Maior produtor nacional da cana-de-açúcar, o estado de São Paulo está vendo suas lavouras minguarem, em área, no atual ciclo, perdendo espaço para outros cultivos como soja e milho. São Paulo responde por cerca de metade da produção brasileira - esperada em 637,1 milhões de toneladas - e deve colher mais de 322 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Somente na safra 2023/24, a redução nas lavouras de cana-de-açúcar será de 22%, comparada à safra anterior. Mas a queda não vem de hoje. Os números revelam retração gradativa. Em 2016, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), São Paulo contava com uma área de 5,6 milhões de hectares destinados à cana. Ano passado já ficou em 4 milhões de hectares e, neste ano, deve ficar próximo a 3,1 milhões de hectares.
Para a Comissão de Cana-de-Açúcar e Energia Renovável da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp), alguns pontos influenciam diretamente nesse cenário: os baixos preços pagos ao produtor que seguem sem correções equiparadas às condições de mercado nem recuperação de defasagens, o que torna outras plantações mais rentáveis. Há ainda a falta de estímulo e incentivos à produção do etanol e a recente oneração tributária reaplicada em julho sobre o combustível, deixando-o menos competitivo nas bombas.
Apesar da redução de área em São Paulo, a Conab estima um aumento de produção nacional de 4,4%, na comparação com o clico anterior. Porém, esse desempenho vem marcado por alertas.
A redução gradativa do cultivo no maior polo produtor coloca em xeque a produção de açúcar e do etanol combustível, avalia o segmento.
É de São Paulo que sai o maior volume de etanol combustível que abastece o país e fomenta as maiores exportações do produto. No Brasil são produzidos anualmente 27,53 bilhões de litros, dos quais 14,26 bilhões são paulistanos.
Para o produtor rural que é coordenador da Comissão Técnica de Cana-de-Açúcar e Energia Renovável da Faesp e presidente da Comissão Nacional de Cana de Açúcar da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), Nelson Perez Júnior, algumas medidas se mostram urgentes.
Recentemente, a Faesp debateu alternativas para melhorar a remuneração do fornecedor de cana e aumentar a competitividade do etanol. Em reunião, o setor também tratou do papel dos fornecedores independentes na cadeia produtiva da cana-de-açúcar, que respondem por cerca de 40% do mercado paulista.
“Mesmo com o crescimento gradativo da produção nesta e na última safra, estamos registrando uma queda da área plantada, e grande parte disso por conta da menor lucratividade da cana em relação a outros cultivos, como a soja. Isso demonstra a importância de discutirmos medidas para melhorar a remuneração do fornecedor independente e de recuperar a competividade do etanol em relação à gasolina”, destacou Perez Júnior.
Campo tem 46% da receita vinda da cana-de-açúcar
O vice-presidente da Faesp, Tirso Meirelles, evidenciou a relevância do segmento à agricultura do estado de São Paulo e a necessidade de se buscar alternativas que mantenham o cultivo viável. “Do total da receita gerada no campo, 46% advêm desta cultura no estado, destacando sua notável contribuição na construção da matriz energética brasileira mais limpa e renovável, a partir da produção do etanol. Vamos seguir trabalhando pelo desenvolvimento sustentável nas lavouras e pela competitividade dos produtores e usinas paulistas”, ponderou.
Ocorre que as incertezas no campo variam, entre quebras provocadas pelos fatores climáticos e a debandada de produtores para outras lavouras. “A cana tem um ciclo longo, de cinco anos pelo menos. Quem planta soja ou milho, por exemplo, tem diversas colheitas durante o ano. Isso sem contar a lucratividade com o aumento no preço dessas commodities nos últimos anos”, reforçou Nelson Perez Junior.
A safra 2021/22 foi marcada pela quebra de produção. Em 2022/23 houve retomada dos principais indicadores de campo e as perspectivas para o ciclo 2023/24 seguem o ritmo de recuperação. A Faesp também tem debatido alternativas para “contornar a defasagem no valor da tonelada de cana paga ao fornecedor decorrente da falta de atualização do Consecana/SP”.
O Consecana é o Conselho de Produtores de Cana de Açúcar, Açúcar e Etanol do Estado de São Paulo. Segundo seu regulamento, “a formatação da metodologia de preços médio acumulado do quilo do Açúcar Total Recuperável (ATR) é calculado com base na média ponderada dos preços médios efetivamente praticados dos produtos derivados da cana de açúcar nos meses já transcorridos do ano-safra”.
Para líderes e produtores, isso precisa mudar. “Precisamos de uma nova precificação da cana-de-açúcar que contemple a atualização do Consecana/SP e que incorpore as novas receitas que não são incluídas no modelo atual, como vinhaça e torta de filtro, cogeração de energia e os próprios CBIOs”, completou Nelson Perez Junior.
O tema voltará à pauta nas próximas semanas envolvendo entidades do setor o que, segundo a Faesp, deve ocorrer paralelamente ao debate a respeito da construção de um modelo de preços alternativo ao Consecana/SP.
