrados pelo governo se encontram congelados. A inflação real é bem maior.
O discurso de Dilma tem um único objetivo, que é eleitoral. Mas sua retórica não bate com os fatos. Para efeitos práticos, aqueles que doem no bolso de cada um de nós, o governo rasgou o controle da inflação, que tem sido sistematicamente superior à meta, já bastante elevada. Uma perda de poder aquisitivo da moeda de 80% em uma década é inflação até dizer “chega”, e ninguém deveria se orgulhar desse péssimo resultado.