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PEC emergencial: o “congelamento” do salário mínimo
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Por Roberto Ellery, publicado pelo Instituto Liberal

Uma característica da economia brasileira pós-estabilização foi a valorização do salário mínimo. Em janeiro de 1995, o salário mínimo era de R$ 358,88 (valores de hoje) e em dezembro de 2018 chegou a R$979,06 (valores de hoje), um crescimento real de 172%. Os efeitos do aumento de salário mínimo na economia não são triviais e animam debates entre economistas há muitos anos em vários países. Não vou entrar nessa discussão aqui, apenas registro que muito provavelmente esses efeitos dependem de um conjunto de outros fatores relevantes. Por exemplo, o impacto do aumento do salário mínimo sobre o emprego depende do valor do salário mínimo e do ciclo econômico. Se o salário mínimo é muito baixo e a economia está em expansãom pode não ter efeito algum; talvez esse não seja o caso se o salário mínimo é alto e a economia está em recessão.

A figura abaixo mostra a evolução do salário mínimo no Brasil desde 1995, lá estão os valores do salário mínimo em janeiro de cada ano e os valores médios do ano. Fica claro na figura o aumento real do salário mínimo no período. O que não fica tão claro é se hoje o salário mínimo está alto ou baixo. Figuras podem enganar; o ponto de partida, janeiro de 1995, foi escolhido por conta da estabilização. É muito difícil comparar valores de uma economia estabilizada com uma economia com inflação descontrolada, mas esse período foi marcado por um baixo valor do salário mínimo.

Parte do crescimento foi uma reposição de valores perdidos no passado; de fato, considerando a série do IPEA usada na figura, o maior valor real do salário mínimo pós-estabilização ocorreu em janeiro de 2019 e era de R$ 1.020, 54. Um valor inferior ao pico de R$ 1.481,22 ocorrido em outubro de 1961. Seria o valor de 1961 o valor correto ou o salário mínimo estava muito alto naquela época? Seria correto o valor de R$ 289,32 que ocorreu em agosto de 1991? Cuidado com quem tenta dar respostas simples a essas perguntas.

Uma maneira de tentar avaliar o aumento do salário mínimo é comparar com a produtividade do trabalho. Não é uma maneira muito adequada, o salário mínimo pode estar relacionado a outras questões que não a produtividade, mas pode dar alguma pista do que aconteceu nos últimos anos. A figura abaixo mostra o crescimento do salário mínimo (média mensal) e da produtividade do trabalho (produto por trabalhador) entre 1995 e 2018. A diferença é brutal. Se o salário mínimo segue uma trajetória associada a uma renda mínima que garanta a dignidade dos trabalhadores e que não guarda relação com a produtividade marginal do trabalho, em tese seria o caso onde o salário mínimo é muito menor que a renda média, o crescimento maior que a produtividade pode não ser um problema. Caso contrário pode ser um problema grave.

Procurei a renda média do trabalho no Brasil. O melhor que achei foram dados do Ipeadata com a renda média do trabalho principal entre 1992 e 2014. Como os dados estavam em valores de outubro de 2014 e eu não sei qual foi o índice usado para correção pela inflação, optei por comparar o crescimento em vez dos valores. Um dia ainda vou aprender a usar os dados da PNAD, até lá a figura abaixo é o que tem para hoje.

O crescimento maior do salário mínimo do que da renda média do trabalho sugere que, mesmo que na década de 1990 o salário mínimo estivesse tão abaixo do salário médio que podia crescer sem maiores problemas, esse talvez não seja mais o caso. À medida que o salário mínimo se aproxima do salário médio, a produtividade do trabalho vai ficando mais importante para limitar o crescimento do salário mínimo.


Qual a relação dessa discussão com a PEC emergencial? Estaria a equipe econômica preocupada com os efeitos do salário mínimo sobre o desemprego? O governo fez o diagnóstico que o salário mínimo cresceu demais e agora só pode crescer se existirem ganhos de produtividade? Talvez a resposta para as duas perguntas seja afirmativa, mas muito provavelmente não foi; por isso que a PEC emergencial determinou um congelamento do valor real do salário mínimo.


A verdade é que a principal motivação para o “congelamento” do salário mínimo é fiscal. Como o salário mínimo serve de piso para várias despesas do governo (e.g. BPC e seguro desemprego), o aumento do salário mínimo leva a um aumento no gasto da União. A estimativa é que cada um real a mais no salário mínimo leva a um aumento de R$ 303,9 milhões nos gastos da União (link aqui); não é pouco.

Se a motivação principal para o “congelamento” do salário mínimo fosse ligada ao mercado de trabalho e aos limites impostos pelo aumento da produtividade, teríamos um longo (e bom) debate pela frente. A medida, em vez de aparecer na PEC emergencial, poderia aparecer em outra PEC ligada à desregulamentação da economia e/ou ao aumento da produtividade. Como não é o caso, a principal motivação é fiscal; a medida é sim urgente e, por mais cruel que possa parecer, é necessária. O risco de não fazer o ajuste do gasto é perder o controle da dívida pública e isso levar a um processo inflacionário. Lembra que o ponto mais baixo do salário mínimo foi em agosto de 1991? Sabe quanto foi a inflação naquele ano?

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