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Após a presidente Dilma afirmar que seu governo tinha o “padrão Felipão” e fazer de tudo para tirar uma casquinha política da Copa, veio a humilhante derrota para a Alemanha. Em busca de uma narrativa nova que não fosse tão constrangedora, o PT saiu em campo para defender a tese de que o evento em si foi um sucesso em termos de organização, área que efetivamente caberia ao governo, já que Dilma não jogou na seleção (assim como o Fred).

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Mas quanto tem de verdade nisso? A Copa foi mesmo esse sucesso todo do ponto de vista de organização e infraestrutura? Aqueles “pessimistas” que brincavam com o velho chavão “imagina na Copa” estavam realmente errados ao temer o impacto de um evento deste porte em nosso cotidiano? Eram apenas “urubus” que desejavam criticar um governo tão competente e eficiente como o de Dilma? Há controvérsias…

A Folha divulgou hoje que o tráfego aéreo nas cidades-sede da Copa, pasmem!, caíram em dias de jogos em relação ao mês anterior:

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O número de pousos e decolagens nos aeroportos durante os dias de jogos na Copa foi 4% menor do que um mês antes, segundo levantamento feito pela Folha com base nos boletins diários de tráfego aéreo, de 12 de junho a 13 de julho, publicados pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo. A comparação é com a média do movimento de pousos e decolagens no mesmo dia da semana no mês anterior.

“Houve uma grande concentração em alguns dias, mas a economia estava devagar durante a Copa, o que afetou o movimento como um todo”, disse à Folha o chefe da sala master montada para fazer o gerenciamento do tráfego aéreo durante a Copa, brigadeiro Gustavo Adolfo Camargo de Oliveira.

A aviação comercial regular realizou 21.261 movimentos nos aeroportos das cidades-sede em dia de jogo, 9% menos do que na média para o mesmo dia da semana nas quatro semanas anteriores.

[…] Ao longo da Copa houve apenas três dias de pico, mas que não foram mais intensos do que em Carnavais e feriados de fim de ano. […] “O movimento no dia da final foi similar ao que o Galeão costumava receber em carnavais e festas de fim de ano até 2007”, diz Oliveira. De lá pra cá, o aeroporto perdeu espaço, sobretudo para o Santos Dumont.

Ou seja, aquela super-demanda esperada que geraria talvez o caos simplesmente não se materializou. Pode soar estranho quando lemos sobre a enorme quantidade de turistas, mas ao menos dois aspectos precisam ser levados em conta: 1) a maioria dos turistas era formada de argentinos, muitos deles bem “molambos” que vieram de transporte terrestre e ficaram acampados pelo país; 2) a atividade econômica praticamente parou, inclusive com o uso de feriados por parte dos governos, o que fez despencar os voos ligados aos negócios. Basta ver que o tráfego no Santos Dumont e em Congonhas, tradicionais pela ponte-aérea de executivos, desabou:

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Portanto, é preciso tomar muito cuidado com a celebração indevida, pois vêm aí os Jogos Olímpicos, e se não aprendermos as lições, vários erros serão repetidos. Parte do “sucesso” comemorado pelo governo federal se deve ao velho “jeitinho”, ao improviso, às gambiarras. Decretar feriado durante vários dias da Copa não é solução séria, e impõe enorme custo ao país. Quanto se perde de produção parar São Paulo por um dia inteiro, por exemplo?

Conforme reportagem do Valor, a Copa prejudicou parte do comércio varejista e derrubou as vendas do setor em junho:

O Índice Cielo do Varejo Ampliado (ICVA) cresceu 0,5% no mês passado, em relação a igual período de 2013, descontada a inflação. Em maio, o indicador havia crescido 5,5% na mesma base de comparação.

De acordo com a Cielo, o impacto da Copa se deu em função dos feriados decretados nos dias dos jogos. “O tão esperado efeito Copa mostrou que alguns setores se beneficiaram do evento e outros foram prejudicados pelos feriados”, destacou o gerente de inteligência da Cielo, Gabriel Mariotto.

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Segundo ele, sem os feriados nos primeiros 19 dias de jogos (de 12 a 30 de junho), o varejo teria crescido 2%. Além da Copa, o varejo em junho sofreu com o feriado do Corpus Christi – ambos efeitos não existiram em junho de 2013.

[…] os setores de vestuário, lojas de departamento e materiais para construção tiveram retração em junho. Contrariando as expectativas para o período dos jogos, as companhias aéreas e hotéis também tiveram retração na receita, descontada a inflação.

O mercado de trabalho brasileiro registrou em junho deste ano a criação de 25.363 postos de trabalho, queda de 56,9% ante o mesmo mês de 2013. É o pior resultado para meses de junho desde 1998, quando foram geradas 18.097 vagas, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. A prévia do PIB divulgada hoje pelo Banco Central indica retração econômica em julho, e analistas já esperam uma queda do PIB no segundo semestre como um todo.

Como se pode ver, existe sempre aquilo que se vê, e aquilo que não se vê. Uma análise mais detalhada, sem uma visão míope e eleitoreira, mostra que o governo federal soltou fogos de artifício sem muito motivo. É análogo a comemorar queda de acidentes de carro decretando a suspensão das vias, ou a redução no índice de criminalidade graças a um toque de recolher da população. Uma vitória de Pirro.

PS: Nem sequer entrei na questão de um viaduto assassino que caiu e matou duas pessoas durante os jogos, provavelmente porque foi construído a toque de caixa por falta de planejamento. Isso é sucesso de infraestrutura?

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Rodrigo Constantino