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Caso o leitor não tenha notado, não sou corporativista. Isso se deve ao fato, talvez, de eu não ser jornalista de formação, e sim um economista que atuava no setor financeiro antes de mudar de carreira.

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Passei muito tempo apontando para o viés ideológico da mídia, e não mudei de postura quando passei a fazer parte dos grandes veículos - tenho passagem por Globo, Veja, Valor, IstoÉ, e hoje escrevo na Gazeta do Povo, na Zero Hora e sou comentarista da Jovem Pan.

Meu compromisso continua sendo com o leitor, o público, e minha honestidade intelectual sempre será meu maior ativo. Sou grato, naturalmente, a todos os veículos que enxergam valor nisso e já me contrataram. Mas se fizeram tal escolha, foi justamente por saberem valorizar essa independência.

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Percebo em alguns pares uma arrogância ímpar de quem se julga acima de limites ideológicos, totalmente imparcial e isento, comprometido somente com a verdade e os fatos, sem qualquer tipo de preconceito. Esses jornalistas perderam a capacidade de enxergar até o óbvio: que há um claro viés na imprensa, a favor dos "progressistas" e contra os conservadores.

Em parte isso é algo um tanto natural, apontado por Bernie Goldberg, ex-âncora da CBS, em seu livro Bias. Não precisa ser uma estratégia deliberada de seguidores de Gramsci; é a visão de mundo predominante no jornalismo mesmo. Até aí tudo bem. Desde que esse viés seja admitido.

Quando um viés tão escancarado é ignorado, e os jornalistas juram de pé junto que há plena pluralidade e isenção por parte da imprensa, isso só alimenta as campanhas populistas de gente como Trump e Bolsonaro, que detonam as fábricas de "Fake News", levando o público ao delírio. Tapar o sol com a peneira produz mais calor nessa reação, pois o público não é trouxa e percebe o truque, especialmente na era das redes sociais.

Pois bem: chegamos ao Roda Viva desta segunda, com o ministro Sergio Moro sendo entrevistado. Jornalista tem que apertar mesmo, cobrar respostas objetivas, tocar em assuntos delicados, tentar extrair do entrevistado revelações relevantes, e não ficar levantando bola; mas não tem que ver o entrevistado como um inimigo, um adversário.

Alguém pode dizer que vimos essa postura imparcial ontem? Alguns ali pareciam militantes petistas diante de um carrasco! A insistência no assunto da VazaJato, a tentativa de forçar uma intriga com o presidente, a forma de inquirir o entrevistado, tudo isso mostra um foco equivocado e distorcido pela lente ideológica.

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Ou os jornalistas acham mesmo que o público em geral está mais interessado em fofocas palacianas do que na queda de mais de 20% nos índices de homicídios no país? Ou acham que tentar extrair a fórceps do entrevistado uma declaração sobre eleição de 2022 é mais importante do que debater segurança pública?

Não é para puxar o saco não, mas a Jovem Pan, na figura do Felipe Moura Brasil, faz as melhores perguntas, mais técnicas e sem o desejo de lacrar. Convidem alguém da Gazeta do Povo na próxima vez também. O Pravda, digo, a Folha pode ficar de fora...

No mais, pergunto: alguém imagina o mesmo tipo de postura com um Lula da vida? Um jornalista perguntando "você diz defender a democracia, mas fica bajulando Fidel Castro, o que tem a dizer, hein?" Janaina Paschoal tocou no cerne da questão:

Chega a ser cômico constatar a diferença dispensada a um governo de esquerda e a um governo de direita. Não, não estou atacando a Imprensa, estou fazendo uma crítica construtiva. Para reflexão, apenas para reflexão... Eu não me lembro de jornalistas perguntarem aos Ministros de Lula, por qual razão não o questionavam sobre o Mensalão. Também não lembro de jornalistas perguntarem aos Ministros de Dilma, por qual motivo não se constrangiam com o patrocínio de ditaduras...

A autocrítica é crucial aqui, se a imprensa pretende continuar relevante - e acho essencial isso para nossa democracia. Uma reflexão honesta se faz necessária. A "dureza" com que trataram Moro seria a mesma com Marina Silva, digamos? Vão apertar Luciano Huck da mesma forma? O público, repito, percebe o duplo padrão. E isso prejudica a credibilidade do jornalismo, que jamais será totalmente imparcial, mas deve ao menos buscar isso como meta...

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