Em entrevista ao jornal Valor Econômico, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, negou que o banco escolha os tais “campeões nacionais”. Eis como ele se esquivou da acusação:
Valor: O BNDES escolhe setores e empresas?
Coutinho: Se eu olhar o apoio da BNDESPar e o creditício, das 100 maiores empresas brasileiras, 91 receberam apoio do BNDES. Se pegarmos as 500 maiores, 406 foram apoiadas pelo banco ou 81,2%. Se olharmos as 1.000 maiores, de acordo com dados do Valor 1000, o BNDES apoiou 783, quase 80%. Isso mostra que o banco é isento, técnico e aberto a todo o sistema empresarial brasileiro. No período mencionado, o BNDES também realizou mais de três milhões de operações de crédito para micro, pequenas e médias empresas (MPEs) por meio dos cartões e do Finame. As MPEs representavam 20% do desembolso total. Hoje, em torno de 37%.
Sim, o BNDES é uma grande “mãe” para várias empresas. Mas a resposta do presidente do banco foi evasiva, ou no mínimo esperta. Pensei na hora no livro “Como mentir com estatísticas”.
Em primeiro lugar, em qual período Luciano Coutinho está analisando tais dados? Parece natural que em um período longo o suficiente, as principais empresas do país terão, em algum momento, tido acesso a um financiamento do BNDES.
Em segundo lugar, e o mais importante, qual a concentração dos maiores 10 ou 20 tomadores de empréstimos do banco? Eis a pegadinha: se o BNDES emprestar R$ 1 milhão para 300 empresas, e R$ 1 bilhão para 10 empresas, o presidente poderá afirmar que o banco empresta para 310 empresas. Mas isso esconde mais do que revela, não é mesmo?
E, de fato, a concentração da carteira do BNDES é grande. As grandes empresas recebem quase 70% do total de desembolsos do BNDES. Nos últimos anos essa tem sido a média. Entre as grandes empresas, algumas recebem muito mais que as outras.
Logo, o BNDES pode ser acusado, sim, de escolher “campeões nacionais”, especialmente sob o comando de Luciano Coutinho. O grupo X de Eike Batista ou o setor de frigoríficos comprovam isso.
E agora o BNDES vai receber mais R$ 20 bilhões do Tesouro para essa finalidade. Já foram mais de R$ 300 bilhões nos últimos anos. É o maior ícone do nosso capitalismo de estado. Prejudica o desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro, e cria incentivos perversos: mais vale se aproximar do governo para ser um dos agraciados com o subsídio do que investir em produtividade ou pesquisa.
O BNDES se tornou um entrave para nosso desenvolvimento. Eis a triste realidade, que as meias verdades de Coutinho não conseguem ocultar.
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