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O caderno EU&Fim de Semana, do VALOR, traz essa semana uma entrevista com alguns “especialistas” sobre as manifestações de junho. Entre eles, Bruno Torturra, aquele que representa a Mídia Ninja ao lado de Pablo Capilé. Alguns trechos merecem destaque:

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Quem tomou posição mais clara tende a crescer, como a Rede, de Marina Silva. Porque ela se chama rede, vem de uma lógica horizontal, tem um discurso oriundo do ativismo, uma crítica ao funcionamento dos partidos, e está fazendo algo que tende a ganhar espaço: candidaturas autônomas.

Como é que é? Quer dizer que basta colocar rede no nome para ganhar ares modernos de “horizontalidade”? Desafio alguém a dar o nome de cinco figuras importantes dentro da tal Rede! Poucos movimentos são tão verticais quanto o novo partido de Marina Silva. Ele é totalmente dependente dela e de seus 20 milhões de votos nas últimas eleições presidenciais. É o mais personalista dos projetos políticos atuais, mais até do que o  lulopetismo.

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A presença do Black Bloc é reação ao sentimento de que o movimento estava sendo tomado por fascistas. Mas isso é uma alucinação. O Black Bloc foi para a rua com o seguinte discurso: “Chega de ver a sede da Fiesp fazendo projeção em verde e amarelo. Chega de classe média alienada querendo determinar o que o protesto é”.

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O Black Bloc não é um movimento. É uma estética, um código simples de reproduzir. Quando vão para a rua a sociedade identifica: o Black Bloc chegou. É um comportamento emergente. A ausência de liderança, que virou clichê, é ausência de mediação. A ação direta das pessoas, seja alguém de classe média que pintou a cara de verde e amarelo, seja o garoto de periferia que vai quebrar um banco.

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A violência foi dirigida aos bancos. Se fosse uma quebradeira na avenida Paulista inteira, arrebentando bares e comércio, batendo em pessoas, o clamor por repressão viria. Grande parte da sociedade pacata se sente representada. Não está disposta a fazer como o Black Bloc, mas se diz intimamente: “Pode continuar, não quero que a Rota quebre esses meninos”.

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Alguém aí sentiu certo ar de defesa e justificativa aos atos de vandalismo dos anarquistas do Black Bloc? Primeiro, o uso cuidadoso da palavra “reação”. O Black Bloc entra em jogo porque os alienados da classe média “fascista” queriam definir o que era o protesto.

Depois, a suave comparação entre os vândalos e os garotos da cara-pintada. O de classe média pinta o rosto, o pobre da periferia quebra uma agência de banco, tudo “ação direta”, jogada no mesmo saco.

Por fim, a justificativa de que o vandalismo é direcionado aos bancos, logo, símbolo do capitalismo. Não estão quebrando bares, mas bancos! Sacou? Isso pode, e isso, segundo Torturra, conta com o apoio de “grande parte da sociedade pacata”, que se sente representada pelos criminosos, ou melhor, por esses “meninos”.

Será que não podemos criar estruturas um pouco mais democráticas? Ao mesmo tempo, o leitor, o espectador, que já se sente mais com poder, vai ter que se reformular. Vai ter que entender que com esse novo poder de confrontar as narrativas vem a responsabilidade de não ser só um replicador de informação. Precisa checar também. E precisa decidir se está disposto a financiar formas colaborativas de mídia, já que rejeita, por exemplo, a notícia de um jornal que tem anúncios e talvez seja manipulado por causa disso. Mesmo assim, não defendo o fim do modelo vigente. Seria um país pior se os jornais fechassem.

Ufa! Ainda bem que Torturra não quer fechar os jornais! Quanto aos anúncios, o que garante uma imprensa livre e independente é justamente uma ampla base de anunciantes do setor privado. O risco, que pelo visto passa totalmente despercebido pelo “ninja”, é depender de verbas estatais. É isso que gera viés, dependência, parcialidade, coisas bem mais comuns na imprensa “chapa-branca”. O Mídia Ninja depende de verbas estatais? Ah, talvez isso explique muita coisa…

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Um erro do movimento é achar que a ausência de liderança é um valor em si. Precisamos de mais liderança, não menos. Não seria alguém para mandar em todo mundo, mas para representar as vozes. Alguém que vai ser bem mais cobrado que as lideranças analógicas. Também não tem ninguém traduzindo isso culturalmente. Os porta-vozes que faltam na política, capazes de traduzir e atualizar o sistema, também faltam na arte. Algumas pessoas captam esse sentimento. Se não é mais o líder político ou o artista, talvez sejam [Julian] Assange, [Edward] Snowden, [Bradley] Manning.

Pensei que Torturra tinha elogiado a Rede da Marina, antes, justamente por não ter essa figura de liderança… Mas agora ele deseja a tal liderança. Não algum político, mas um Assange, um Snowden, um Manning… um Bruno Torturra, quem sabe?

Isso, não custa lembrar, vem do “bom policial” da dupla dinâmica, pois o outro, o tal de Pablo Capilé, é a caricatura do velho comuna em pessoa. A embalagem pode ser melhor, a forma de se expressar também, e há o cuidado em transmitir a mensagem de forma mais suave e até subliminar. Mas o conteúdo está lá, é o mesmo. E não convence ninguém um pouco mais atento…

Em tempo: quem quiser saber melhor como funciona a “horizontalidade” da Mídia Ninja, que não tem liderança clara segundo seus dois líderes, recomendo a leitura da carta aberta da cineasta Beatriz Seigner, reproduzida por meu vizinho virtual Reinaldo Azevedo.