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Rodrigo Constantino

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O custo da arrogância

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Por Pedro Negreiros, publicado pelo Instituto Liberal

O economista e filósofo austríaco Friedrich Hayek definiu como arrogância fatal a crença de um político, burocrata ou qualquer outro membro da sociedade de que seu conhecimento seja suficiente para impor obrigações ou restrições a toda a sociedade por meio do Estado.

Pois bem. Foi aprovado, pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC), o tombamento provisório dos Galpões do IBC, localizados em Jardim da Penha, Vitória. A medida se originou de um pedido feito pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil no Espírito Santo (IAB-ES), com apoio de outras 14 entidades da sociedade civil, que acreditam que a importância e o valor do imóvel como patrimônio histórico e cultural seja maior do que como local para realização de um empreendimento imobiliário, por representar o ciclo cafeeiro no Espírito Santo.

Para entender por que a decisão se trata de um exemplo prático da arrogância fatal de Hayek, precisamos entender como os preços são formados.

Você já deve ter observado que o preço de um produto tende a variar conforme o número de pessoas querendo comprá-lo ou conforme a sua disponibilidade no mercado. Por exemplo, devido ao grande aumento na procura por álcool em gel ocorrido no início da pandemia, muito acima do que os produtores estavam acostumados, o seu preço subiu, e, à medida em que a produção foi se adequando a essa nova demanda, foi se normalizando.

Já a gasolina, também no início da pandemia, quando muita gente não estava saindo de casa, sofreu uma redução no preço, que também se normalizou à medida que a relação demanda/oferta foi voltando ao normal. Podemos ainda citar os vários alimentos, com destaque para o arroz, que, devido a um crescimento da relação demanda/oferta, sofreram aumentos no preço.

Essas variações não se deram por determinação do governo. Não foram coordenadas nem centralizadas por ninguém. Foram espontâneas, refletindo as relações entre oferta e demanda de cada produto num dado momento.

Isso acontece porque os preços são determinados por todas as pessoas que compram ou vendem algo e por aquelas que se abstêm de comprar ou de vender. Dessa forma, cada indivíduo, ao comprar ou ao não comprar e ao vender ou não vender, está dando, mesmo que sem intenção, a sua contribuição à formação do preço de um produto.

O preço é, portanto, um mensageiro que permite que o produtor ou investidor tome as ações corretas. Foi a subida do preço do álcool em gel e do arroz que alertou aos produtores desses produtos que a demanda estava alta e, portanto, era hora de produzir mais.

Quando se trata de imóveis, a premissa é a mesma. Se uma região se valoriza, significa que a demanda por imóveis ali aumentou mais do que a oferta. É um indicativo de que se deve construir mais.

Da mesma forma, quando um investidor ganha mais construindo moradias do que preservando galpões existentes num dado terreno, significa que, naquele local, há uma demanda maior por moradia do que pela preservação dos galpões.

Isso porque o sistema de preços coordena as ações individuais em uma sociedade cujo conhecimento é disperso. Então, quando um conselho, legitimado pelo Estado, ignora esse sistema espontâneo e faz valer apenas a opinião de seus membros, estamos diante da arrogância fatal de Hayek.

Um problema adicional da imposição da preservação por um conselho é que a avaliação de o que é significativo culturalmente é pessoal e subjetiva.

Sendo assim, uma forma menos autoritária de se preservar um suposto bem cultural é efetuar a compra desse bem no seu valor mercado e preservá-lo. Hoje, existem plataformas para financiamento coletivo que facilitariam a arrecadação de recursos daqueles que gostariam de manter o galpão preservado. Se, porventura, uma entidade não conseguisse arrecadar os recursos necessários para tal, teremos um indicativo de que talvez aquele bem não seja tão importante para tanta gente assim.

É claro que existem exceções. Muitas vezes um bem tem grande importância para uma população que não tem como arcar com a sua aquisição; mas sejamos honestos: não é o caso dos galpões do IBC.

Além do referido tombamento, vale tratarmos do custo que a mentalidade que acarretou a decisão do CEC gera para as cidades. Aqui, é importante deixar claro que o problema não é a preservação e sim a forma como essa preservação é imposta e os motivos pelos quais se optou pela imposição. A ideia de que é preciso frear o mercado imobiliário gera efeitos (como qualquer interferência na livre iniciativa) – muitas vezes não previstos – que podem ser piores do que o que se tentou evitar. São consequências de se atacar quem produz, sem pensar no porquê de aquilo ser produzido.

Vejamos: se o preço de mercadorias é maior quando a oferta em relação à demanda é menor, quais as consequências de medidas que impedem a oferta de unidades residenciais em um bairro central e dotado de infraestrutura, como Jardim da Penha? A primeira, e mais óbvia, é uma menor relação oferta x demanda de imóveis naquele bairro à medida que a última aumenta. A consequência direta, por sua vez, é o aumento no preço dos imóveis.

No entanto, a demanda por moradia não desaparece com a restrição à sua construção. As pessoas que buscam morar próximo às regiões centrais, mas são impossibilitadas pelos altos preços gerados pela restrição da oferta, terão sua demanda atendida em outro local da cidade, provavelmente mais longe do centro, gerando mais deslocamentos e custos de infraestrutura.

Este espraiamento urbano acarretará uma maior demanda por transporte público nas periferias – que muitas vezes não será atendida, dada a inviabilidade de operar o transporte em regiões de baixa densidade, fazendo com que os moradores dessas regiões tenham dificuldade de acessar o mercado de trabalho nas regiões centrais.

Isso, por sua vez, terá outras consequências negativas, cuja explicação irá estender demais este artigo; mas, só até aqui, pudemos ver aumento do déficit habitacional, piora na mobilidade urbana e desigualdade socioespacial como alguns dos custos de se ir contra o mercado imobiliário. Pelo menos, sempre que passarmos por aqueles galpões abandonados, poderemos lembrar do ciclo cafeeiro no Espírito Santo. Obrigado, CEC.

*Pedro Henrique Alves Negreiros é Associado II do Instituto Líderes do Amanhã. 

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