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Os liberais clássicos e conservadores sempre souberam: a única escolha é entre império da lei (rule of law) ou ditadura. No império da lei, todos recebem tratamento isonômico, são iguais perante as leis, e precisam obedecer somente o que está determinado pelas leis, ou seja, tudo que não é claramente proibido é permitido.

Sem esse pilar, não há democracia. A lei é substituída pelo homem, por critérios vagos e subjetivos, e há o "direito" da força, não mais a força do Direito. Clãs disputam para ver quem vai controlar o aparato estatal que permite tal abuso de poder, para inclusive perseguir adversários. Quem vence, vira ditador.

Merval Pereira, no Globo, comentou em sua coluna desta terça que o STF não pode ficar ao sabor do Zeitgeist, mudando de acordo com o "espírito dos tempos", feito biruta ao vento. Em sua coluna de hoje, Vera Magalhães foi na mesma linha e concluiu:

Não basta mudar de ideia ao sabor das circunstâncias políticas e das conveniências pessoais, ou mesmo de imperativos históricos, como o golpismo bolsonarista ou a pandemia. É preciso dotar o ordenamento jurídico e o sistema de Justiça responsável por aplicá-lo de previsibilidade, constância e higidez. Os três princípios passam longe do vaivém da Corte nas últimas quadras.

Sobram evidências de puro arbítrio e abuso de poder, claro, mas cabe perguntar: por onde andaram esses tucanos nos últimos anos? Afinal, o abuso de poder não é de hoje. Mas quando os alvos eram apenas "bolsonaristas", a velha imprensa tucanopetista fez vista grossa, ou até mesmo aplaudiu e incentivou. Agora percebem que a água pode bater no bumbum de todos?

O STF a cada dia usurpa funções do Poder Legislativo. Decidiu sobre o Marco Temporal, pela volta do nefasto imposto sindical, pela descriminalização das drogas e agora vai deliberar sobre o aborto. O STF legisla sem pudor, transformando o Congresso num prédio irrelevante, nada mais. É isso uma democracia?

Pior: o STF tem feito escola. O CNJ abriu investigação e quebrou o sigilo bancário do desembargador aposentado Sebastião Coelho, crítico das decisões ilegais de Alexandre de Moraes. Cabe ao CNJ quebrar sigilo bancário agora?

A mídia ainda aplaude, pois chama as críticas do desembargador de "incitação a atos golpistas". Miriam Leitão comemora que o julgamento dos "atos golpistas" vai começar no STF, depois de mais de mil pessoas ficarem presas por meses, como se isso fosse uma resposta louvável da democracia ao golpismo. Enquanto essa narrativa for utilizada, não haverá qualquer freio institucional ao abuso de poder.

Novamente: ou escolhemos o império das leis, ou teremos a ditadura. Claro que existem regiões cinzentas, alguma margem para interpretação, uma elasticidade que certamente não é infinita, e se há jurisprudência, precisa ser mantida.

Um Supremo que age como partido político, que se orgulha de ter vencido um candidato, que muda ao sabor do desejo dos ministros não é uma Corte Constitucional, com a nobre missão de ser a guardiã das leis, mas sim a maior ameaça à própria democracia. Quando os tucanos da imprensa se derem conta de que criaram um monstro, será tarde demais...

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