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O setor privado não foca no longo prazo?
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Essa é uma das mais repetidas falácias da esquerda: a de que empresários não focam no longo prazo e querem apenas lucrar de forma imediata. Foi justamente a falácia que o economista Marcelo Miterhof, do BNDES, defendeu em sua coluna de hoje na Folha. Diz ele:

Estado e mercado são formas de organização coletiva. É certo que enfatizam tipos opostos de interação humana, cooperação e competição, porém isso não significa que devam existir dicotomicamente.

Pelo contrário, é desejável que concorrência e cooperação se articulem num sistema de pesos e contrapesos. Na democracia, o acesso ao poder do Estado é decidido pelo mecanismo competitivo das eleições. No mercado, a competição induz eficiência de custos, mas é notório que o setor privado valoriza sobremaneira a liquidez e não aceita tomar riscos por horizontes muito longos.

Em primeiro lugar, o mercado não é só competição, ainda que este seja um fator fundamental de sua eficiência e constante busca por excelência e inovação. É, também, um incrível mecanismo de cooperação, e basta adentrar um supermercado para comprovar isso.

Agora vamos à afirmação do economista: o setor privado “não aceita tomar riscos por horizontes muito longos”. Sério mesmo? Então como ele explica os empresários americanos que construíram as primeiras ferrovias transnacionais, sem um tostão estatal? Como explica os projetos que levam décadas de maturação em setores intensivos em capital?

Claro, o economista pode estar apenas defendendo o seu ganha pão, tentando justificar a relevância do BNDES. Mas vários outros países mais desenvolvidos não contam com um BNDES, e possuem financiamento de longo prazo oferecido pelo próprio mercado.

Toda a indústria de “private equity” e “venture capital”, aliás, existe exatamente para isso. São investimentos que só começam a dar retorno depois de vários anos. De onde o economista tirou essa ideia? Não encontra respaldo algum nos fatos. Eis o fato!

Por isso, as inovações mais radicais -em termos tecnológicos, como nos casos que ocorrem nas indústrias farmacêutica e de defesa, ou mercadológicos, como nos de indústrias nascentes, em que as economias de escala representam altos riscos, ou na busca de internacionalização- são patrocinadas e mesmo lideradas pelo Estado, via criação de estatais, garantia de encomendas ou financiamento. A cooperação e os orçamentos públicos são formas de diluir os riscos elevados que a iniciativa privada não aceita tomar.

Como é? Miterhof nunca ouviu falar em Vale do Silício? As grandes inovações tecnológicas vêm justamente do local com mais presença do livre mercado, em ambiente totalmente competitivo, com várias empresas investindo seus próprios recursos ou recursos de terceiros, fornecidos pelo mercado. De onde ele tirou que foi o estado que garantiu todo esse avanço tecnológico moderno?

A atuação empreendedora do Estado condiciona fortemente o desempenho do setor privado. Tal articulação é mais importante do que a agenda convencional que confere ao setor público a tarefa lateral de reduzir o “custo Brasil”.

Ou seja, em vez de reduzir a burocracia, a carga tributária, flexibilizar as leis trabalhistas, reformar a previdência, investir em infraestrutura, e acabar com as intervenções arbitrárias do governo que geram insegurança jurídica, o certo seria o governo se “articular” com o setor privado em uma agenda “convencional”?

Será que o economista do BNDES não sabe que essa simbiose tem produzido apenas problemas? Será que desconhece que o nacional-desenvolvimentismo é um fracasso retumbante? Será que não percebe que isso distorce os incentivos, pois os empresários preferem “investir” em lobby em vez de produtividade, já que a amizade com o rei vale ouro? Será que não notou que a política de escolha dos “campeões nacionais” foi para o buraco, como mostra o caso do Grupo X?

Pois é. Se ele soubesse disso tudo, não seria um economista de esquerda trabalhando no BNDES, não é mesmo?

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