Como evitar que a democracia se torne uma simples tirania da maioria? Ou pior: como evitar que ela se torne uma tirania de minorias organizadas, que falam em nome da maioria? Essas questões são antigas, tão antigas quanto Aristóteles, que já indagava em seu Política: “Se, por serem superiores em número, aprouver aos pobres dividir os bens dos ricos, não será isso uma injustiça?”
Os pensadores liberais debatem esse tema há séculos, em busca de mecanismos que, ao menos, mitiguem o risco de a democracia ser usada para destruí-la. Na era moderna, com as democracias de massas, essa ameaça sem dúvida aumentou. E foi Tocqueville quem percebeu melhor do que qualquer um esse lado perigoso da democracia igualitária moderna, tendo os Estados Unidos como palco de estudo.
Foi o assunto da coluna de João Pereira Coutinho na Folha hoje, por ter participado de um colóquio do Liberty Fund sobre o pensador aristocrata francês. Além do risco conhecido do populismo, há esse outro lado da “intelligentsia” vanguardista, que trata os cidadãos como crianças, assumindo o papel de sua “babá”. Uma tirania das minorias, em suma. O que fazer contra ambos os riscos? Escreve Coutinho:
Algumas dessas soluções já foram referidas: separação de poderes; liberdade de expressão; pluralismo religioso; reforço da independência da sociedade civil (a “arte de associação”, como lhe chamava Tocqueville e que ele presenciou com agrado nos Estados Unidos).
Mas a mensagem fundamental de Tocqueville é que a única forma de preservar a liberdade perante a tirania passa por cultivar nos indivíduos o gosto por essa liberdade.
Ou, como o próprio escreveu num dos momentos mais sublimes da sua “Da Democracia na América”, o principal objetivo de um governo virtuoso é permitir que os cidadãos possam viver sem a sua ajuda. E acrescenta Tocqueville: “Isso é mais útil do que a ajuda alguma vez será.”
Passaram quase 200 anos sobre essas palavras. Curiosamente, não envelheceram uma ruga.
Resta disseminar mais esse apreço pela liberdade, pois infelizmente ele ecoa muito pouco em nossas terras brasileiras, onde o estado ainda é visto como o “papai” que irá cuidar do povo e a locomotiva do progresso. Assim não há mecanismo de pesos e contrapesos que dê conta do recado!
Rodrigo Constantino