Num dia tenso em que o ministro Dias Toffoli votou sobre a descriminalização da maconha, com direito até a uma esdrúxula comparação com a cafeína, o ponto mais polêmico não foi relacionado ao tema em si, mas sim uma fala do ex-advogado petista sobre a legitimidade popular da corte.
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Antes de chegar lá, meus dois centavos sobre a pauta em si. Posso entender, ainda que discorde dele, o argumento liberal em prol da legalização das drogas, bandeira que gente séria como Milton Friedman já defendeu. Mas é muito importante frisar o óbvio: os meios importam.
O esforço de aparentar legitimidade popular é sintoma de um câncer em estágio de metástase, que é a politização do STF
O ministro André Mendonça interrompeu o colega Barroso para defender um bispo acusado de desinformação pelo presidente do STF. Para Barroso, não há qualquer atropelo do Supremo sobre o Legislativo, pois todos admitem que o consumo e o porte de drogas seguem ilícitos, sendo a discussão sobre punição penal ou administrativa.
Para Mendonça, está claro que o Congresso decidiu se tratar de crime, e não de infração com punição administrativa. Ou seja, pela ótica do ministro terrivelmente evangélico, haveria sim uma usurpação das prerrogativas do Poder Legislativo alterar pelo STF este tipo de coisa. E concordo com ele.
Ou seja, mesmo quem quer o resultado – a descriminalização – deveria tomar cuidado com os meios para se obter tal fim. Os meios importam, e cada vez que a população abre exceções e aplaude o arbítrio supremo por gostar do resultado desse abuso de poder, ela está ajudando a criar um monstro e a destruir a democracia.
Mas vamos retornar ao que disse Toffoli e que merece destaque. Para o ministro, cada um deles tem a legitimidade popular de cerca de cem milhões de votos. Toffoli considera que o presidente eleito que os indicou e os senadores que os aprovaram na sabatina transferem seus votos a esses ministros, num passe de mágica. É mesmo?
Para começo de conversa, todos sabem que a sabatina no Senado é um "chá das cinco" no Brasil, algo bem diferente do que ocorre nos Estados Unidos, por exemplo. Em segundo lugar, muitos ministros indicados pelo PT no passado foram "sabatinados" por um Congresso sob o mensalão, ou seja, vários senadores recebiam "mesada" do governo para votar de acordo com suas pautas e desejos.
Se os ministros supremos querem tanto provar que o povo brasileiro está ao seu lado, fica a sugestão: façam o teste da Av. Paulista
Mas nem é preciso lembrar dessas coisas constrangedoras, assim como as duas tentativas frustradas de Toffoli para se tornar juiz. O Poder Judiciário não é um poder popular, não tem votos, e assim deve ser. Cabem aos responsáveis aplicar as leis, não fazê-las, função do Parlamento. O esforço de aparentar legitimidade popular é sintoma de um câncer em estágio de metástase, que é a politização do STF.
Se os ministros fossem discretos, dessem menos entrevistas e se manifestassem mais nos autos em suas decisões, se eles não emitissem tantas opiniões políticas e ideológicas, se não perseguissem a "extrema direita" nem bancassem os "salvadores da democracia", se não se considerassem "editores da nação", nada disso seria necessário. Ministro supremo não precisaria ser popular.
Mas temos ministros que comemoram a vitória de um candidato e vão além, alegando que derrotaram um espectro político, o que é a confissão de um crime. Nossos ministros supremos querem "empurrar a história", mandam eleitor que cobra mais transparência no processo eleitoral não amolar pois é um mané perdedor, e por aí vai. Nosso STF virou um puxadinho do PT, pelo visto.
E por isso o ex-advogado petista tenta vender a ideia de que eles possuem legitimidade popular por absorverem os votos que o presidente e os senadores receberam do povo. Parêntese: quando o presidente sai, então, esses ministros deveriam sair também, não? Fecho o parêntese.
A "tese" é absurda, e até Toffoli é capaz de compreender isso. Mas vale tudo pela narrativa e pelo esforço de fingir estar ao lado do povo. Se os ministros supremos querem tanto provar que o povo brasileiro está ao seu lado, ao contrário do que mostram as pesquisas, fica a sugestão: façam o teste da Av. Paulista. Avisem o dia e a hora, como faz Bolsonaro, e compareçam na avenida mais popular e movimentada do país. Sem seguranças, claro. Aí veremos a popularidade de vossas excelências...
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