Esse modelo alternativo, lembrou Perez Júnior, deve ser formatado a partir da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). O objetivo não são metodologias de preços que concorram entre si, mas que possam convergir no intuito de recuperação e readequação dos valores.
Outro item de preocupação, vem alertando a Faesp, diz respeito ao impacto do aumento do ICMS no estado de São Paulo, de 9,57% para 12%, sobre os preços do etanol hidratado combustível.
“Nos últimos meses, o etanol hidratado vem perdendo fortemente a competividade em relação à gasolina e a questão tributária tem sido uma das principais variáveis responsáveis por esse movimento. Primeiro teve o retorno dos tributos federais (PIS/Cofins), depois a redução de 5% no preço da gasolina nas refinarias e, agora, a elevação da alíquota do ICMS em São Paulo, que tornam a paridade com a gasolina desfavorável para o etanol”, considerou a Federação da Agricultura do Estado.
Esse ponto ensejou, inclusive, frente à evolução dos motores flex, a sugestão de encaminhamento à Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) a realização de estudos para revisão do parâmetro de eficiência etanol/gasolina de 70%, bem como, sobre a viabilidade comercial de produção de veículos à etanol, exclusivamente. “Já existem registros de veículos movidos apenas com etanol que sua eficiência é de 90% ou mais, ou seja, nós temos nas mãos uma tecnologia que é ecologicamente correta, uma fonte de hidrogênio e que pode revolucionar o setor combustível, mas precisamos de políticas públicas de pesquisa, incentivo à produção do etanol, do consumo e de veículos movidos a ele”, considerou Perez Júnior.
Projeto de Lei 3.149/20 pode gerar complemento de renda no campo
A Faesp também debate o tema focado no apoio e mobilização do setor produtivo à aprovação do Projeto de Lei 3.149/20, do deputado Efraim Filho (DEM/PB). “O PL pretende ajustar a Lei do Renovabio – Lei 13.576/17 que dispõe sobre a Política Nacional de Biocombustíveis – , cobrindo a lacuna deixada pelo texto que não garantiu de forma expressa a parcela que compete ao fornecedor de cana da receita proveniente da comercialização dos Créditos de Descarbonização (CBIOs)”, reforçou a Faesp.
“Isso porque no momento o fornecedor de cana não é considerado emissor e não pode comercializar automaticamente os seus respectivos CBIOs gerados na etapa de produção agrícola, cuja matéria-prima foi destinada à produção de biocombustível, ficando dependente da Usina e, portanto, não podendo auferir dos benefícios correspondentes da descarbonização que ocorre no campo”, tem alertado a Faesp.
Para a Comissão ligada à Federação da Agricultura do Estado de São Paulo, a aprovação do PL 3149/20, “ao determinar a participação do repasse proporcional, de no mínimo 80%, das receitas da negociação dos CBIOs aos fornecedores de cana, vai gerar um importante complemento de receita no campo que ajudará na manutenção dos produtores na atividade, além de estimular novos investimentos e o consumo do etanol frente aos combustíveis fósseis”.
Brasil estima crescimento na produção de cana-de-açúcar
O Brasil é o líder mundial na produção de cana-de-açúcar e espera crescimento de 4,4% na produção na safra 2023/24, estimada em 637,1 milhões de toneladas.
Segundo a Conab, esse incremento é influenciado pelo melhor rendimento das lavouras como pela maior área destinada ao cultivo considerando o cenário nacional. Para a área, a estatal espera que sejam destinados 8,4 milhões de hectares, com um rendimento médio de 75.751 quilos por hectare.
“O maior crescimento de área é justificado pelo aumento de áreas de expansão e a incorporação de áreas de fornecedores, que não eram utilizadas para o setor sucroenergético, o que impacta diretamente na produtividade, uma vez que os primeiros cortes possuem um maior rendimento. Além disso, as condições climáticas, para essa safra, vêm se apresentando ainda melhores que na safra 2022/23”, destacou o gerente de Acompanhamento de Safras da Companhia, Fabiano Vasconcellos.
De acordo com o levantamento da Conab, a fabricação de açúcar deverá chegar a 38,77 milhões de toneladas, sendo a segunda maior já registrada na série histórica, perdendo apenas para a temporada de 2020/21 quando foi estimada em 41,25 milhões de toneladas. Além da maior colheita esperada para a matéria-prima na atual safra, o mercado favorável ao adoçante influencia na maior destinação da cana.
A produção do etanol também deverá crescer 5,9% quando comparado com o ciclo anterior, podendo chegar a 33,17 bilhões de litros. Desse total, 14,26 bilhões de litros serão de etanol anidro e 18,91 bilhões de litros de etanol hidratado. A elevação é impulsionada, principalmente, pela fabricação do biocombustível produzido a partir do milho estimada em 5,64 bilhões de litros – alta de 42%. Já o etanol a partir da cana deve registrar um leve aumento de 0,6%, estimado em 27,53 bilhões de litros.
Para Nelson Perez Júnior, da Faesp, apesar dos bons desempenhos esperados no cenário nacional, isso não se reflete em bons indicadores e resultados financeiros aos produtores.
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