Reportagem da Veja mostra que a inadimplência das famílias do programa “Minha Casa, Minha Vida” bate recorde preocupante:
Ele foi planejado para ser a mais vistosa vitrine eleitoral da gestão Dilma Rousseff – a resposta do governo para o sonho da casa própria. Lançado em 2009, o programa Minha Casa Minha Vida consumiu 134,5 bilhões de reais para fazer 2,1 milhões de casas populares. O primeiro milhão já foi distribuído. A presidente Dilma percorreu seis estados brasileiros neste ano para providenciar ela mesma a entrega. O potencial de dividendos eleitorais da iniciativa é tamanho que ela é tratada como uma espécie de Bolsa Família da área urbana.
Programa subsidiado, o Minha Casa Minha Vida prevê que o governo arque com uma parte das prestações e o beneficiado banque o restante. O valor das parcelas é calculado com base na renda de cada família. No papel, tudo certo. Na realidade, tudo mais ou menos. Dados obtidos por VEJA revelam que o índice de inadimplência na faixa de financiamento que inclui participantes com renda mensal mais baixa, até 1 600 reais, está em 20%. É um número dez vezes maior que a média dos financiamentos imobiliários no Brasil e 4 pontos mais alto que a porcentagem de atrasos em pagamento de hipoteca nos Estados Unidos em 2007, quando se acentuou a crise que serviu de gatilho para a pior recessão desde o fim da II Guerra Mundial.
Todo mundo sonha com a casa própria. Mas querer não é poder. Eu mesmo vivi por seis anos pagando aluguel, e não há nada de errado nisso. Muitas pessoas postergam a compra da casa própria até sentirem que as condições financeiras permitem. Passar por cima dessa restrição orçamentária pode ser um grave erro, que cobrará um preço enorme depois.
Mas governos populistas adoram explorar esse sonho. De olho apenas nas próximas eleições, e não nas próximas gerações – isso é tarefa de estadistas, em falta no mundo atual – esses governantes estimulam de maneira irresponsável o crédito para a compra da casa em nichos de baixa renda. Foi assim nos Estados Unidos também.
Em 1977 foi criado o Comunity Reinvestment Act (CRA), com o objetivo de obrigar bancos a emprestar uma parte dos seus ativos às comunidades carentes. Em 1994, o governo estendeu as metas do CRA, e em 2005, após um escândalo contábil envolvendo a Freddie Mac, o governo resolveu punir a empresa demandando mais crédito hipotecário para as classes de baixa renda.
Em outras palavras, o governo exerceu enorme pressão para que o crédito imobiliário chegasse às classes mais baixas, com menor condição de pagamento. Foi justamente este setor subprime do crédito imobiliário que experimentou o maior crescimento nos últimos anos, caracterizando uma verdadeira bolha que depois estourou, com as conseqüências que conhecemos.
As duas empresas que atuavam nas hipotecas – Fannie Mae e Freddie Mac – eram paraestatais que gozavam de privilégios do governo. Havia um órgão regulador – OFHEO – cuja única missão era cuidar da saúde financeira dessas duas empresas. Não obstante, foram as que mais se alavancaram, com US$ 50 emprestados para cada US$ 1 de patrimônio.
No Brasil, a Caixa Econômica Federal é a instituição financeira mais alavancada também, e tem expandido sua carteira de crédito em mais de 40% ao ano. É o governo fomentando uma bolha imobiliária de olho apenas nas eleições.
Os mais pobres, que hoje se sentem felizes por finalmente terem acesso ao financiamento da casa própria, poderão ser os mais prejudicados amanhã, quando se mostrar inviável para muitos a quitação desses empréstimos. O nível de inadimplência de 20% é temerário. A conta não fecha. Uma cratera está sendo cavada, e terá que ser paga eventualmente.
O governo se mostra irresponsável e insensível para com os mais pobres. Tudo em nome deles mesmos. Assim é todo populista: promete ajudar os pobres, e acaba por prejudicá-los ainda mais.